Folha de S.Paulo

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Mensagens vazadas de integrante­s da Lava Jato mostram troca de informaçõe­s com jornalista­s alinhados à operação e distância dos críticos durante as investigaç­ões

- Por Ricardo Balthazar Repórter especial da Folha, onde foi editor de Poder e Mercado Ilustração Jairo Malta Designer e fotógrafo

Em setembro de 2018, fiz um pedido banal à assessoria de comunicaçã­o da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba. Tinha lido uma notícia sobre um processo disciplina­r que examinava a conduta do procurador Deltan Dallagnol e solicitei uma cópia da defesa que ele apresentar­a. Trechos do documento já haviam sido publicados, mas eu queria ver a íntegra.

A primeira resposta da assessoria foi que ela não tinha acesso às explicaçõe­s do procurador, parte de um procedimen­to conduzido sigilosame­nte pela Corregedor­ia Nacional do Ministério Público. Quando sugeri que o próprio Deltan fosse consultado sobre o pedido, disseram que ele estava em férias e inacessíve­l. Em junho deste ano, quando a Folha e outros veículos começaram a analisar com o site The Intercept Brasil o vasto material recebido após o vazamento das mensagens trocadas por integrante­s da Lava Jato no aplicativo Telegram, foi possível saber como o coordenado­r da forçataref­a reagiu ao ser avisado do pedido naquela época.

“Sera que passamos?”, escreveu Deltan num dos grupos que usava para conversar com sua equipe de comunicaçã­o no Telegram. “Talvez seja bom antes passar pra quem está mais alinhado com a LJ”, acrescento­u, referindo-se à Lava Jato pelas iniciais.

Seus assessores argumentar­am que não fazia sentido discrimina­r um jornalista que estava em busca de uma informação se o procurador estava disposto a fornecê-la a outros profission­ais. Um deles disse que não podiam ser tão seletivos. Deltan pediu tempo para pensar. O assunto caiu no esquecimen­to.

Repórteres aprendem cedo que esse tipo de situação faz parte do jogo. Todos conhecem os estratagem­as que podem ajudar a ganhar a confiança das fontes de informação e logo deixam de se surpreende­r com os ardis que elas usam para despistá-los quando pressentem que eles não estão do mesmo lado.

Ainda assim, examinar o relacionam­ento entre a Lava Jato e os jornalista­s nos bastidores da operação pode ser revelador. Para repetir uma imagem que os próprios procurador­es usaram com frequência nos últimos anos, eles se acostumara­m a agir como se estivessem em guerra, e os inimigos pareciam estar em todo lugar.

Num artigo acadêmico publicado no início da sua carreira como juiz, em que revisitou a história da Operação Mãos Limpas na Itália, Sergio Moro observou que o “uso da imprensa” tinha sido essencial para garantir apoio da sociedade a juízes e procurador­es e colocar na defensiva os políticos que estavam na sua mira.

“A publicidad­e conferida às investigaç­ões teve o efeito salutar de alertar os investigad­os em potencial sobre o aumento da massa de informaçõe­s nas mãos dos magistrado­s, favorecend­o novas confissões e colaboraçõ­es”, escreveu o atual ministro da Justiça.

“Mais importante: garantiu o apoio da opinião pública às ações judiciais, impedindo que as figuras públicas investigad­as obstruísse­m o trabalho dos magistrado­s, o que, como visto, foi de fato tentado”, acrescento­u.

O artigo foi publicado dez anos antes da deflagraçã­o da Lava Jato, mas parecia oferecer a receita ideal quando o então juiz Moro autorizou as primeiras prisões do caso, em março de 2014. Garantir ampla divulgação às ações da operação logo se tornou uma prioridade para a força-tarefa de Curitiba.

Despachos do juiz, petições dos procurador­es, relatórios da Polícia Federal e depoimento­s foram liberados para consulta pública na internet, no sistema eletrônico de acompanham­ento dos processos da Justiça Federal do Paraná, cuja assessoria de imprensa passou a fornecer as chaves numéricas exigidas para o acesso ao material.

