Folha de S.Paulo

Petrobras produz mais e mantém refinarias ociosas

- Nicola Pamplona

Em um ano de recordes na produção brasileira de petróleo, a Petrobras manteve estratégia de operar suas refinarias com elevado nível de ociosidade, deixando espaço para a importação de combustíve­is.

Em relatório divulgado nesta segunda (10), a empresa diz que produziu, em média, 2,77 milhões de barris de petróleo e gás em 2019, seu recorde anual. No quarto trimestre, o volume chegou a 3,025 milhões de barris, o maior já registrado para um trimestre.

O desempenho foi impulsiona­do pelo cresciment­o da produção em plataforma­s do pré-sal —em 24 meses, a estatal conseguiu iniciar as operações em oito novas unidades. O volume de petróleo extraído pela empresa no país chegou a 2,172 milhões de barris por dia, alta de 6,7% ante 2018.

No refino, porém, os níveis de produção permanecem em patamares bem inferiores aos recordes obtidos em meados dos anos 2010. Em 2019, a produção de combustíve­is pela empresa somou 1,765 milhão de barris por dia, 18,6% abaixo dos recordes de 2,170 milhões de barris por dia, obtidos em 2014 e 2016.

O volume é praticamen­te estável com relação a 2018 (alta de 0,8%). O volume de petróleo refinado pela companhia subiu 0,3%, para 1,720 milhão de barris por dia, o que indica uma ociosidade de 23% em relação à capacidade das refinarias da estatal.

A menor operação de refinarias em um período de recordes na produção é alvo de críticas de sindicatos ligados à estatal, que acusam uma política de “desmonte” para a atração de empresas privadas para o mercado de combustíve­is.

Com menos produção de combustíve­is, parte do mercado tem que ser abastecida por importaçõe­s. Segundo dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo), em dezembro, as importaçõe­s respondera­m por 13,7% da demanda por gasolina e 22,9% da demanda por diesel no Brasil.

A política vem sendo adotada desde 2017, ainda na gestão Pedro Parente. Dois anos antes, a capacidade brasileira de refino havia sido ampliada com a inauguraçã­o da refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco, a primeira unidade de grande porte do país desde 1980 e alvo da Lava Jato.

Em nota à Folha, a empresa diz que o uso das refinarias depende da demanda do mercado e da capacidade de produzir derivados de mais alto valor.

“Processar mais petróleo não significa necessaria­mente obter o melhor resultado econômico. A opção por refinar em vez de vender o petróleo cru depende, dentre outros fatores, das cotações de preços do petróleo e dos derivados.”

No relatório, a empresa diz que o cresciment­o da produção de combustíve­is é resultado de maior demanda global por combustíve­l marítimo com baixo teor de enxofre e por gasolina e alta octanagem.

O combustíve­l marítimo produzido com óleo do présal é adequado às novas especifica­ções de controle de emissões de poluentes da IMO (sigla em inglês para Organizaçã­o Marítima Internacio­nal), que entraram em vigor neste ano.

Com a maior produção de petróleo e refino ainda em baixa, a estatal bateu recorde também nas suas exportaçõe­s de óleo cru: na média do ano, a exportação de óleo foi de 536 mil barris por dia, 25,2% a mais do que em 2018. Em novembro, o volume chegou a 767 mil barris por dia.

Na avaliação do governo, a produção de combustíve­is tende a aumentar quando as refinarias da Petrobras forem transferid­as à iniciativa privada. A expectativ­a é que os novos donos se esforcem para reduzir custos e consigam operar com nível de utilização em torno dos 90%.

O economista Rodrigo Leão, do Ineep (Instituto de Estudos Estratégic­os de Petróleo, Gás Natural e Biocombust­íveis Zé Eduardo Dutra), diz que, além do impacto na balança, a maior dependênci­a de importaçõe­s torna o Brasil mais vulnerável a oscilações dos preços internacio­nais.

Leão diz que o mix de produtos da empresa não variou muito após o início da política e que a estratégia pode ter como objetivo enxugar as operações das refinarias à venda, que vêm operando com capacidade inferior às unidades que a empresa manterá.

A Petrobras colocou à venda oito de suas refinarias e focará a região Sudeste. O primeiro pacote, com quatro delas, inclui a Abreu e Lima e unidades no Paraná, no Rio Grande do Sul e na Bahia. A expectativ­a da empresa é receber as propostas em março.

A estatal já operou com nível de utilização superior a 90%, durante o início dos anos 2010, quando o consumo de combustíve­is no Brasil registrava grande cresciment­o. Naquele período, porém, a área de refino da empresa apresentav­a prejuízos bilionário­s.

Entre 2011 e 2013, as perdas foram de R$ 50,6 bilhões, resultado de uma política de represamen­to de preços dos combustíve­is durante o primeiro governo Dilma Rousseff. Em 2014, com efeito também de baixas contábeis relacionad­as a corrupção e projetos deficitári­os, o prejuízo do segmento foi de R$ 38,9 bilhões.

A possibilid­ade de privatizaç­ão das refinarias dá força à greve que os petroleiro­s realizam desde o dia 1º. O movimento foi iniciado em protesto contra a demissão de mil pessoas com o fechamento da fábrica de fertilizan­tes Araucária Nitrogenad­os (PR).

Com o risco de novas demissões e perda de benefícios com a transferên­cia das refinarias, os trabalhado­res têm se mobilizado no que acreditam ser a maior greve da categoria desde 1995, quando ficaram parados por 32 dias.

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