Casos de coronavírus sobem após China mudar metodologia
Na província de Hubei, foco da epidemia, exame clínico substitui teste laboratorial; país registra recorde de casos em um dia
pequim | afp O número de mortos e de pessoas infectadas com o coronavírus covid-19 aumentou drasticamente nas últimas 24 horas na China depois que as autoridades chinesas expandiram os critérios de contaminação na província de Hubei, epicentro da epidemia.
O governo anunciou 14.840 novos casos de contágio, o que elevou o total para mais de 60 mil pessoas. Esse é o maior avanço diário em número de casos até agora.
Autoridades também registraram 242 novas vítimas em Hubei, elevando para ao menos 1.370 o número de mortos.
A partir de agora, o balanço em Hubei incluirá os pacientes cujos exames de imagem do pulmão apresentem sinais de pneumonia, sem a necessidade do exame laboratorial. O teste era até então indispensável para o diagnóstico.
Esse atalho ajudará a propiciar o tratamento necessário a muitos pacientes, disseram as autoridades da província. Adicionar as pessoas diagnosticadas dessa maneira à contagem pode facilitar a tarefa das autoridades ao decidir como alocar recursos e avaliar opções de tratamento.
Os hospitais da cidade chinesa de Wuhan, a maior cidade da província de Hubei, vêm enfrentando problemas para diagnosticar infecções por meio de exames escassos. Outros países enfrentaram dificuldades semelhantes.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) comentou a alta de casos na China em reunião nesta quinta (13) e disse que a maioria das novas infecções se refere ao período inicial da epidemia.
“Apenas na província de Hubei, um profissional da saúde treinado agora poderá classificar um caso suspeito de covid-19 como clinicamente confirmado baseado apenas em exames de imagem do pulmão”, disse Mike Ryan, diretor executivo da OMS.
No resto da China e do mundo, a confirmação laboratorial ainda é necessária, disse Ryan.
“Nós vimos um aumento significativo no número de casos registrados da infecção na China, mas não vimos uma mudança significativa na trajetória da epidemia do coronavírus”, afirmou também.
Desde a semana passada, a lista de novos países com registros da doença não cresce. Nesta quinta, porém, o Japão anunciou a primeira morte em seu território e 44 novos casos de contágio entre os passageiros de um cruzeiro. Agora, são três mortes fora da China continental.
O Brasil não tem casos confirmados do coronavírus. Na quinta, caiu de 11 para seis o número de casos de suspeita de covid-19 em investigação. Outros 40 casos já foram descartados. A maioria tem dado positivo para vírus da gripe.
O secretário de vigilância em saúde do Ministério da Saúde, Wanderson Oliveira, não vê como surpresa a mudança do critério utilizado pela China para contabilizar os casos na província de Hubei.
“Sabíamos, baseados em artigosepublicações,quemuitos casos não se enquadravam, porque os testes são limitados”, afirma Oliveira, que lembra que novos testes sorológicos estão sendo produzidos e podem mudar o cenário.
Mas há especialistas que ficaram atônitos com a mudança e dizem que exames de imagem pulmonares são uma forma imperfeita de diagnóstico. Mesmo pacientes de gripe sazonal comum podem desenvolver pneumonia identificável em exames desse tipo.
Uma mudança de diagnóstico pode dificultar ainda mais a identificação do vírus, disse o médico Peter Rabinowitz, codiretor do Metacentro de Preparação para Epidemias e Segurança Mundial de Saúde na Universidade de Washington.
“Isso faz com que as coisas pareçam muito confusas agora, se eles estiverem mudando radicalmente a maneira pela qual testam e detectam a doença”, disse Rabinowitz.
Em Wuhan, trabalhadores dos serviços de saúde fizeram visitas de casa em casa para testar pessoas em busca de sintomas. A perspectiva de isolamento forçado pode estar dissuadindo algumas pessoas que sofrem de doenças respiratórias de se apresentarem aos centros de saúde em busca de atendimento, o que torna as dimensões da epidemia ainda menos claras.
A campanha por priorizar os exames de pulmão parece ter começado nas mídias sociais, por iniciativa de uma médica de Wuhan que na semana passada recorreu a exames de imagem pulmonares para simplificar a triagem de pacientes e acelerar sua hospitalização e tratamento.
Ela disse que os exames pulmonares produzem resultados imediatos, e que Wuhan estava ficando sem estoques de kits para exames.
Não é incomum que cientistas refinem critérios de diagnóstico à medida que a compreensão sobre uma nova doença muda. Mas, quando os critérios mudam, disseram especialistas, faz pouco sentido continuar oferecendo comparações em base semanal.
“Estamos em território desconhecido”, disse William Schaffner, médico especializado em doenças infecciosas na Universidade Vanderbilt, em Nashville.
Com The New York Times; colaborou Natália Cancian, de Brasília; tradução de Paulo Migliacci;
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