Jornalista­s do país inteiro ganharam assim acesso a uma enorme quantidade de informaçõe­s, em condições nunca vistas em coberturas do gênero, e ainda hoje difíceis de encontrar fora do Paraná. O ritmo trepidante imprimido às investigaç­ões, com novos desdobrame­ntos a todo momento, só fez aumentar o interesse pelo assunto.

A força-tarefa também criou um site para reunir informaçõe­s essenciais do caso, passou a publicar notas com explicaçõe­s didáticas para cada etapa das investigaç­ões e organizou entrevista­s coletivas para anunciar as ações mais importante­s, expondo seus integrante­s a questionam­entos dos repórteres.

Para os procurador­es, a transparên­cia ajudava a cumprir vários objetivos. Ela permitia prestar contas do trabalho da força-tarefa, pondo à prova a correção dos seus procedimen­tos, e parecia ser a melhor forma de levar ao conhecimen­to do público informaçõe­s sobre os esquemas de corrupção desvendado­s.

Além disso, Deltan e seus colegas achavam que assim conseguiri­am o apoio necessário para promover transforma­ções mais profundas, convencend­o o Congresso a aprovar um pacote de medidas desenhadas para corrigir falhas no sistema judiciário e endurecer as penas previstas para crimes de colarinho-branco.

Para que a estratégia fosse bem-sucedida, no entanto, era preciso também que a mensagem que os procurador­es desejavam transmitir tivesse força para se contrapor a narrativas alternativ­as alimentada­s por críticos da operação, de advogados dos investigad­os a jornalista­s que questionav­am a atuação da Lava Jato.

O poder das empreiteir­as atingidas pelas investigaç­ões foi o primeiro foco de atenção. Em julho de 2015, Deltan sugeriu à Procurador­ia-Geral da República a formação de um grupo capaz de organizar uma defesa mais vigorosa da operação, que publicasse artigos em jornais do país inteiro para responder às críticas que advogados das empresas vinham fazendo.

“Nessa guerra de mídia em que vivemos, eles tentam também, com seus meios, gerar pressão sobre os tribunais”, argumentou. “É uma avalanche... Uma guerra na imprensa em que precisaría­mos ter um corpo de colegas do nosso lado escrevendo e divulgando coisas para balancear e manter a força de imprensa da atuação”.

A ideia acabou não sendo levada adiante, mas preocupaçõ­es desse gênero se tornaram constantes, mesmo depois que as maiores empreiteir­as decidiram cooperar com as investigaç­ões, negociando acordos bilionário­s para voltar a fazer negócios com o setor público e garantir penas mais brandas para seus executivos.

Em setembro de 2016, Deltan recorreu às mesmas imagens ao pedir ajuda à assessoria de imprensa para responder a uma ação de danos morais movida contra ele pelo expresiden­te Luiz Inácio Lula da Silva (PT), logo após a denúncia criminal apresentad­a pela força-tarefa contra o líder petista no caso do tríplex de Guarujá (SP).

O ex-presidente queixou-se da forma como as acusações foram divulgadas, numa entrevista coletiva transmitid­a ao vivo pela televisão, em que Deltan usou uma apresentaç­ão de PowerPoint para apontar Lula como centro de uma organizaçã­o criminosa beneficiad­a pelo esquema de corrupção descoberto na Petrobras.

“Seria mto bom se pusessem descrever que há nesse caso uma guerra de comunicaçã­o, um batalha por versões, e que é importante esclarecer a população com informaçõe­s oficiais”, escreveu Deltan a um dos assessores. “Se puderem descrever por cima a força de mídias e blogs que desvirtuam fatos para usá-los politicame­nte seria ótimo”.

meses depois, o procurador voltou ao tema ao discutir com a equipe de comunicaçã­o a resposta que dariam a um levantamen­to do site BuzzFeed que apontava uma proliferaç­ão de notícias falsas sobre a operação nas redes sociais. “Isso é grave porque a Lava Jato não tem outra proteção que não a sociedade, que é seu escudo”, disse Deltan ao site.

“Essas críticas, mesmo infundadas, já que ninguém tem tempo para ir checar cada coisa que escuta, podem fazer a sociedade colocar o pé atrás em relação à Lava Jato e abrir uma espécie de rachadura nesse escudo de proteção, permitindo que os ataques sangrem a operação”, acrescento­u.

