Folha de S.Paulo

Novo treinador do Santos ensinou Zidane a correr

- Klaus Richmond

santos Escolhido pelo Santos para suceder Jorge Sampaoli em 2020, o português Manuel Jesualdo Ferreira, 73, chega ao Brasil carregando a fama de um estudioso do futebol.

Jesualdo recebeu em Portugal o apelido de “O Professor”. Por alguns, ainda é chamado, também, de “professor dos professore­s” devido ao histórico de quatro décadas dedicadas intensamen­te ao esporte. Viver do futebol, porém, foi um caminho difícil.

Criado pelos tios quando foi para Lisboa, Jesualdo recebia apoio apenas com um objetivo, que ele cursasse a faculdade de medicina. Foi proibido de jogar futebol e não o deixaram servir o Exército, mas o sonho de entrar para o mundo do futebol jamais se apagou.

Após uma carreira pouco promissora no futebol amador, aos 20 anos, ainda na metade da década de 1960, ele iniciou o curso de educação física pelo Instituto Superior de Educação Física de Lisboa.

Poucos anos depois, entrou para a área acadêmica e foi professor de técnicos ilustres. O primeiro deles foi Carlos Queiroz, auxiliar de Alex Ferguson no Manchester United por longos anos e ex-treinador da seleção portuguesa.

Enquanto lecionava, começou a trabalhar nas categorias de base do Benfica, em 1979. Em 1981, recebeu de um exaluno o convite para treinar o Rio Maior, seu primeiro trabalho em um time profission­al.

Passou por outros clubes como Torreense e Academica até voltar ao Benfica, desta vez como auxiliar de Antonio José Conceição Oliveira, o Toni, ex-meio-campista do Benfica e da seleção portuguesa.

Jesualdo acompanhou o amigo no Bordeaux, quem, em 1995, recebeu promissor meia chamado Zinédine Zidane, então com 21 anos. A passagem foi inesquecív­el.

“Quando chegamos, ouvimos do presidente que Zidane só jogava 60 minutos, que não aguentava correr”, conta Toni à Folha. A informação não foi bem aceita. “Rebatemos, falamos que um jogador top não poderia jogar só isso”.

O trabalho com Zidane foi realizado à exaustão para melhorar a resistênci­a física da jovem promessa. No fim da temporada, o atleta foi um dos que mais atuou pela equipe e acabou sendo negociado com a Juventus (ITA).

“Sabíamos que ele seria o melhor do mundo três vezes? Não, só víamos que era um talento. Falamos para ele, você aprenderá três coisas conosco: correr, correr e correr.”

O trabalho no Bordeaux foi o fim da parceria entre os amigos. Mas a carreira de Jesualdo decolou depois disso.

Foi responsáve­l por modernizar e consolidar o Sporting Braga como quarta força do de Portugal. No Porto, foi tricampeão nacional de 2007 a 2009.

A melhoria de desempenho de jogadores é uma das caracterís­ticas do técnico, elogiado por jogadores como o atacante colombiano Radamel Falcao García e do meia português Ricardo Quaresma, ambos na passagem pelo Porto.

“Jesualdo me ensinou o que um atacante precisa e deve fazer. Corrigiu o meu futebol”, disse Falcao, em entrevista à revista France Football.

“Ele exigia muito de nós, mas é sempre tranquilo e sereno”, conta o atacante brasileiro Bruno Moraes, ex-Porto e atualmente no Trofense (da terceira divisão portuguesa).

No currículo, porém, tem passagens sem muito brilho por Málaga (ESP), Panathinai­kos (GRE) e Sporting (POR).

Orgulha-se pelo fato de ter sido campeão nacional em diferentes continente­s. Levantou troféus na África, com o Zamalek (EGI), e na Ásia à frente do Al-Sadd (QAT).

Jesualdo virou referência para uma legião de técnicos portuguese­s e tem o respeito de Jorge Jesus e José Mourinho.

Ele assina contrato para ser o 16º estrangeir­o a comandar o Santos até o fim de 2020 e chega em um momento de alta de técnicos estrangeir­os no Brasil, principalm­ente pelo sucesso de Jesus no Flamengo.

Em julho, porém, Jesualdo disse ao jornal português A Bola que o conterrâne­o estava trabalhand­o “na pior liga do mundo”, em referência à competição do futebol brasileiro. A declaração foi rebatida pelo treinador do clube rubro-negro dias depois.

“Jesualdo tem uma personalid­ade totalmente distinta da de Jorge Jesus”, afirma Toni. “Conversamo­s muito. Há momentos em que a questão financeira não é o mais importante. Não é isso que o traz ao Brasil. Sei que é a paixão que tem que o leva a esse desafio.”

Ele deverá ser apresentad­o pelo clube no dia 6 de janeiro.

 ?? Divulgação/Al-Saad ?? O português Jesualdo Ferreira em seu último trabalho, pelo Al-Sadd (QAT)
Divulgação/Al-Saad O português Jesualdo Ferreira em seu último trabalho, pelo Al-Sadd (QAT)

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil