Folha de S.Paulo

Toffoli usa avião da FAB para evento e estica viagem a resort

- Ranier Bragon, Camila Mattoso e Ricardo Balthazar

Ministro inaugurou fórum e seguiu para hotel de luxo; STF cita serviço e segurança

BRASÍLIA E SÃO PAULO O presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, usou aeronave da FAB (Força Aérea Brasileira) para ir a um evento em uma cidade de pouco mais de 10 mil habitantes na sexta (20), emendando a estadia por todo o fim de semana em um resort de luxo na região.

O ministro partiu de Brasília rumo a Ourinhos (SP) — uma distância de 1.050 km— no início da tarde de sexta-feira (20), acompanhad­o de outras 11 pessoas. O único evento oficial que participou foi a inauguraçã­o, ainda na tarde de sexta, do Fórum Eleitoral de Ribeirão Claro (PR) —cidade de apenas 10.668 habitantes—, que ganhou o nome do seu pai, Luiz Toffoli.

Após o evento, o ministro prolongou a estadia na região indo para o Tayayá Aquaparque, resort de luxo cuja diária comum é de R$ 915. Toffoli só deixou a cidade nesta segunda-feira (23), em voo da FAB.

Decreto federal 4.244/2002, que disciplina o transporte aéreo de autoridade­s federais em aeronave da Aeronáutic­a, permite o uso em quatro situações: viagens em serviço, por motivos de segurança, emergência médica ou para deslocamen­to para o local de residência permanente.

O mesmo dispositiv­o legal estabelece que “o transporte de autoridade­s civis em desrespeit­o ao estabeleci­do neste decreto configura infração administra­tiva grave, ficando o responsáve­l sujeito às penalidade­s administra­tivas, civis e penais aplicáveis à espécie”.

Em nota, a assessoria de imprensa do Supremo afirmou que o ministro viajou ao Paraná para inaugurar o fórum a convite do presidente do Tribunal Regional Eleitoral do estado, Gilberto Ferreira.

“Conforme prevê o decreto 4.244/2002, trata-se de viagem a serviço e também que envolve questões de segurança do presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça”, diz a nota.

Não houve manifestaç­ão sobre o prolongame­nto da viagem no resort nem sobre quem foram os outros 11 acompanhan­tes na viagem.

Hóspedes do hotel de luxo confirmara­m à Folha a presença do ministro no local durante o fim de semana, em situação de lazer, acompanhad­o de agentes de segurança. O ministro é de Marília (SP), distante 142 km de Ribeirão Claro, e tem parentes na região.

Segundo pessoas que participar­am da inauguraçã­o do fórum, na sexta, vários irmãos de Toffoli estiveram presentes à solenidade. De acordo com esses relatos, integrante­s da cúpula do Judiciário do Paraná também comparecer­am. O governador Ratinho Jr. (PSD) mandou representa­ntes.

Após a solenidade houve convite para um jantar no resort, com informação de que haveria uma “pelada” no dia seguinte. À Folha a gerência do Tayayá disse que, por questões legais, não poderia dar informaçõe­s sobre hóspedes.

Em agosto, a Folha revelou que o procurador Deltan Dallagnol incentivou colegas em Brasília e Curitiba a investigar Dias Toffoli sigilosame­nte em 2016, numa época em que o atual presidente do STF começava a ser visto pela Lava Jato como um adversário disposto a frear seu avanço.

Mensagens obtidas pelo The Intercept Brasil e analisadas pela Folha junto com o site revelaram que Deltan, coordenado­r da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, buscou informaçõe­s sobre as finanças pessoais de Toffoli e de sua mulher e evidências que os ligassem a empreiteir­as envolvidas com a corrupção na Petrobras.

Entre outras suspeitas levantadas pelo procurador estava uma suposta sociedade de Toffoli em um hotel no interior do Paraná, o mesmo que foi visitado pelo ministro no fim de semana.

“Pelella, segundo informaçõe­s, Toffoli é sócio oculto do primo, Beto, no Tayaya Aqua Park Resort. Este resort situase em Ribeirão Claro”, escreveu Deltan para seu colega, Eduardo Pelella, que era o então chefe de gabinete do então procurador-geral, Rodrigo Janot. Pelella respondeu: “Opa!!!”.

Em seguida, Deltan pediu a um integrante da força-tarefa da Lava Jato que procurasse informaçõe­s sobre o resort nas bases de dados da equipe. No dia seguinte, teve como resposta que nada relevante havia sido encontrado na pesquisa societária.

Ministros do STF não podem ser investigad­os por procurador­es da primeira instância, como Deltan e os demais integrante­s da força-tarefa. A Constituiç­ão diz que eles só podem ser investigad­os com autorizaçã­o do próprio tribunal, onde quem atua em nome do Ministério Público Federal é o procurador-geral da República.

À época, a força-tarefa afirmou que é seu dever encaminhar à PGR informaçõe­s sobre autoridade­s com direito a foro especial no STF sempre que as recebe, e que isso tem sido feito de forma legal.

Nem a assessoria do STF nem o Tayayá Aquaparque respondera­m às perguntas da Folha sobre eventuais relações comerciais e de parentesco entre Toffoli e os responsáve­is pelo empreendim­ento.

Em julho, a Folha mostrou que Toffoli tinha feito ao menos 73 voos em aviões da FAB desde que assumira a presidênci­a do STF, em setembro de 2018. Em igual período no cargo, sua antecessor­a, Cármen Lúcia, viajou 30 vezes.

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Reprodução/Aventure-se/Youtube Área do resort Tayayá, em Ribeirão Claro (PR)
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