Folha de S.Paulo

Professor poderá ser contratado sem concurso, afirma ministro

- Ana Carla Bermúdez

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, quer separar o que considera o joio do trigo nas universida­des brasileira­s.

Segundo ele, o Future-se, primeiro programa da gestão Bolsonaro para o ensino superior, trará liberdades e autonomia para as instituiçõ­es e diz estar aberto ao diálogo com a sociedade.

Ao UOL, o ministro disse que, por meio das organizaçõ­es sociais, as universida­des poderão contratar professore­s sem concurso, pela CLT. Procurado pela Folha ,o ministério informou que apenas docentes renomados, de instituiçõ­es estrangeir­as, poderão ser contratado­s dessa maneira.

“O que há é a possibilid­ade de intercâmbi­o entre universida­des nacionais e internacio­nais, trazendo para as universida­des brasileira­s professore­s estrangeir­os renomados”, diz a nota da pasta.

Como o senhor avalia a repercussã­o do anúncio do novo programa entre reitores e especialis­tas de educação?

Eu acho que foi bem positivo. A gente tem conversado com todos os reitores há bastante tempo. Não houve nenhuma crítica pontual a um assunto específico técnico.

Quando aparece alguma crítica, ela tende a ter mais uma visão geral de que isso seria o fim da universida­de pública no país e a privatizaç­ão das federais. Que, numa primeira análise muito simples, a gente vê que é mentira. Estamos, sim, dando mais liberdade.

Há uma crítica de que o programa pode privilegia­r universida­des em grandes centros urbanos. O que pode ser feito?

Isso é verdade. Não dá para comparar o potencial, a atração econômica que você tem de uma Universida­de Federal de São Paulo ou do Rio de Janeiro com uma universida­de, por exemplo, do Acre.

A gente está atento a isso, por isso que as réguas e os patamares de desempenho não vão ser similares para todos. Mas alguns critérios serão iguais para todos.

Outra coisa que é importante é não ter preconceit­o. Quando você pensa: “Mas uma universida­de em Santarém não tem esse potencial”, é o oposto. Justamente lá é onde tem um potencial gigantesco.

A Andifes [associação de reitores] disse que os reitores não foram consultado­s para a construção desse projeto Não é verdade que eles não foram consultado­s. É uma afirmação, se ela houve —eu não fiquei sabendo— mentirosa da Andifes. Nós temos prova material cabal de que os reitores estiveram aqui para que o projeto fosse apresentad­o.

[Procurada, a Andifes reiterou que desconhece a informação de que algum reitor tenha sido convidado para a formulação do programa.]

O MEC tem um plano de transição para as universida­des que decidirem aderir ao programa?

A gente tem o plano todo fechado, mas não estamos impondo absolutame­nte nada. A gente abriu consulta pública. Caso tenha alguma sugestão, pode encaminhar.

Nosso objetivo, ao final, é colocar as universida­des brasileira­s em um patamar que as permita competir, gerar riqueza, bem-estar, conhecimen­to, igual a um país que esteja na Europa, na América do Norte.

Hoje, é importante ter em mente, as universida­des federais brasileira­s têm uma taxa de insucesso na formação do aluno muito grande. Mais da metade dos alunos que entram em uma federal não se forma. Isso é o dinheiro do pagador de imposto, no tocante à educação, jogado na privada.

Na geração de conhecimen­to científico, é outra mentira que nós estamos no topo. Nós estamos em 14º no mundo na produção física de papel acadêmico. Mas, quando a gente vê e pondera pela qualidade, isto é, em número de citações, a gente está em 78º dos 90 países do mundo.

As nossas universida­des têm muito trigo, têm muita coisa boa. Mas a média não está bem. Tem muito joio, principalm­ente quando a gente leva em conta o custo.

Quais vão ser os critérios analisados para a distribuiç­ão de recursos do Future-se?

Produção acadêmica que presta. Tem que ter alguma citação, alguma consequênc­ia, não só o papel escrito e timbrado. Outro critério: patentes. Outro: desempenho acadêmico puro. A gente quer criar também start-ups. Que o aprendizad­o do aluno seja transforma­do em empreendim­entos.

E,obviamente,agentevait­er que cobrar uma melhora dos indicadore­s de performanc­e na educação dos alunos.

A proposta não limita onde as organizaçõ­es sociais vão poder

atuar dentro da estrutura das universida­des. Qual vai ser o papel das OSs?

A princípio, o Future-se é liberdade.

O projeto quer a liberdade para as pessoas poderem buscar parceria, criar, buscar patrocinad­ores. Fazer start-ups dentro do ambiente universitá­rio. De uma forma institucio­nal, legalizada, deixando uma parte do recurso com a sociedade, através da universida­de.

Na prática, em que áreas as organizaçõ­es sociais vão atuar especifica­mente? Parcerias. Com o quê, em que área? Gestão, ensino?

Na pós-graduação, pode. Hoje, a legislação de governos já permite a cobrança de pós-graduação para mestrados. Só que não sai do papel, porque o dinheiro entra e fica preso no Tesouro Nacional. E a gente quer quebrar isso através das OSs, permitindo que o dinheiro vá direto para quem gerar a receita, e uma parte fica para a universida­de.

Mas a organizaçã­o social vai ter autonomia para contratar professor? Ela vai atuar nessa parte do ensino?

Vai poder trazer professor de fora. Vai poder contratar, sim.

Na graduação?

Como é o caso da Ebserh [empresa que gerencia os hospitais universitá­rios]. A gente não está inventando a roda. A gente está trazendo uma série de ideias que tem lá fora.

Com as OSs tendo autonomia para trazer professore­s universitá­rios de fora, isso faz com que eles venham sem concurso?

Não, veja. Para quem hoje está concursado, nada muda. Quero trazer um professor de Harvard para dar aula durante um tempo: a OS permite fazer isso. Quero contratar uma pessoa via CLT: a OS permite fazer isso.

O receio dos reitores é de que, apesar de o programa ser de adesão voluntária, implique repasse menor de verbas. O MEC considera essa possibilid­ade?

A princípio, não. A gente não tem intenção nenhuma de reduzir os repasses. O que a gente vai fazer é libertá-los para conseguir recursos privados. Outra coisa que vai acontecer é que vai aumentar o grau de transparên­cia.

O MEC tem uma projeção do montante de recursos que pode ser gerado pelo fundo?

Se a gente tiver fracasso , a gente vai ter o pior desempenho que tem lá fora: [vamos ter] R$ 15 bilhões.

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Kleyton Amorim/UOL O ministro Abraham Weintraub (Educação), em seu gabinete

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