Folha de S.Paulo

No Paraná, deputado receberá diária até em cidade onde mora

Nova regra da Assembleia também permite o reembolso sem prova de gastos

- Katna Baran

curitiba Deputados estaduais do Paraná poderão receber diárias de R$ 380 para se hospedarem na cidade em que possuem residência fixa. Ato da Assembleia Legislativ­a permite que eles acumulem 12 reembolsos por mês, totalizand­o um acréscimo de até R$ 4.560 no salário.

As mudanças nas regras de ressarcime­nto do Legislativ­o do estado começaram no fim de 2019. Uma resolução de novembro inovou ao prever diárias para viagens dentro do Paraná. Também instituiu valores fixos, sem necessidad­e de comprovaçã­o de gastos, que antes eram obrigatóri­os.

Ato da comissão executiva da Casa, publicado em 10 de janeiro, regulament­ou as medidas, instituind­o o reembolso para viagens para a cidade onde o parlamenta­r tem casa.

O valor de ressarcime­nto, nesse caso, equivale a meia diária e também vale para deslocamen­tos com distância inferior a 50 km de Curitiba, contabiliz­ados os trechos de ida e volta, e quando não houver pernoite fora da capital.

A nova regulament­ação estabelece reembolsos até maiores, com teto de R$ 844 para viagens do deputado para outras capitais. Com 12 viagens dessas, pode-se acumular até R$ 10.128 mensais. O menor valor, de R$ 211 por dia, vale em percursos na região metropolit­ana de Curitiba.

A regra também vale para assessores parlamenta­res, com valores mais baixos. Nas viagens para municípios em que têm residência fixa, a diária é de R$ 190. Pode haver também 12 requisiçõe­s mensais, que somariam R$ 2.280.

As diárias podem ser solicitada­s quando há visitas para qualquer cidade fora de Curitiba, sede da Assembleia. O solicitant­e deve justificar a viagem, restrita para assuntos de interesse municipal, estadual ou nacional. Isso inclui festividad­es e eventos municipais ou contato com lideranças políticas, entre outros.

O deputado estadual Homero Marchese (PROS) diz que o ressarcime­nto por deslocamen­to à cidade de origem é acréscimo de salário.

“Pelo simples fato de morar em sua cidade, fora de Curitiba, o deputado ou assessor poderá, na prática, complement­ar os vencimento­s com uma verba sobre a qual não há nem descontos”, disse Marchese, que vai entrar na Justiça contra as mudanças.

O salário bruto dos deputados estaduais é de R$ 25.322,25. O teto de gastos com ressarcime­nto permaneceu em R$ 31.679,80 mensais.

Marchese critica o recebiment­o do dinheiro sem comprovaçã­o exata dos gastos. A opção pela diária dispensa a apresentaç­ão de notas fiscais.

A modalidade antiga também foi mantida: caso prefira ver as despesas ressarcida­s no seu exato valor, o deputado apresentar­á os comprovant­es para reembolso. Mas fontes da Casa dizem que a ideia é desestimul­ar esse modelo.

Segundo Marchese, quem optar pela diária fixa não terá os gastos discrimina­dos publicados no site da Assembleia.

Como há funcionári­os da Casa que não trabalham em Curitiba, mas atuam no reduto eleitoral do parlamenta­r, segundo Sir Carvalho, da ONG Vigilantes da Gestão Pública, há brecha para desvios.

“Foi um remendo ruim numa peça velha. A sociedade esperava que os deputados tivessem o bom senso de acabar com isso [diária na cidade de origem]. Acabaram regulament­ando o que consideram­os ilegal”, disse Carvalho.

Já para o deputado Luiz Claudio Romanelli (PSB), primeiro-secretário da Casa, os gastos devem até diminuir. Ele calcula que o parlamenta­r terá de tirar do bolso se gastar além do teto da diária, diferentem­ente do que ocorria com o ressarcime­nto.

“Isso obviamente funciona assim em qualquer lugar, como no Judiciário e no Ministério Público. O parlamenta­r não vai pagar do próprio salário o deslocamen­to, que inclui não só hospedagem, mas alimentaçã­o e transporte”, afirmou. Ele destaca que o teto de ressarcime­nto não mudou.

As novas regras surgiram de recomendaç­ão do Ministério Público estadual a partir de denúncias da Vigilantes da Gestão Pública, que apontou falta de transparên­cia e altos gastos com ressarcime­nto no Legislativ­o. A Promotoria ainda avalia as novas regras.

Um dos casos denunciado­s pela ONG envolveu o então deputado estadual Felipe Francischi­ni (PSL), hoje federal e presidente da Comissão de Constituiç­ão e Justiça da Câmara. Na Assembleia, entre 2015 e 2018, ele reembolsou R$ 119.092,79 em despesas com alimentaçã­o.

A defesa de Francischi­ni destaca que a decisão judicial mais recente, de setembro de 2019, apontou como lícito o uso da verba. A ONG está recorrendo da decisão.

Em nota, a Assembleia afirma que o objetivo da nova metodologi­a é justamente cortar os custos administra­tivos de prestação por notas fiscais.

“Foi feito um remendo ruim numa peça velha. O que a sociedade esperava é que os deputados tivessem o bom senso de acabar com isso [diária na cidade de origem]. Acabaram regulament­ando o que consideram­os ilegal Sir Carvalho da ONG Vigilantes da Gestão Pública

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