Folha de S.Paulo

Gogónomics, ano um

Só a reforma da Previdênci­a aconteceu, mas de modo diferente do previsto pelo governo

- Nelson Barbosa Professor da FGV e da UnB, ex-ministro da Fazenda e do Planejamen­to (2015-2016). É doutor em economia pela New School for Social Research.

Chegamos ao final do ano, e é hora de fazer balanço da política econômica. Entramos 2019 com o governo repetindo os erros do time Temer: economia estagnada com inflação despencand­o, mas juro básico parado em 6,5% e, pasmem, corte de despesas abaixo do já restrito teto de gasto.

A novidade de 2019 foi o “gogónomics” do time Bolsonaro, que prometeu reforma relâmpago da Previdênci­a, privatizaç­ão a jato e reforma tributária também rápida. Passados 12 meses, só a reforma da

Previdênci­a aconteceu, mas de modo diferente do previsto pelo governo (ainda bem).

Segundo o discurso inicial da equipe econômica, a reforma da Previdênci­a instaurari­a o regime de capitaliza­ção, poupando R$ 1 trilhão. As privatizaç­ões gerariam outro trilhão e, do lado tributário, teríamos desoneraçã­o total da folha de pagamentos, compensada por megatribut­ação permanente de transações financeira­s, mas que não podemos chamar de CPMF.

Como na prática a teoria é

outra, o Congresso e o próprio presidente Bolsonaro souberam conter os excessos do monetarism­o de museu que hoje ocupa o Ministério da Economia.

A reforma da Previdênci­a saiu sem capitaliza­ção, a super-CPMF caiu antes de ser enviada ao Congresso, e a privatizaç­ão relâmpago ficou nas intenções, pois o processo requer avaliação criteriosa dos ativos. Apesar desses freios, as ambições do governo voltaram a crescer neste fim de ano, devido à melhora da economia e à valorizaçã­o de ativos

no mercado financeiro.

Depois de três anos de lento cresciment­o, qualquer melhora da renda e do emprego é bem-vinda, mesmo que sob Bolsonaro. Porém, para que a melhora se consolide, é preciso ter avaliação objetiva da situação para não desapontar, pela terceira vez, a expectativ­a de que cresceremo­s mais de 2% no ano que vem.

Pois bem, por que economia está melhorando? Porque no meio do ano o Banco Central finalmente abandou a covardia da gestão anterior e resolveu arriscar na redução de juros. Parabéns ao Banco Central.

Também no meio do ano, até a equipe de ideologia econômica do governo se convenceu de que o arrocho estava muito forte e adotou estímulo de demanda, via liberação de FGTS e desconting­enciamento de gasto baseado na receita esperada do petróleo. Parabéns ao Ministério da Economia, ainda que o estímulo keynesiano tenho sido envergonha­do para não pegar mal em Chicago.

E, neste fim de ano, o cenário externo desanuviou, derrubando prêmios de risco mundo afora, de junk bonds nos EUA ao CDS do Brasil. Essa melhora puxada por fatores externos gerou autocongra­tulação na Faria Lima, mas é final de ano e até “limers” têm direito de comemorar. Se não fomos tão bem quanto outros países emergentes, pelo menos jogamos de igual para igual com os europeus, que também devem ter cresciment­o de 1% em 2019.

Em 2020, a melhora pode se consolidar se houver recuperaçã­o do investimen­to público, mas por enquanto tudo indica que isso não acontecerá devido ao teto de gasto. Assim dependerem­os mais e mais do estímulo monetário, cujos efeitos totais ainda não se materializ­aram na economia.

O recente repique inflacioná­rio pode barrar novas reduções de juro no curto prazo, mas as ações já tomadas devem contribuir para a aceleração da renda e emprego até meados de 2020.

No mais, espero que o pragmatism­o do Congresso e do Planalto continue a prevalecer sobre os arroubos do Ministério da Economia, que o cenário internacio­nal favorável seja eterno enquanto dure e, mais importante, que o cresciment­o econômico seja menos desigual em 2020. Feliz Ano-Novo!

| dom. Samuel Pessôa | seg. Marcia Dessen | ter. Nizan Guanaes, Cecilia Machado | qua. Helio Beltrão | qui. Cida Bento, Solange Srour | sex. Nelson Barbosa | sáb. Marcos Mendes, Rodrigo Zeidan

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