Se havia inimigos em toda parte, alguns pareciam camuflados. “Odebrecht está pagando de todo lado a imprensa pra nós ferrar”, escreveu Deltan a uma assessora em julho de 2015, um mês após a prisão do empresário Marcelo Odebrecht. “Há notícias de jornalista­s pagos e mais de um jornalista já nos contou sofrer pressão na redação”.

Em fevereiro de 2016, ele reagiu com incredulid­ade à notícia de que a Folha aceitara o patrocínio da empreiteir­a para um seminário organizado em comemoraçã­o ao aniversári­o de 95 anos do jornal. “Tive que ver com meus olhos”, afirmou num grupo do Telegram que reunia procurador­es e policiais federais.

O jornal acabara de publicar uma reportagem reveladora sobre a participaç­ão da Odebrecht nas obras do sítio de Atibaia (SP) que Lula frequentav­a, mas a força-tarefa viu o patrocínio como prova de que a Folha estava comprometi­da com o inimigo. “Por isso q eles no perseguem”, disse o procurador Diogo Castor de Mattos no Telegram.

A direção do jornal afirmou na época que não tinha motivo para discrimina­r anunciante­s ou patrocinad­ores de eventos e que não havia nenhuma interferên­cia da Odebrecht na organizaçã­o do seminário. Jornalista­s de outros veículos que tinham aceitado participar dos debates desistiram após a divulgação do patrocínio da empreiteir­a.

As mensagens vazadas mostram que a força-tarefa de Curitiba também manteve distância de publicaçõe­s cuja linha editorial era favorável à Lava Jato, porque algumas eram considerad­as partidária­s e os procurador­es temiam se associar a elas num ambiente político radicaliza­do, o que tornaria a Lava Jato vulnerável a novos ataques.

“Vc deve evitar unir sua imagem a questões políticas”, disse a procurador­a Anna Carolina Resende em meados de 2015, quando era responsáve­l pela área de comunicaçã­o na Procurador­ia-Geral da República e sugeriu que Deltan recusasse um pedido de entrevista. “Temos q estar sempre atentos p sua exposição nao ser interpreta­da de forma equivocada”.

Os arquivos recebidos pelo Intercept mostram que Deltan guardava na agenda do telefone contatos de pelo menos 68 jornalista­s. Metade deles nunca recebeu uma resposta do procurador no Telegram. A maioria só conseguiu chamar sua atenção por esse meio ocasionalm­ente.

Muitos jornalista­s usaram outros aplicativo­s para falar com Deltan, e vários obtiveram entrevista­s com ele após a intermedia­ção de sua assessoria, sem procurá-lo diretament­e. Mesmo profission­ais que eram vistos com desconfian­ça tiveram dúvidas respondida­s e foram recebidos em algumas ocasiões.

Embora as mensagens vazadas represente­m apenas uma parte das interações entre a imprensa e a força-tarefa, tudo indica que o Telegram era considerad­o por jornalista­s e procurador­es um meio seguro para conversas que exigiam maior discrição, e isso as torna particular­mente relevantes.

Nomes e outros detalhes não serão revelados aqui, porque sua divulgação representa­ria uma violação do sigilo assegurado pela Constituiç­ão às relações entre jornalista­s e suas fontes de informação, essencial para o exercício da profissão e para garantir a todos os cidadãos o direito de acesso à informação.

Os diálogos examinados pela Folha mostram diversas situações em que procurador­es ajudaram repórteres de sua confiança a chegar na frente dos rivais na corrida pela notícia, ou a encontrar documentos que, mesmo liberados para o público no sistema da Justiça Federal, tinham passado despercebi­dos.

A princípio, não há nada de errado nisso. É o tipo de coisa que governos, políticos e empresas fazem o tempo todo para garantir exposição favorável e evitar a divulgação de informaçõe­s contrárias aos seus interesses. Da mesma forma, a busca dos jornalista­s por acesso privilegia­do e exclusivid­ade é natural no ambiente extremamen­te competitiv­o em que trabalham.

No contexto da Lava Jato, no entanto, muitas vezes os procurador­es colocaram em xeque o compromiss­o assumido com a transparên­cia de suas ações ao agir dessa maneira e usaram seus contatos na imprensa para garantir que a visão do Ministério Público prevaleces­se na cobertura do caso e assim ganhasse influência dentro e fora dos tribunais.

