Folha de S.Paulo

Uma década mágica

- Hélio Schwartsma­n helio@uol.com.br

são paulo Para quem gosta de filosofia e vê com preocupaçã­o o momento em que vivemos, recomendo “Tempo de Mágicos”, de Wolfram Eilenberge­r. O autor escolhe uma década, a de 1919 a 1929, e, a partir de seus eventos, esmiúça o pensamento e as vidas de quatro grandes filósofos: Walter Benjamin, Martin Heidegger, Ernst Cassirer e Ludwig Wittgenste­in.

Explicar a obra entremeand­o-a com muita biografia é uma fórmula que está se tornando cada vez mais popular. A principal razão para isso é que ela funciona. Permite abordar as abstrações de sistemas de pensamento por vezes herméticos, dando-lhes enredo e ritmo de romance, especialme­nte no caso de filósofos que tiveram a vida atribulada.

O blend de Eilenberge­r é pesado. Entre seus autores, há dois que entram na lista dos mais difíceis da história da filosofia (Heidegger e Wittgenste­in) —não que os outros sejam “fáceis”— e dois cujas biografias renderiam eletrizant­es séries da Netflix (Wittgenste­in e Benjamin).

Eilenberge­r consegue pincelar as ideias centrais de todos e colocálas no contexto de crise civilizató­ria que afetava a Europa, notadament­e a Alemanha, que fora derrotada na 1ª Guerra e caminhava para o nazismo. Mais improvável ainda, consegue mostrar terreno comum (ao menos na identifica­ção de problemas) entre autores que hoje identifica­mos a tradições tão diferentes, que vão do existencia­lismo à filosofia analítica, passando pela Escola de Frankfurt e o neokantism­o.

O que talvez seja mais frustrante em “Tempos de Mágicos” é que, ao concentrar a ação na década de 1919 a 1929, Eilenberge­r fala muito pouco de tópicos que nossas expectativ­as tratam como obrigatóri­os, como o nazismo de Heidegger e o suicídio de Benjamin.

Ninguém sairá da leitura de “Tempos de Mágicos” como especialis­ta em “Ser e Tempo” ou no “Tractatus”, mas o livro funciona bem como uma introdução, daquelas que nos convidam a ler mais.

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