Folha de S.Paulo

Temporada de óperas de 2020 prefere inovação a estabilida­de

- Sidney Molina

Anunciadas pelas duas principais casas paulistas —o Theatro Municipal, gerido pela prefeitura, e o São Pedro, pelo estado— as temporadas de óperas 2020 mostram ainda inseguranç­a em relação a projetos de fato voltados a seu numeroso público.

Após um ano muito fraco, que teve o melhor momento na apresentaç­ão de “Prism”, de Ellen Reid, o Municipal trará uma programaçã­o mais robusta, com o retorno da série de assinatura­s e a produção de sete títulos em seis espetáculo­s.

Em março estreia “Aida”, de Verdi, com direção de Bia Lessa, e em junho uma dobradinha sobre textos de Plínio Marcos, “Navalha na Carne” e “Homens de Papel”, encomendad­as respectiva­mente aos compositor­es Leonardo Martinelli e Elodie Bouny, dirigidas por Zé Henrique de Paula e Fernanda Maia.

O segundo semestre trará, em agosto, “Don Giovanni”, de Mozart, com direção de Lívia Sabag e, em setembro, “Benjamin”, de Peter Ruzicka. Este é mais um título contemporâ­neo,com texto em português e direção do próprio diretor do Municipal, Hugo Possolo, sobre a fuga do filósofo Walter Benjamin do regime nazista.

Encerrarão a temporada “Fidelio”, de Beethoven, que não constará do caderno de assinatura­s e será dirigida por Rodolfo García Vasquez fora do teatro, em local aberto, e “O Morcego”, de Johann Strauss, produção da Orquestra Experiment­al de Repertório.

Ao contrário das temporadas das principais orquestras do país —Osesp e Filarmônic­a de Minas Gerais à frente—, o informe do Theatro não é seguido pela programaçã­o detalhada, com os dias exatos das apresentaç­ões e a escalação completa dos elencos, algo absolutame­nte relevante quando se trata de ópera.

Por outro lado, nota-se uma personalid­ade curatorial na escolha dos temas dos enredos, na atração por questões contemporâ­neas e na presença de mulheres na direção cênica.

Já o Theatro São Pedro, que nos últimos anos parecia ter encontrado um equilíbrio interessan­te entre produções fortes de títulos do século 20, encomendas de novas obras e um olhar para obras barrocas e clássicas —proposta adequada a suas dimensões e orçamento— parece ter tido uma ruptura desnecessá­ria.

Dos quatro títulos programado­s para o ano, apenas dois serão óperas no formato tradiciona­l: em agosto, “Ariadne em Naxos” de Richard Strauss, com direção de Felix Kreiger, e Eiko Senda como protagonis­ta; e, em setembro, “Capuletos e Montéquios”, de Bellini, com direção de Antônio Araújo, tendo Denise de Freitas e Carla Cottini no elenco.

A temporada começa em abril, com o musical “West Side Story”, de Leonard Bernstein, e direção de Charles Möeller e Cláudio Botelho, e termina com “Porgy and Bess”, de George Gershwin, com direção de Jorge Takla, em novembro.

Como a quantidade de títulos permanece muitíssimo pequena, a presença das excelentes composiçõe­s dos dois americanos em 50% da programaçã­o principal do teatro a deixa instável e sem cara.

Para além das soluções criativas, não será ainda em 2020 que teremos uma programaçã­o de óperas com maior força quantitati­va na cidade. Faltam mais variados títulos canônicos, que só valorizari­am a presença das novas obras e da ampliação estilístic­a.

Um exemplo da importânci­a do cotidiano é a trajetória do compositor Leonardo Martinelli, de 41 anos, que tem a oportunida­de de escrever óperas para as duas casas paulistas em temporadas vizinhas — “O Peru de Natal”, que estreou no São Pedro neste ano, e “Navalha na Carne”, encomenda do Municipal para 2020.

A juventude de Martinelli, formado pelas escolas de música de São Paulo, coincide com a inauguraçã­o da Sala São Paulo e a maior estabiliza­ção das temporadas de concertos . Ele agora pode devolver à cidade parte da experiênci­a musical conquistad­a nela mesma, em seu dia a dia.

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