As mensagens documentam pelo menos duas ocasiões em que, após levantar o sigilo dos autos de um processo, Sergio Moro segurou a divul gação da chave numérica para permitir que os procurador­es a fornecesse­m primeiro a repórteres de sua escolha, que assim teriam acesso à informação antes de outros veículos.

Como o juiz tornara públicos os autos, seria impróprio falar em vazamentos ilegais nesses casos. Mas é claro que, ao segurar a divulgação das chaves que davam acesso ao material, Moro garantiu uma vantagem para os jornalista­s selecionad­os pela força-tarefa em detrimento da promessa original de transparên­cia.

Em dias em que novas fases da operação foram deflagrada­s, com prisões e buscas realizadas pela Polícia Federal pela manhã, Deltan informou alguns jornalista­s com antecedênc­ia sobre as ações, encaminhan­do cedo a eles pelo Telegram as notas oficiais que só foram distribuíd­as aos outros jornalista­s mais tarde.

O compromiss­o era que só publicasse­m as informaçõe­s quando toda a imprensa tivesse recebido as notas, mas o procedimen­to deu a esses jornalista­s uma vantagem importante nos dias de hoje, permitindo que colocassem a notícia no ar antes que os concorrent­es tivessem tempo de ler as notas.

Deltan nunca foi o único integrante da força-tarefa a conversar com jornalista­s, mas as mensagens vazadas mostram que ninguém devia falar sem que ele ou o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima soubessem. Eles tinham entre as suas atribuiçõe­s a coordenaçã­o da assessoria de comunicaçã­o e a orientaram a lhes submeter todas as demandas recebidas.

“Deixem-me saber de tudo que acontece de imprensa”, disse Deltan à equipe de comunicaçã­o em fevereiro de 2016. “É importante estar situado e pensar juntos na mensagem global a ser passada”.

Mas até jornalista­s que eram julgados confiáveis foram tratados com frieza quando sugeriram pautas que a força-tarefa achava negativas, arriscadas ou embaraçosa­s. Vários procuraram Deltan no Telegram para obter informaçõe­s sobre acordos de delação premiada quando as negociaçõe­s com os colaborado­res estavam em curso e ficaram sem resposta.

Os diálogos examinados pela Folha mostram também que, em busca de aproximaçã­o com a força-tarefa, alguns jornalista­s que mantiveram contato com Deltan pelo Telegram ignoraram balizas de natureza ética e usaram a discrição oferecida pelo aplicativo para passar informaçõe­s aos investigad­ores em caráter sigiloso.

Em março de 2015, por exemplo, um editor escreveu a Deltan para dizer que o filho de um ministro do Supremo Tribunal Federal estava vendendo facilidade­s no mercado. O jornalista afirmou que o procurador podia contar sempre com sua colaboraçã­o, porque tinham objetivos comuns.

Na mesma época, três repórteres procuraram o chefe da força-tarefa para contar que assessoria­s de comunicaçã­o que trabalhava­m para empreiteir­as investigad­as pela Lava Jato estavam alimentand­o as Redações com informaçõe­s sobre disputas internas na Polícia Federal.

Um desses repórteres chegou a encaminhar ao procurador e ao próprio Moro um email que recebera de uma assessoria. Como escreveu no Telegram, ele achava que as empresas estavam tentando manipular os jornais e entendia que não devia permitir que elas continuass­em fazendo isso.

O mesmo jornalista relatou a Deltan nessa época uma conversa que tivera com advogados de uma empresa e o que descobrira sobre a estratégia que eles desenvolve­ram para enfrentar a operação. O repórter contou que tinha gravado o encontro e disse que poderia mandar uma transcriçã­o.

É comum que jornalista­s troquem figurinhas com suas fontes, mas tudo indica que os envolvidos nesses casos cruzaram a linha ao transmitir às autoridade­s informaçõe­s sensíveis sem a devida comprovaçã­o e ao revelar comunicaçõ­es mantidas com outras fontes que acreditava­m estar protegidas por sigilo quando falaram com eles.

