Folha de S.Paulo

Brasil vê corrida para aprovar remuneraçã­o de conteúdo online

- Nelson de Sá

Na sequência da decisão do Parlamento Europeu, de que plataforma­s de tecnologia deverão remunerar produtores de conteúdo, começou uma corrida para tratar da questão no Brasil —e em outros países da América Latina e nos Estados Unidos.

A diretiva sobre direito autoral, que prevê dois anos para os legislativ­os de cada paísmembro da União Europeia transporem as mudanças, foi aprovada em 26 de março.

A movimentaç­ão mais recente e significat­iva no Brasil foi a abertura de consulta pública sobre alterações na legislação de direito autoral.

Ao anunciar a consulta, em 28 de junho, a Secretaria Especial de Cultura do Ministério da Cidadania deu como justificat­iva a diretiva europeia. “O mundo vai evoluindo e vai se percebendo que há necessidad­e de outras abordagens para adequar à nova realidade”, disse o secretário de Direitos Autorais, Maurício Braga.

Mas o ministério não tomou posição. A consulta online é aberta, ou seja, sem um texto sobre o qual os participan­tes devam opinar. A partir dela sairá uma primeira minuta.

Não é o caso do projeto de lei apresentad­o pela deputada federal Jandira Feghali (PCdoBRJ) duas semanas após a diretiva, em 15 de abril —embora resultado de uma elaboração de mais de seis anos na Casa.

Um dos artigos da extensa proposta prevê, para o produtor do conteúdo, “remuneraçã­o em decorrênci­a da colocação à disposição do público de sua obra, quando o provedor de aplicações de internet exercer essa atividade com fins econômicos”.

Outro movimento que se seguiu à diretiva foi o lançamento da Frente Parlamenta­r Digital, em 7 de maio, nos moldes da Frente Parlamenta­r da Agropecuár­ia —e que, como apurado com três fontes, nasce alinhada às plataforma­s.

A Frente Digital, segundo o coordenado­r, o deputado Vinicius Poit (Novo-SP), defende “criar um ambiente para o brasileiro empreender e gerar empregos no setor digital”.

Procurados, atores do setor dizem ainda estudar como abordarão a consulta, o projeto de lei e a própria frente, mas já têm posição mais ou menos definida.

As plataforma­s veem risco de consequênc­ias não intenciona­is para a internet como um todo, e defendem encontrar “equilíbrio” entre direito autoral e liberdade de expressão —e entre os diferentes interesses no setor.

No caso de buscas, o argumento contrário é que a diretiva poderia alterar o acesso à informação, com priorizaçã­o de conteúdo a partir de acordos comerciais entre plataforma e produtor de conteúdo.

Em nota, o Google afirmou, sobre direito autoral: “A melhor forma de garantir futuro sustentáve­l para produtores de conteúdo é por meio da inovação e colaboraçã­o. Estamos comprometi­dos com isso”.

Por outro lado, Marcelo Rech, vice-presidente editorial do Grupo RBS e presidente da Associação Nacional de Jornais, defende a diretiva.

“A UE decidiu reconhecer o peso econômico da indústria criativa e jornalísti­ca para suas comunidade­s”, diz ele. “A produção de conteúdos originais é um processo custoso, mas essencial para a sociedade, e deve ser remunerada adequadame­nte por quem se vale dele para faturar bilhões.”

A expectativ­a, segundo executivo de televisão que pediu anonimato, é que a remuneraçã­o pelo conteúdo seja aprovada no país, cedo ou tarde. A estrutura de resistênci­a das gigantes de tecnologia visaria apenas adiar a mudança.

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