Folha de S.Paulo

O time brasileiro não está no nível dos oito melhores da Europa

Jorge Jesus cometeu erro crasso no meio do 2º tempo, ao substituir Everton e Arrascaeta ao mesmo tempo

- José Padilha

Flamenguis­ta e cineasta

Sempre que escrevo sobre política, e em particular sobre a corrupção sistêmica da política no Brasil, tenho o cuidado de dizer que não tenho preferênci­as ideológica­s, pura e simplesmen­te porque não acredito que existam grandes frameworks teóricos capazes de explicar os fenômenos sociais em geral, pretensão implícita na crença de todo e qualquer ideólogo.

E como não tenho ideologia, quando escrevo sobre os políticos brasileiro­s, o faço de cabeça fria e sem rabo preso. Por isso, não vejo salvação para PT, PSDB e MDB. E abomino a direita estúpida que apoia o governo de Bolsonaro.

Mas este texto não é sobre política, é sobre futebol, de modo que vou logo adiantando que, antes de ser cineasta, sou flamenguis­ta. Meu avô, José Bastos Padilha, foi presidente do clube na década de 1930 e é creditado como o administra­dor responsáve­l pela nacionaliz­ação do clube e pelo aumento exponencia­l da sua imensa torcida.

Neste artigo, não serei neutro, serei Flamengo.

Isto posto, vamos ao jogo: o

Liverpool venceu com justiça. Não teve mais posse de bola, é verdade, mas teve muito mais chances de gol. Foram no mínimo seis oportunida­des claras do Liverpool contra duas não tão claras do Flamengo.

Além disso, Mister cometeu erro crasso no meio da etapa final: substituiu Arrascaeta e Everton ao mesmo tempo, matando o toque de bola do meio-campo. Ora, o que salvava o Flamengo era a posse. Quando o Liverpool controlava o jogo, chegava com perigo.

No fim, fiquei com a impressão de que, se os times se enfrentass­em 10 vezes, o Liverpool ganharia 7. Sem Arrascaeta e Everton, ganharia todas.

A verdade é que o Flamengo, pura e simplesmen­te, não está no mesmo nível dos oito melhores times da Europa. Joga de igual com todos os outros, mas não tem futebol para chegar às quartas de final da Champions League.

É possível que algum dia um clube brasileiro consiga montar um time capaz desse feito? A resposta padrão para esta pergunta é “não”, já que os clubes brasileiro­s não têm recursos para disputar jogadores com os clubes europeus. Mas será que isso é fato?

Suspeito que não. Se olharmos para a história recente do Flamengo, veremos que, durante a administra­ção do Bandeira de Mello, o time saiu de uma situação quase falimentar para um enorme superávit e o fez em grande velocidade.

Note ainda que isso ocorreu durante a derrocada econômica dos dois mandatos de Dilma e Temer. O Flamengo enriqueceu dentro de um país que empobrecia...

Eu sei: nem todos os times do Brasil têm uma base de torcedores capaz de gerar receitas como Flamengo e Corinthian­s. Mas se eles têm esta base, por que apenas agora, e apenas o Flamengo, conseguiu acertar suas contas e gerar superávit suficiente para montar um time à altura das oitavas da Champions?

A resposta me parece clara: porque a esmagadora maioria dos dirigentes do futebol brasileiro faz com seus times o que os nossos políticos fazem com a Petrobras.

Não fiz as contas, mas tenho a impressão de que, se o futebol brasileiro eliminar a corrupção interna dos próprios clubes, as propinas na transferên­cia de atletas, os times brasileiro­s de maior torcida têm, sim, como jogar de igual para igual com o Liverpool.

Aposto que, se a boa administra­ção rubro-negra continuar, em breve o Flamengo vai comprovar essa tese.

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