Moro se desgasta com Poderes e até com o Planalto
Ministro da Justiça sofre derrotas no Congresso e no Judiciário em meio a crise de confiança com presidente e risco de queda de aliado
A atuação de Sergio Moro (Justiça) nas últimas semanas intensificou seu desgaste em Brasília e deu força a ofensiva contra ele no Legislativo e no Judiciário. Até a relação com Jair Bolsonaro está abalada. Ontem, o presidente disse que o ministro “não julga mais ninguém”.
A atuação do ministro Sergio Moro (Justiça) nas últimas semanas intensificou seu desgaste em Brasília e deu força a uma ofensiva dos três Poderes contra ele.
O Legislativo impôs derrota a Moro na terça (6) ao retirar do texto do projeto anticrime o chamado “plea bargain” que era planejado (tipo de solução negociada entre o Ministério Público, o acusado de um crime e o juiz) e articula novas mudanças na semana que vem contrárias ao interesse do ministro.
No Judiciário, ao menos duas decisões do STF (Supremo Tribunal Federal) foram contabilizadas como contrárias ao ex-magistrado: a preservação do conteúdo de mensagens de autoridades interceptadas por hackers, com envio à corte na segunda (5) de cópia do inquérito da Polícia Federal que trata do assunto, e a rejeição na quarta (7) da transferência do expresidente Lula de Curitiba para São Paulo —que havia sido pedida pela PF, subordinada a Moro.
No Palácio do Planalto, o presidente Jair Bolsonaro tem dado anuência para a demissão de um aliado do ministro no Coaf (órgão de inteligência financeira) e deu “caneladas” recentes que enfraqueceram Moro.
Nesta quinta (8), alfinetou o ministro ao pedir que ele tenha “paciência” com a tramitação do pacote anticrime, afirmando que a prioridade do governo é a aprovação de medidas econômicas.
Disse ainda que, como juiz, Moro estava acostumado a ter a caneta na mão, mas que no papel de ministro suas decisões não podem ser unilaterais.
“O ministro Moro é da Justiça, mas ele não tem poder de... Não julga mais ninguém. Então, temos que, entendo a angústia dele, em querer que o projeto dele vá para a frente, mas nós temos que combater, diminuir o desemprego, fazer o Brasil andar, abrir o nosso comércio”, disse, afirmando que a proposta do chefe da Justiça não pode atrapalhar a aprovação de projetoschave como as reformas previdenciária e tributária.
O ex-magistrado já vinha sob pressão desde divulgação, em 9 de junho, de mensagens obtidas pelo site The Intercept Brasil trocadas por ele e integrantes da força-tarefa da Lava Jato pelo aplicativo Telegram.
As reações adversas envolvendo os três Poderes se intensificaram desde então, fragilizando o papel do ex-juiz da Lava Jato escolhido inicialmente para ser um “superministro” no governo Bolsonaro.
Segundo aliados do presidente, a relação entre ele e o ministro está abalada. Eles tiveram uma conversa ríspida durante um encontro nesta semana.
O ministro Paulo Guedes (Economia) tem sido pressionado, com aval de Bolsonaro, a demitir o presidente do Coaf, Roberto Leonel, indicado por Moro.
Na semana passada, Bolsonaro disse que não cabia a Moro decidir sobre a destruição das mensagens investigadas no âmbito da Operação Spoofing, que apura o caso dos hackers que teriam acessado mensagens da Lava Jato.
De acordo com auxiliares, Bolsonaro ficou irritado com a atitude de Moro de ligar para as autoridades atingidas pelas invasões para informá-las de que os diálogos capturados seriam destruídos.
Nesta quinta, após dizer que as derrotas sofridas pelo ministro no Congresso com o pacote anticrime são “parte do jogo” e que é preciso “saber jogar”, Bolsonaro chamou Moro para participar de sua live semanal e falar da proposta.
Na transmissão, Moro tentou dissociar a sua imagem do do conjunto de medidas. Disse que a proposta não é sua, mas do governo Bolsonaro, e apelou à sensibilidade dos deputados federais para que ela seja aprovada neste ano.
“A gente respeita muito a pauta da Câmara, apenas estamos chamando a sensibilidade desse projeto. Se me permite uma correção: não é um projeto do Moro, é um projeto do governo Jair Bolsonaro e é um projeto que interessa a sociedade em geral”, disse.
Deputados, porém, planejam impor um novo revés ao ex-juiz na semana que vem com a rejeição do relatório do deputado Capitão Augusto (PL-SP), fiel ao texto de Moro.
Parlamentares devem apresentar um projeto substitutivo ao original entregue pelo ministro da Justiça.
Chefe da equipe econômica, Guedes também se queixa de que está sofrendo por tabela as retaliações que integrantes do Judiciário, do Congresso e de órgãos de controle estão impondo ao ex-juiz.
O ministro da Economia recebeu telefonemas de parlamentares para informá-lo de que a rejeição a Leonardo Bandeira Rezende, indicado por ele para ser conselheiro do Cade (Comissão de Assuntos Econômicos), era, na verdade, uma retaliação a Moro.
Ele e o ministro da Justiça haviam enviado juntos dois nomes para o colegiado do órgão de regulação, mas o Senado manifestou resistência às indicações.
Preocupado com a possibilidade de a Casa impor derrotas a projetos importantes, Bolsonaro entrou em jogo e decidiu que ele mesmo fará as indicações para o Cade.
Segundo aliados, apesar de incomodado, Moro diz que não deixará o cargo. Nos bastidores do Judiciário, há um temor de que a gestão Bolsonaro possa iniciar um processo de fritura pública do ministro.