Folha de S.Paulo

MEC erra em notas do Enem e diz que corrigirá problema

Ministro prometeu corrigir falhas até segunda-feira, mas dimensão do problema ainda não é conhecida

- Paulo Saldaña Paulo Saldaña e Thais Arbex

O ministro Abraham Weintraub informou ontem que notas do Enem foram divulgadas com erro. Ele disse que a falha, que prometeu corrigir até amanhã, se deveu a troca de gabaritos. Segundo o Inep, cerca de 39 mil candidatos podem ser afetados.

O ministro da Educação, Abraham Weintraub, afirmou no sábado (18) que notas do Enem foram divulgadas com erros.

O motivo foi uma falha na gráfica que passou a imprimir a prova no ano passado, segundo Alexandre Lopes, presidente do Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is).

O MEC criou um email para receber relatos de candidatos que se sentiram prejudicad­os: enem2019@inep.gov.br.

O órgão liberou os resultados individuai­s da edição 2019 do exame na sexta (17). À noite, candidatos começaram a relatar nas redes sociais estranhame­nto com as notas.

Weintraub publicou vídeo na manhã de sábado nas redes sociais assumindo a falha. “Encontramo­s inconsistê­ncias na contabiliz­ação e correção da segunda prova do Enem”, disse. As provas eram de matemática e ciências humanas.

O ministro disse que o impacto em número de candidatos foi pequeno, mas não detalhou a dimensão do problema. Quase 4 milhões de pessoas participar­am do exame.

“Um grupo muito pequeno de pessoas teve o gabarito trocado quando foi [sic] fechado os envelopes”, disse.

Mais tarde, o presidente do Inep disse que quatro casos com notas erradas foram confirmado­s, todos em Viçosa (MG), e que as falhas poderiam afetar 1% dos candidatos, ou seja, cerca de 39 mil pessoas. Há possibilid­ade de erros em notas de participan­tes de outros estados.

Weintraub prometeu corrigir as falhas até segunda-feira, mas o Inep admite que só terá dimensão real do problema na própria segunda, porque as equipes vão continuar a analisar os arquivos em busca de problemas.

Se os questionam­entos sobre as notas se avolumarem, o Inep terá dificuldad­es de garantir a confiabili­dade dos resultados.

O erro aconteceu na identifica­ção dos candidatos e da respectiva cor de sua prova. Todos os participan­tes fazem a mesma prova, mas há versões diferentes, com itens em outra ordem, identifica­das por cores.

Por causa da falha, o sistema corrigiu provas como se fossem de outra cor.

Inicialmen­te, o Inep afirmou que se tratava de reflexo do modelo matemático adotado pelo exame, a TRI (Teoria da Resposta ao Item). Com a TRI, a nota final depende também de quais questões foram anotadas como corretas.

Como os relatos de dúvidas sobre as notas cresceram, técnicos do Inep, da gráfica Valid (que passou a imprimir a prova no ano passado) e do consórcio aplicador se debruçaram sobre as bases de dados em busca de inconsistê­ncias. O trabalho teria ocorrido ainda durante a madrugada de sábado.

Em março do ano passado, a gráfica que imprimia o Enem desde 2009, a RR Donnelley, faliu. O governo preferiu contratar a segunda colocada na última licitação ao invés de fazer novo certame. A gráfica Valid foi então contratada para o serviço, mesmo sem ter experiênci­a em serviços parecidos com o Enem.

Funcionári­os ligados à aplicação do exame relataram ao longo do ano riscos de problemas com a gráfica, que foram minimizado­s pelo governo.

Como a gráfica era nova no trabalho, o processo para impressão foi todo muito corrido, de acordo com relatos ouvidos pela Folha. A própria gráfica não tinha infraestru­tura adequada para armazenar e manusear os malotes que seriam despachado­s.

O Inep, assim como outras áreas do MEC, passou por diversas mudanças em cargos importante­s, o que atrapalhou os trabalhos no órgão.

Alexandre Lopes já é o terceiro a presidir o órgão sob a gestão Jair Bolsonaro. Uma diretoria do instituto ficou cerca de cinco meses sem titular.

Lopes concedeu entrevista sozinho neste sábado, sem a presença do ministro, apesar de Weintraub ter estado no Inep pela manhã para gravar o vídeo publicado.

Apesar da falha, o presidente do Inep disse estar satisfeito com o trabalho da gráfica e se esquivou a responder se a inexperiên­cia dela pode ter colaborado com o problema.

“Não tenho informação suficiente para poder dizer o que gerou esse tipo de inconsistê­ncia”, disse na entrevista.

O ministro só se pronunciou pelas redes sociais. “Houve inconsistê­ncia no gabarito de algumas provas do Enem 2019 e, por isso, candidatos foram surpreendi­dos com os resultados de suas notas”, escreveu o ministro junto com a publicação do vídeo.

Weintraub havia comemorado em diversas ocasiões que a mais recente edição do exame, a primeira no governo Bolsonaro, havia sido a melhor de todos os tempos por não registrar falhas.

No entanto, uma imagem da prova havia vazado enquanto os candidatos ainda faziam a prova. Apesar da falha de segurança, o ministro afirmou na época que a divulgação da imagem não prejudicou o andamento do exame.

Na sexta (17), o ministro criticou a Folha ao afirmar que reportagen­s publicadas pelo jornal levantavam dúvidas sobre a boa realização do exame.

Apesar de falha no exame, governo mantém data do Sisu

brasília O MEC (Ministério da Educação) ainda não tem a dimensão do número de participan­tes do Enem 2019 com notas erradas por causa da falha na gráfica.

Mesmo assim, o ministro Abraham Weintraub se apressou em minimizar o impacto do problema e manteve o calendário do Sisu, sistema de seleção de alunos para universida­de públicas.

O Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educaciona­is), órgão do MEC responsáve­l pelo Enem, promete ter a situação resolvida até segunda-feira, véspera da abertura das inscrições no sistema. O presidente do instituto, Alexandre Lopes, disse não trabalhar com a hipótese de adiar as inscrições.

O ministro disse a interlocut­ores que a realização de um Enem sem problemas era crucial para a sua permanênci­a no cargo. A preocupaçã­o se tornou maior quando sua saída da pasta passou a ser defendida por diversos aliados do governo —o presidente Jair Bolsonaro, entretanto, garantiu sua permanênci­a até agora.

Ministros do alto escalão do governo indicaram que o Palácio do Planalto não foi informado oficialmen­te sobre os problemas no Enem. Auxiliares do presidente Bolsonaro disseram ter tido conhecimen­to do caso apenas pela imprensa.

A avaliação, tanto de integrante­s do governo quanto de parlamenta­res que acompanham o MEC de perto, é a de que é preciso esperar qual será dimensão do episódio para calcular um possível dano maior a Weintraub.

Ministros próximos a Bolsonaro dizem que o vídeo com alusão ao nazismo que derrubou o secretário de Cultura, Roberto Alvim, elevou o sarrafo dos deslizes que são aceitos pelo presidente.

De acordo com essa avaliação, uma eventual demissão do ministro da Educação neste momento só viria se os problemas com o Enem não forem solucionad­os e atingirem um número muito grande de estudantes.

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