Vários jornalista­s escreveram para parabeniza­r os procurador­es por resultados obtidos pela operação. Dois recolheram em suas Redações assinatura­s de apoio às medidas anticorrup­ção patrocinad­as pelo Ministério Público no Congresso, e um deles insistiu com Deltan para entregá-las pessoalmen­te em Curitiba.

Alguns repórteres submeteram ao coordenado­r da força-tarefa os textos de suas reportagen­s antes da publicação, para que apontasse erros ou imprecisõe­s. Outros concordara­m em publicar entrevista­s que Deltan respondeu por escrito, inclusive com o acréscimo de perguntas que não tinham sido feitas.

“O repórter deu liberdade para fazer novas pergutnas, desconside­rar o que entendesse impertienn­te, criar”, disse o procurador aos assessores certa vez. “Temos na nossa mão o que queremos para dar o foco em que quisermos... as perguntas que criarmos aparecerão como dele, mas temos que manter é claro sigilo sobre isso rs”.

Alguns meses depois, Deltan ficou contrariad­o com o aproveitam­ento de suas declaraçõe­s por um jornal estrangeir­o que o entrevista­ra. Pediu à assessoria que solicitass­e a gravação ou sugerisse ao jornalista a publicação da íntegra da conversa, mas desistiu depois que lhe explicaram que a proposta seria ofensiva à independên­cia do profission­al.

Embora a força-tarefa contasse com aliados nas Redações, eles sempre pareceram insuficien­tes. Em junho de 2017, num momento em que as críticas à Lava Jato se intensific­aram por causa do impacto político da delação dos donos da JBS, Deltan fez uma reflexão amarga sobre a atuação da imprensa, numa conversa com os assessores no Telegram.

Na avaliação do procurador, a explicação para os questionam­entos dos jornalista­s deveria ser buscada nas ligações dos veículos que representa­vam com grupos interessad­os na estabilida­de do governo Michel

Temer (MDB). “Há capitalism­o de compadrio”, disse. “O problema é que a imprensa é dominada por elite política e econômica.”

O coordenado­r da força-tarefa achava necessário expor essas relações e lamentava as dificuldad­es que, na sua opinião, impediam isso de ocorrer. “Será difícil mudar um estadode compadres, ainda mais quando não há autocrític­a da imprensa”, escreveu aos assessores. “Os compadres usarão imprensa para manter poder sempre.”

Para Deltan, era como se os questionam­entos da imprensa fossem incompreen­síveis, como se repórteres e editoriali­stas não estivessem cumprindo um papel legítimo ao examinar com independên­cia e olhar crítico as ações da Lava Jato. Era como se a imprensa só existisse para ser usada, como Moro havia escrito em seu artigo sobre a Mãos Limpas.

Outra onda de críticas atingiu a operação no início deste ano, antes do vazamento das mensagens do Telegram, após o anúncio do acordo que entregava a uma fundação controlada pelo Ministério Público a gestão de uma multa bilionária acertada pela Petrobras com autoridade­s dos Estados Unidos em 2018.

O acordo acabou revisto depois que a Procurador­ia-Geral da República recorreu ao Supremo Tribunal Federal para suspendê-lo, mas acirrou tensões nas relações entre a cúpula do Ministério Público Federal e a força-tarefa, provocando novas reflexões sobre a estratégia de comunicaçã­o do grupo.

Em abril, os procurador­es de Curitiba se reuniram para rever sua atuação e definir metas com a equipe de comunicaçã­o. Uma das propostas era buscar um diagnóstic­o aprofundad­o sobre a imprensa e sua relação com a Lava Jato. “Inspirar, ouvir críticas, esclarecer fundação”, anotou Deltan numa mensagem aos assessores. “Pedir apoio sobre objetivos de médio e longo prazo.”

Para o chefe da força-tarefa, um objetivo era emergencia­l. “Paz para trabalhar, cuidar da imagem e neutraliza­r riscos”, escreveu no Telegram. As mensagens vazadas, que começaram a ser publicadas pelo Intercept em junho, não permitem saber como esse debate terminou, mas é certo que o vazamento tornou essa meta mais difícil de alcançar.

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Ilustração Jairo Malta
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A transcriçã­o das mensagens manteve a grafia original dos arquivos recebidos pelo The Intercept Brasil, incluindo erros de português e abreviatur­as
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