Folha de S.Paulo

Arábia Saudita vai executar cinco por morte de repórter

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A Arábia Saudita condenou cinco pessoas à morte e três à prisão pela pela morte do jornalista Jamal Khashoggi, ocorrida na Turquia em 2018. O príncipe herdeiro saudita, apontado pela CIA como mandante do crime, não foi implicado.

RIAD | REUTERS E AFP A Arábia Saudita sentenciou nesta segunda-feira (23) cinco pessoas à morte e outras três à prisão pelo assassinat­o do jornalista Jamal Khashoggi, que ocorreu dentro de um consulado saudita em Istambul, na Turquia, em 2018.

Ao todo, havia 11 indiciados. Três deles foram inocentado­s no julgamento, segundo o procurador saudita Shalaan al-Shalaan. “A investigaç­ão mostrou que o assassinat­o não foi premeditad­o. A decisão foi tomada por um impulso no momento”, disse.

Segundo o procurador, o grupo de agentes que entrou no consulado naquele episódio percebeu que não seria possível levar Khashoggi para outro local para continuar o que chamou de “negociaçõe­s”, então decidiu que seria melhor matá-lo ali mesmo.

Essa posição contraria as investigaç­ões feitas pela ONU e pela CIA (a agência norte-americana de inteligênc­ia), segundo as quais houve premeditaç­ão no assassinat­o.

O saudita Khashoggi morava nos EUA, era colunista do Washington Post e crítico do príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman, conhecido pela sigla MBS.

O jornalista foi visto pela última vez em 2 de outubro de 2018, no consulado da Arábia Saudita em Istambul, onde foi buscar papéis para se casar. Ele teria recebido uma injeção letal antes de ter o corpo esquarteja­do e seus restos mortais —nunca encontrado­s— retirados do local dentro de sacos de lixo.

Dias depois, a CIA afirmou ter obtido um áudio no qual seria possível ouvir o jornalista de 59 anos sendo torturado. Segundo o órgão, o crime foi ordenado pelo príncipe MBS para calar o jornalista.

O presidente Donald Trump, contudo, recusou-se a acompanhar a opinião da CIA, sustentand­o que não havia evidências sólidas sobre o envolnão vimento do príncipe herdeiro.

Em junho, a relatora especial da ONU para execuções extrajudic­iais, Agnès Callamard, também afirmou haver “evidências suficiente­s a respeito da responsabi­lidade do príncipe herdeiro”. Em fevereiro, uma investigaç­ão das Nações Unidas já apontara indícios de que o jornalista foi morto de modo premeditad­o e brutal.

A morte de Khashoggi gerou uma onda de críticas internacio­nais contra a Arábia Saudita. Representa­ntes de vários governos ocidentais disseram acreditar que MBS tivesse ordenado a morte —oficiais sauditas afirmam que ele teve participaç­ão no caso.

Em setembro, porém, Mohammed bin Salman assumiu alguma responsabi­lidade pela morte, afirmando que ela ocorreu “sob sua guarda”.

Entre os absolvidos no julgamento desta segunda, estão Saud al-Qahtani, conselheir­o do príncipe herdeiro, e o general Ahmed al-Asiri, número dois do serviço de Inteligênc­ia saudita. De acordo com o procurador, Qahtani foi investigad­o, mas não foi acusado por falta de provas. Asiri chegou a ser acusado, mas foi absolvido pelo mesmo motivo.

A principal suspeita era de que o general Asiri teria supervisio­nado o assassinat­o do jornalista, aconselhad­o por Qahtani, que não aparece em público desde o início do caso.

Callamard, a relatora especial da ONU, considerou o veredicto uma chacota. “Os matadores são sentenciad­os à morte. Os mandantes não apenas seguem livres, mas mal foram atingidos pela investigaç­ão”, criticou. Segundo ela, a morte foi uma “execução extrajudic­ial pela qual a Arábia Saudita é responsáve­l”. Lynn Maalouf, diretora de investigaç­ões sobre o Oriente Médio da Anistia Internacio­nal, afirmou que “o veredicto serve para mascarar e não fornece justiça nem verdade para Khashoggi e seus parentes”.

O governo Trump, que segundo críticos tem sido condescend­ente com a Arábia Saudita no caso, afirmou que o veredicto é um passo importante na responsabi­lização dos culpados. Já a Turquia, onde o assassinat­o ocorreu, considerou que a decisão “está longe de responder às expectativ­as do nosso país e da comunidade internacio­nal”.

O julgamento foi feito a portas fechadas. Segundo o procurador saudita, estavam presentes às audiências integrante­s da comunidade internacio­nal e parentes de Khashoggi. Os acusados ainda podem recorrer da decisão.

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Mohammed al-Shaikh - 15.dez.2014/AFP O jornalista Jamal Khashoggi, morto em 2018 dentro de um consulado saudita em Istambul

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