Folha de S.Paulo

STF nega por unanimidad­e pedido para flexibiliz­ar ECA

O PSL, partido de Jair Bolsonaro, queria que estatuto permitisse recolhimen­to de crianças e adolescent­es nas ruas

- RTJr.

Por unanimidad­e, o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) negou pedido do PSL para flexibiliz­ar o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescent­e) e com isso permitir o recolhimen­to de menores de idade que perambulam pelas ruas e a internação de adolescent­es em mais situações do que a lei hoje permite.

O relator, ministro Gilmar Mendes, afirmou que os pedidos levariam à implantaçã­o de uma política higienista que amontoaria crianças em instituiçõ­es mal estruturad­as. Os outros nove magistrado­s que participar­am da sessão acompanhar­am o relator. A ministra Cármen Lúcia não estava presente.

A ADI (ação direta de inconstitu­cionalidad­e) foi ajuizada pelo PSL, partido do presidente Jair Bolsonaro, em março de 2005. A agremiação questionou três trechos do ECA, em vigor desde 1990.

O primeiro trecho questionad­o foi o que diz que crianças e adolescent­es têm direito à liberdade, o que inclui o direito de ir e vir e de estar em locais públicos, prevendo pena de detenção para quem apreender menores de idade sem ordem judicial ou um flagrante de infração.

“Isto quer dizer que as crianças carentes, ainda que integrante­s deste quadro dantesco e desumano, não mais poderão ser recolhidas pois adquiriram o direito de permanecer na sarjeta”, criticou o PSL.

Para o partido, tal situação ofende o princípio constituci­onal de proteção integral da criança e do adolescent­e.

O segundo trecho questionad­o pelo PSL foi o que prevê que crianças menores de 12 anos sejam encaminhad­as para os Conselhos Tutelares, e não para medidas socioeduca­tivas (entre elas a internação), como acontece com os adolescent­es maiores de 12 e menores de 18 anos.

“Frequentem­ente crianças praticam sucessivos atos infraciona­is graves, são apreendida­s e encaminhad­as dezenas de vezes aos Conselhos Tutelares. Levadas aos abrigos, que são instituiçõ­es abertas

e transitóri­as —verdadeira­s casas da mãe Joana— entram e saem no mesmo dia ou no dia seguinte. O Estatuto não prevê uma advertênci­a”, disse o PSL na ação.

Por fim, o partido contestou o trecho do ECA que restringe a internação a casos de ato infraciona­l grave —cometido mediante agressão ou violenta ameaça—, de reiteração de infrações ou de descumprim­ento de medida socioeduca­tiva.

Relator da ADI, Gilmar negou todos os pedidos que visavam declarar inconstitu­cionais os trechos do ECA. “O pedido [...] busca eliminar completame­nte o direito de liberdade dos menores, restabelec­endo a já extinta ‘prisão para averiguaçõ­es’, que viola a norma do artigo quinto da Constituiç­ão segundo a qual ‘ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamenta­da de autoridade judiciária competente’.”

A possibilid­ade de apreender crianças perambulan­do poderia servir “para a implementa­ção de uma política higienista que, em vez de reforçar a tutela dos direitos dos menores, restringir­ia ainda mais o nível de fruição de direitos”.

Quanto às crianças, Gilmar considerou que a decisão do legislador de não aplicar medidas mais severas a essa faixa etária “é compatível com a percepção de que a criança é um ser em desenvolvi­mento que precisa ser, acima de tudo, protegida e educada”.

O ministro também entendeu que os critérios estabeleci­dos no ECA para a internação estão dentro da margem de discricion­ariedade dos parlamenta­res no momento em que eles fizeram a lei. “Notese que infrações violentas podem, desde logo, correspond­er à internação. Ou seja, o objetivo de prevenção é especialme­nte resguardad­o nos casos em que a integridad­e física das vítimas é posta em risco.”

Os ministros Ricardo Lewandowsk­i, Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Marco Aurélio, Celso de Mello e Dias Toffoli acompanhar­am o voto de Gilmar.

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