Folha de S.Paulo

Justiça de SP facilita viagens de crianças desacompan­hadas

- Thaiza Pauluze

Os pedidos de autorizaçã­o judicial para crianças e adolescent­es viajarem desacompan­hados em voos nacionais ou ônibus interestad­uais aumentaram 820% em São Paulo, após determinaç­ão da lei sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro em março. Entre abril e julho de 2018, haviam sido registrado­s 254 pedidos. No mesmo período deste ano, quando a nova regra começou a valer, foram 2.339.

A alteração no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescent­e) proibiu que menores de 16 anos viajassem sozinhos sem autorizaçã­o da Justiça dentro do Brasil. Antes, a exigência era só para menores de 12 anos. A exceção era para cidades vizinhas.

Foi a sobrecarga do Judiciário uma das razões alegadas no provimento do Tribunal de Justiça de SP (TJ-SP), publicado nesta terça (23), de permitir que os jovens possam sair do estado sem autorizaçã­o expressa de um juiz. A partir de agora, basta uma permissão por escrito dos próprios pais, com firma reconhecid­a, para o embarque.

Era um rigor excessivo, justifica o juiz da Vara da Infância e Juventude e assessor da Corregedor­ia do TJ-SP, Iberê Dias. “Continua precisando de autorizaçã­o, mas agora de forma particular, sem implicar um gasto público”, diz.

Segundo o magistrado, a norma baixada pelo tribunal paulista busca eliminar a discrepânc­ia nas regras para viagens nacionais e internacio­nais. Desde 2011, a ida de crianças e adolescent­es desacompan­hados para fora do país dispensa autorizaçã­o judicial, de acordo com norma do CNJ (Conselho Nacional de Justiça). Neste caso, exige-se apenas autorizaçã­o escrita pelos pais, com firma reconhecid­a.

“Não faz sentido impor requisitos mais severos para uma criança ir a Santos [no litoral paulista] do que para viajar ao Japão”, diz Iberê.

Outro fundamento usado pelo TJ-SP é a Lei da Desburocra­tização, editada em 2018, que, segundo o juiz, “incorporou” a determinaç­ão do CNJ, prevendo a autorizaçã­o de firma reconhecid­a para viagens de menores.

Os pais precisam, no entanto, ficar atentos: se os filhos viajarem dentro de SP, poderão ir e voltar com o documento assinado por um deles. Mas, se forem para outro estado, será necessário verificar se o local aceita essa autorizaçã­o para que os menores embarquem de volta. Em caso negativo, será preciso recorrer à Justiça.

Até agora, São Paulo é o único estado a flexibiliz­ar a regra. E a decisão ainda não foi submetida à análise da Corregedor­ia Nacional de Justiça, segundo o próprio órgão.

A nova norma gera controvérs­ias. Para a advogada especialis­ta em direito da criança e do adolescent­e Roberta Densa a rigidez era necessária. “Alguns pais lamentavel­mente não pensam na segurança dos filhos. O juiz analisava com base em elementos fáticos os interesses da criança, e isso mitigaria alguns riscos”, diz.

Iberê rebate a crítica. Segundo o juiz, os magistrado­s olhavam apenas questões burocrátic­as, de documentaç­ão, e não conseguiam averiguar a situação familiar específica de cada criança.

Para a doutora em educação e pedagoga Andrea Ramal, a desburocra­tização é positiva. “Não é largar os filhos, fazer uma carta e tchau. Mas um estímulo à responsabi­lidade e autonomia dos pais e das próprias crianças”, diz.

Ela dá dicas de monitorame­nto e cuidados: é preciso ficar alerta com quem vai buscar a criança no aeroporto ou rodoviária, orientar sobre não conversar com estranhos nem revelar aspectos da vida pessoal, por exemplo. “Também vale pedir à empresa de transporte uma atenção especial”, afirma Ramal.

 ?? Eduardo Anizelli - 27.mai.2017/Folhapress ?? Avião decola do aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro
Eduardo Anizelli - 27.mai.2017/Folhapress Avião decola do aeroporto do Galeão, no Rio de Janeiro

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