Folha de S.Paulo

Ídolas do futebol

Não é todo dia que 45 mil pessoas gritam o nome de uma mulher no estádio

- Renata Mendonça Jornalista, passou por ESPN e BBC. Escreve no Dibradoras, blog sobre mulheres no esporte

Muita gente que viu Cristiane brilhando na Copa do Mundo, fazendo três gols na estreia da seleção brasileira, não sabia muito bem quem era ela. O próprio Google mostrou — as buscas pelo nome dela aumentaram 7.800% naquele dia. O Brasil “descobriu” mais uma craque do seu futebol e muitas outras foram descoberta­s ao longo da competição.

O que muitos desses que se admiraram com o talento das brasileira­s na Copa não sabem é que podemos ver algumas delas aqui pertinho. Cristiane, a artilheira do Brasil nesse Mundial, é um exemplo. Desde o início deste ano, ela joga no São Paulo. Eu apostaria que ainda tem muito são-paulino que não sabia disso.

Nesta semana, houve uma boa oportunida­de para descobrire­m. O noticiário foi todo voltado para a apresentaç­ão de Daniel Alves no São Paulo.

No evento, entre as mensagens enviadas por ídolos tricolores e amigos de Daniel —de Casemiro a Miranda, de Suárez a Messi— havia uma mulher ali. Uma ídolA (com o perdão da licença poética para “criar” o substantiv­o feminino aqui) do futebol —e do São Paulo também. Cristiane fez um vídeo de boas-vindas ao lateral e, naquele momento, um Morumbi inteiro com 45 mil pessoas gritou o nome dela.

“É, Cristiane! É, Cristiane!”, o estádio vibrou em uníssono. Mais do que por Messi, mais do que por Suárez, a torcida do São Paulo vibrou por uma “ídolA” que veste a camisa tricolor. Um momento que passou em branco por toda a imprensa que cobria o evento, mas que é um tanto simbólico e precisa ser registrado.

Não é todo dia que 45 mil pessoas gritam o nome de uma mulher no futebol. Não é todo dia que um clube lembra de uma jogadora no momento em que todos os holofotes estão no time masculino, com seu reforço recém-chegado.

Ações como essa são importante­s para aproximar o torcedor do time feminino. O futebol dos homens já tem uma cultura centenária pré-estabeleci­da, mas o das mulheres ainda precisa criar seus laços, seus vínculos com as grandes torcidas. E a Copa já mostrou o potencial que esse esporte tem: a audiência para os jogos delas foi histórica no Brasil.

Quando existe essa integração do futebol masculino e feminino dentro do mesmo clube, todo mundo sai ganhando.

Tem corintiano, por exemplo, que não sabe que o time feminino do Corinthian­s não perde desde o dia 27 de março e chegou à marca de 24 vitórias consecutiv­as (igualando recorde do Coritiba no futebol brasileiro). A Tamires, lateral esquerda que brilhou pela seleção na Copa, veste a camisa alvinegra e já tem distribuíd­o assistênci­as pelo clube no Brasileiro. As zagueiras Erika e Monica, da seleção, também jogam lá.

Tem flamenguis­ta que não sabe que o Flamengo teve a chance de disputar a Libertador­es feminina neste ano, mas abdicou dela. Tudo porque o clube só dá a camisa para o time da Marinha disputar as competiçõe­s, e a decisão dela foi disputar os Jogos Mundiais Militares na mesma data.

E tem cruzeirens­e lamentando a fase ruim do time no masculino sem saber que no feminino as “Cabulosas” são só alegria, finalistas da Série A2, com vaga garantida na primeira divisão e 10 vitórias nos últimos 11 jogos.

Tudo isso para dizer que o futebol é uma paixão única e, se passamos a vida admirando os jogadores do nosso time, hoje podemos também admirar (e valorizar) as craques que vestem a mesma camisa.

| dom. Juca Kfouri, Paulo Vinícius Coelho, Tostão | seg. Juca Kfouri, Paulo Vinícius Coelho | qua. Tostão | qui. Juca Kfouri | sex. Renata Mendonça | sáb. Katia Rubio

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