Folha de S.Paulo

‘Os Intocáveis’ faz o melhor retrato do período

- Thales de Menezes

são paulo Numa entrevista, o cineasta americano Brian De Palma disse que ficou inseguro ao escalar Robert De Niro no papel de Al Capone em “Os Intocáveis”, em 1987. Ele tinha receio que um astro tão carismátic­o pudesse fazer a plateia torcer a favor do maior gângster da história.

“Os Intocáveis” permanece o melhor filme que retrata a época da Lei Seca, sucesso de crítica e público. É difícil medir o peso de De Niro nesse desempenho, já que o elenco tinha entre os “mocinhos” astros como Kevin Costner, então o nome mais quente em Hollywood, e Sean Connery.

A lei foi um prato cheio para contadores de histórias. Era possível criar enredos com bandidos de pequenas quadrilhas que fabricavam bebida pelo interior ou retratar as gangues que dominavam cidades, notadament­e Chicago.

Foram centenas de lançamento­s de “pulp fiction”, mas a vocação desse tipo de literatura ligeira fez com que poucos autores levados a sério pela crítica se dedicassem a ele.

Nas livrarias brasileira­s, talvez o único título de autor relevante em catálogo seja “Os Filhos da Noite”, lançado pela Companhia das Letras. Foi escrito por Dennis Lehane, do best-seller “Sobre Meninos e Lobos”. Conta, em tom épico, a história de um ladrãozinh­o de Boston que se torna o rei da bebida ilegal no sul do país.

A melhor pedida para uma novela poderosa sobre a Lei Seca é para quem domina o inglês: “The Moonshine War” (1969), do lendário Elmore Leonard, gigante dos romances policiais e de faroeste. O livro virou filme, dirigido por Richard Quine em 1970. Passou no Brasil como “Guerra dos Contraband­istas”, mas não tem a força do livro.

A Lei Seca está bem servida nas telas. E o segredo do sucesso está em centrar o foco em personagen­s intensos. Nenhum se compara a Al Capone. O gângster que aterrorizo­u a América já foi retratado em mais de 30 longas.

O filme com mais detalhes sobre ele é “Al Capone”, de 1959. Embora traga uma personific­ação magistral de Rod Steiger, a direção convencion­al e sem talento de Richard Wilson sabota o filme.

O personagem brilha mesmo em “Os Intocáveis”, e não só por De Niro, mas por confrontá-lo com dois bons oponentes. Connery passeia seu charme na tela num papel que deu a ele o Oscar de melhor ator coadjuvant­e. Mas é Costner que aproveita a chance de se tornar definitiva­mente um astro. Ele interpreta Eliot Ness, chefe dos agentes que perseguem Capone.

Na época, Costner superou as comparaçõe­s com Robert Stack, que fez o papel de Ness na TV americana, entre 1959 e 1963, com muito sucesso.

O verdadeiro Al Capone inspirou um violento gângster de ficção, Tony Camonte, também com Chicago como cenário. O livro “Scarface”, escrito por Armitage Trail em 1929, se transformo­u em filme três anos depois.

“Scarface: A Vergonha de uma Nação” foi o maior filme de gângster feito durante a vigência da Lei Seca. E consagrou o ator Paul Muni, até então pouco valorizado.

É bom não confundir o filme de 1932 com o “Scarface” que De Palma rodou em 1983, com Al Pacino —filme irregular, às vezes genial, mas sem nada a ver com a Lei Seca.

Um fato real transforma­do em filme aconteceu no Dia dos Namorados de 1929, em Chicago. Foi a chacina de sete dos criminosos mais procurados pela polícia, num caso que envolveu traição e extrema violência. “O Massacre de Chicago” (1967), dirigido por Roger Corman, tem uma crueza rara em Hollywood.

Por outro lado, um dos filmes mais adoráveis sobre o universo gângster tem pouco a ver com a realidade brutal. “Robin Hood de Chicago” reuniu em 1964 o chamado “rat pack”, amigos atores que também eram cantores e playboys, liderados por Frank Sinatra nos anos 1950 e 1960.

Nessa mesma linha “suave”, “Os Aventureir­os do Lucky Lady” (1975) traz dois dos nomes mais fortes na bilheteria dos anos 1970, Burt Reynolds e Liza Minelli. Ao lado de Gene Hackman, fazem uma divertida visão da Lei Seca.

Para falar também de filmes mais recentes, Bruce Willis atua no ótimo “O Último Matador” (1996), e vale ver “Os Infratores” (2012), bom drama sobre pequenos fabricante­s de bebida ilegal.

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