A equação dos estaduais
Não se acredita na viabilidade desses torneios sem os clubes grandes
Dos últimos 8 campeões brasileiros, 4 ganharam o estadual no primeiro semestre. Indício de que o mantra “estadual não é parâmetro”, repetido exaustivamente na era dos pontos corridos, não se sustenta.
Isso não quer dizer que os primeiros três meses da temporada tenham alta competitividade.
Mas Fluminense (2012), Cruzeiro (2014), Corinthians (2017) e Flamengo (2019) indicam ser possível ter pistas, nas competições regionais, de quem vai se dar bem em nível nacional e internacional.
Dois dos três últimos times brasileiros campeões da Libertadores venceram o estadual antes, em abril.
O sábado (18) marcou o início da participação dos grandes no Estadual do Rio, com Macaé contra Flamengo; e Volta Redonda contra Botafogo. Neste domingo (19), o Vasco recebe o Bangu, e o Fluminense enfrenta a Cabofriense. Na quarta (22), o Palmeiras visita o Ituano, e o São Paulo recebe o Água Santa, pelo Paulista.
Por mais que tenha se tornado consensual a perda de relevância dos estaduais, é um equívoco dizer que o troféu não tem importância. Ganhar sempre é bom. A análise mais fria e necessária é sobre o impacto técnico e financeiro desses três meses. Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo recebem R$ 25 milhões pelo contrato de TV. No Rio, a conta é de R$ 18 milhões, mas o Flamengo exige R$ 100 milhões por um novo acordo.
O contraponto é perder qualidade das partidas. Questionado se seu estadual é mais ou menos competitivo do que há dez anos, o presidente da Federação do Rio, Rubens Lopes, admitiu: “É menos”.
Perguntado sobre a razão da queda, afirma ter acontecido uma acomodação. “Dos clubes, não das federações”, argumenta.
Há dois anos, o Estadual do Rio terminou com o recorde de público numa partida do primeiro semestre, quinta maior bilheteria do ano, a final Botafogo e Vasco (58 mil pagantes). Aquele campeonato ficou mais marcado por um gandula de Madureira e Fluminense buscando a bola no meio de um matagal, com uma lanterna, no estádio de Xerém, diante de 446 torcedores. Parecia várzea, não profissionalismo.
Em 2019, o jogo com mais espectadores dos estaduais foi a primeira final do Paulista, São Paulo 0 a 0 Corinthians. Houve 19 partidas com mais público no ano. O Paulista tem hoje 33% mais torcedores nos estádios do que tinha em 2016, e no Estadual do Rio subiu 50% de 2018 para 2019.
O futebol sempre tem um especialista defendendo seu ponto de vista, em vez de tentar radiografar o problema. Há 20 anos, a discussão sobre os primeiros três meses baseia-se no insano debate “eu gosto” x “eu não gosto”.
Há questões muito mais graves. Número de empregos gerados, quantidade de dinheiro envolvido, perdas e ganhos do ponto de vista técnico. Quando se chega à final do Mundial, é notável que o Flamengo tenha 19 partidas a mais do que o Liverpool no ano e que 17 delas sejam do estadual.
O desafio é expandir os estaduais para os pequenos terem mais jogos e seus jogadores terem emprego o ano todo. Por outro lado, diminuir a obrigação de os grandes enfrentarem os nanicos. A equação é tão simples quanto inviável, porque a política mantém benefícios de federações e não se acredita na viabilidade dos torneios sem os grandes para alavancar os contratos de TV.
Os estaduais tiveram seu pontapé inicial em 3 de maio de 1902, e a televisão só foi inaugurada em 18 de setembro de 1950. O futebol brasileiro não vai quebrar se a televisão falir, por um simples motivo: o futebol já quebrou. Foi por falta de trabalho, não de dinheiro.