Risco biológico era o maior temor na volta da Apollo 11 à Terra
Salvador Nogueira
Nasa teve de criar um plano para lidar com amostras extraterrestres e deixou os três astronautas isolados por 21 dias
Nos quase três dias que se passaram entre a partida da Apollo 11 da Lua e sua chegada à Terra, que completa exatos 50 anos nesta quarta (24), a maior preocupação dos astronautas era com a poeira. Sim, a poeira lunar.
Se até hoje pesquisadores debatem se pode existir vida na Lua com padrões diferentes dos da Terra, imagine-se em 1969. As missões Apollo obrigaram a Nasa a criar planos detalhados para lidar com amostras extraterrestres — e todos os riscos de contaminação biológica acidental.
Um laboratório de segurança máxima foi construído em Houston para a manipulação das rochas lunares a ser trazidas pelos astronautas.
Além de um controle estrito de pressão interna e externa, para impedir que patógenos aéreos saíssem das áreas de contenção, havia uma câmera para manter e manipular as rochas em ambiente de vácuo, de forma a preservá-las em seu estado original.
A situação no módulo de comando Columbia, contudo, era mais complicada. Uma vez que os trajes espaciais fossem retirados, seria impossível impedir o contato dos astronautas com a poeira lunar. Se houvesse ali micróbios causadores de doença, Neil Armstrong, Buzz Aldrin e Michael Collins inevitavelmente teriam contato com eles.
O módulo lunar Eagle, obviamente, era o que mais ficou impregnado com a poeira lunar. Para evitar que o Columbia fosse muito contaminado, era preciso regular a pressão dos dois de forma que uma corrente de ar se formasse do Columbia para o Eagle, impedindo o fluxo de partículas na direção contrária.
Uma vez descartado o Eagle, ainda em órbita da Lua, o Columbia faria sozinho a injeção transterrestre, colocando os três astronautas a caminho da Terra.
A reentrada se deu às 13h35 (de Brasília) do dia 24, e o escudo térmico do módulo de comando do Columbia teve de enfrentar temperaturas de 2.500° C, enquanto a atmosfera dissipava a maior parte da energia de movimento da nave. A reentrada se deu a cerca de 39.600 km/h.
Do início da reentrada ao “splashdown”, o pouso nas águas do Pacífico, passaramse 15 minutos e 20 segundos. De início, por conta das ondas, a cápsula tombou, mas os airbags no topo do módulo inflaram para colocar a cápsula na posição correta.
O porta-aviões USS Hornet era o responsável pelo resgate, e estava a 20 km do local de pouso no momento da chegada. Os astronautas saíram só 25 minutos depois. De novo, por medo de contaminação, o processo era delicado. Homens-rãs jogaram para o interior da nave trajes plásticos de isolamento.
Armstrong, Aldrin e Collins foram içados por um helicóptero e levados ao Hornet, onde embarcaram em uma instalação móvel de quarentena, de onde só podiam acenar por uma pequena janela.
O protocolo de segurança biológica previa um isolamento de 21 dias. A bordo da instalação móvel, eles foram transportados para o laboratório de Houston, onde ficaram acompanhados apenas por um técnico que teve contato direto com eles durante o resgate e um médico —além de alguns camundongos que seriam expostos ao mesmo ar que eles respiravam.
No isolamento, havia uma sala de ginástica e uma mesa de pingue-pongue, mas os astronautas logo se sentiram oprimidos pelo espaço apertado e pela falta de contato pessoal com suas famílias, após a maior jornada já empreendida por seres humanos. Eles recebiam visitas do outro lado do vidro e podiam falar ao telefone, mas não era muito.
No dia 10 de agosto, como camundongos e astronautas pareciam plenamente saudáveis, a Nasa decidiu liberálos. Muito diplomático, Armstrong não escondeu a frustração ao deixar a quarentena.
“Queria aproveitar essa oportunidade particularmente para agradecer todos que eu vi lá trás, que foram meus graciosos anfitriões no Laboratório de Recepção Lunar. E não posso dizer que eu escolheria passar umas duas semanas assim, mas estou muito feliz que tivemos a oportunidade de concluir a missão”, disse.
A Nasa ainda manteria os protocolos de quarentena, relaxando um pouquinho a cada nova missão, até a Apollo 14, depois da qual até mesmo o menos ortodoxo dos cientistas foi obrigado a concluir que a Lua era completamente desprovida de vida.
A conclusão da Apollo 11 iniciou uma nova etapa na exploração lunar. Suas sucessoras, Apollo 12, 13, 14, 15, 16 e 17, seguiram em seus passos, realizando outras cinco alunissagens (salvo pela 13, vitimada por uma séria falha a caminho da Lua) e concluindo a primeira era de exploração tripulada da Lua em dezembro de 1972. Desde então, ninguém mais voltou a caminhar pelo empoeirado solo lunar.