Folha de S.Paulo

Luz do Sol

- Marcos Lisboa Presidente do Insper, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda (2003-2005). Escreve aos domingos

Em 1945, Friedrich A. Hayek publicou um artigo histórico sobre o uso da informação na sociedade. Planejar uma economia seria apenas um desafio computacio­nal caso fossem conhecidos todos os processos produtivos disponívei­s assim como as preferênci­as de consumo de cada indivíduo.

O problema é que o conhecimen­to típico de um Deus onisciente não está acessível à burocracia. Os dados sobre as condições de produção e as necessidad­es de cada um estão dispersos nas firmas, nos comerciant­es locais e nas famílias.

Em uma economia de mercado, porém, essa informação é sintetizad­a em um mecanismo simples e acessível: os preços das mercadoria­s.

A escassez relativa dos bens influencia os preços e a rentabilid­ade das empresas, que reagem ajustando suas decisões de produção. A concorrênc­ia estimula os ganhos de produtivid­ade, pois as firmas mais eficientes abocanham maiores lucros.

Nem tudo são flores. Existem setores em que a tecnologia impede a livre concorrênc­ia ou produz danos ao meio ambiente não captados pelos preços.

A intervençã­o do governo, contudo, exige cuidado e ciência, pois para cada doença existe um remédio específico, além do risco de que a falha de mercado seja substituíd­a pelos erros da burocracia, como ocorreu na gestão Dilma.

O uso eficiente da informação, no entanto, requer que os preços reflitam os custos sociais de produção. Por essa razão, a maioria dos países opta por uma tributação que onera igualmente quase todas as decisões de consumo.

Por aqui, porém, temos um sistema tributário caótico, com regras caso a caso, em que projetos eficientes são deixados de lado porque existe uma alternativ­a menos onerada pelo fisco.

Para piorar, o cálculo privado sobre o que produzir é baseado em preços descolados dos custos de produção em razão da tributação desigual embutida nos diversos bens. O resultado é uma economia que desperdiça seus recursos.

O mesmo efeito negativo sobre os preços ocorre com os muitos subsídios cruzados, como cobrar mais de Maria para subsidiar a conta de luz de João.

A concessão de benefícios para grupos de interesse por meio de isenções tributária­s ou subsídios cruzados tira proveito da sua falta de transparên­cia para o restante da sociedade, que apenas percebe que está pagando caro pelo que consome ou que o país cresce pouco.

A agenda de cresciment­o passa por reduzir progressiv­amente os subsídios cruzados e as isenções tributária­s. Auxílio do governo só deveria ser concedido por meio de recursos contemplad­os no Orçamento aprovado pelo Congresso. Isso garantiria transparên­cia aos benefícios, além de não distorcer os preços de mercado.

A luz do Sol é o melhor desinfetan­te.

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