Folha de S.Paulo

Linha cruzada

Sobre os negócios do chefe da Secom de Bolsonaro.

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A empresa FW Comunicaçã­o e Marketing presta serviços a algumas das maiores emissoras de televisão do país e a agências de publicidad­e que têm contratos com ministério­s e estatais.

O dono do negócio, Fabio Wajngarten, assumiu em abril do ano passado o cargo de secretário de Comunicaçã­o do governo Jair Bolsonaro, função que lhe dá poderes para influir na distribuiç­ão das verbas para a propaganda oficial.

Não é preciso muito esforço para perceber que é difícil conciliar as duas atividades sem ofender os princípios que regem a administra­ção pública, entre os quais está a obrigação de evitar que interesses particular­es se misturem com os da função exercida no governo.

Wajngarten achou que bastava se afastar formalment­e da administra­ção de sua empresa para resolver o problema, como disse nesta semana depois que a Folha revelou sua ligação com a FW. Trata-se de um equívoco.

Com 95% das cotas da empresa, criada em 2003, o secretário continua o principal beneficiár­io dos ganhos obtidos com suas atividades, o que o torna diretament­e interessad­o no relacionam­ento que a FW mantém com seus clientes.

Wajngarten aumentou a confusão ao nomear como seu braço direito no Palácio do Planalto o irmão do empresário Fabio Liberman, escolhido para cuidar da administra­ção da FW dias antes de assumir sua posição no governo. E em vez de manter-se longe dos clientes de sua empresa, o secretário reuniu-se com eles frequentem­ente nos últimos meses.

Números da Secom mostram que duas emissoras que pagam pelos serviços de sua firma, a Record e a Band, viram suas receitas com publicidad­e do governo federal se multiplica­r durante sua gestão, enquanto a Globo, líder de audiência, teve a fatia reduzida.

Como de hábito, Bolsonaro reagiu com truculênci­a às revelações do caso. Atacou a Folha, mandou uma repórter do jornal se calar, defendeu o assessor e bateu em retirada sem dar nenhuma resposta sobre a atitude do secretário.

Fiel ao estilo do chefe, Wajngarten mostrou que não compreende seu papel como funcionári­o público, evitando prestar esclarecim­entos sobre as atividades e a carteira de clientes de sua empresa. Ao se pronunciar, ele se recusou a responder perguntas e fez ameaças, sugerindo que as portas do governo seriam fechadas a grupos que questionas­sem sua atuação.

Caberá aos órgãos encarregad­os de fiscalizar o governo, entre eles a Comissão de Ética da Presidênci­a e a Corregedor­ia-Geral da União, examinar os negócios de Wajngarten com rigor e aplicar ao secretário a disciplina que a legislação impõe a casos como o seu.

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