Peça de Dal Farra é espelho para setores progressistas da sociedade
Uma família escondida numa espécie de abrigo tentando sobreviver a um mundo que se desfaz. O espetáculo “Floresta”,
com dramaturgia e direção de Alexandre Dal Farra, começa com essa situação, que não deixa de ser uma metáfora sobre nós e nossa atualidade.
Mas, ao longo da peça, mãe, pai e filha percebem, de forma catastrófica, que não há refúgio possível. Primeiro porque seu estranho santuário é invadido. Segundo porque descobrem que eles próprios não são tão diferentes assim do que querem se afastar.
Cultivam também a violência, o medo doentio, a incapacidade de se comunicar com o outro. “Floresta” funciona como um tipo de autoexame e de espelho para os setores esclarecidos, intelectualizados e progressistas da sociedade —que esses artistas acreditam ser o seu público .
Assim como em “Refúgio”, última peça de Dal Farra, ele cria uma imagem cênica provocativa e espantosa que evoca a paralisia e a dificuldade de agir. Em paralelo, o texto é uma enxurrada. As palavras ocupam todos os espaços deixados pela cena, se infiltram em cada silêncio. Um elenco vigoroso busca sustentar o jogo de cena. Mas são derrotados pelo excesso literário e por uma sintaxe que gira em falso.
Tambémcompõemoespetáculo
algumas breves inserções em vídeo. Elas se contrapõem ao diagnóstico pesado e sombrio da peça. São fragmentos de entrevistas feitas pelo diretor,querecusamolodoexistencial e apresentam uma problematização daquilo tudo. Como quando Ailton Krenak, importante liderança indígena, questiona a ideia de inimigo.
Apesar disso, as entrevistas são quase uma nota de rodapé estranha ao conjunto da obra. Elas não abalam a sua construção formal. As considerações e as perspectivas que tentam abrir desaparecem no meio da atmosfera asfixiante e da massa melancólica que se impõem. O saldo é apocalíptico.
E embora pareça querer superar o impasse apresentado, há uma estranha atração na obra pelo lirismo da crise que brota daquela floresta.