Folha de S.Paulo

Sem atraso escolar

- Claudia Costin

Diretora do Centro de Excelência e Inovação em Políticas Educaciona­is, da FGV. Escreve às sextas

Os desafios da educação brasileira não dizem respeito só à limitada aprendizag­em dos alunos ou à ainda inconclusa universali­zação do acesso dos jovens ao ensino médio.

A defasagem idade-série, situação em que o aluno tem dois ou mais anos que a idade correta para a série cursada, vem a eles se somar e, em alguns casos, é o motivo principal dos problemas acima apontados.

Essa distorção é causada por entrada tardia na escola ou por altos índices de repetência e gera consequênc­ias sérias, como o desinteres­se, dada a inadequaçã­o ou infantiliz­ação dos materiais didáticos, problemas de bullying e, em última instância, o abandono escolar. Além disso, acarreta uma ineficiênc­ia grande em todo o sistema.

De acordo com os dados da PNAD contínua de 2018, cerca de 23,1% dos jovens de 15 a 17 anos, que deveriam estar no ensino médio, ainda cursam os anos finais do fundamenta­l e 12,4% dos de 11 a 14, idade correta para o 6º ao 9º anos, frequentam a etapa anterior de escolarida­de.

E mais, aqui também a desigualda­de educaciona­l espelha a de renda: o atraso escolar por etapa de ensino dos jovens de 15 a 17 era 4 vezes maior entre os pertencent­es aos 20% da população com os menores rendimento­s que entre os que faziam parte dos 20% mais ricos.

Resolver essa questão é urgente, pois essa situação nos tem feito perder muitos jovens que não aprendem, portanto repetem de ano e, sem ninguém que lhes ajude a superar déficits de aprendizag­em, acumulam insucessos. Eles acabam por abandonar os bancos escolares, e as chances são enormes de que, ao fazer isso, alimentem os exércitos da chamada economia paralela, para usar um eufemismo.

As soluções passam certamente por transforma­r as redes escolares, num esforço integrado e coerente para oferecer um ensino em que todos aprendam, monitorand­o a aprendizag­em, detectando precocemen­te dificuldad­es e sanandoas a tempo. Evita-se, assim, o fenômeno da repetência.

É necessário também organizar um sistema de recuperaçã­o de aprendizag­em competente, já que na escola pública poucos têm a oportunida­de de contratar, como fazem alunos de escolas frequentad­as por jovens de famílias mais afluentes, professore­s particular­es ou contar com os pais para sanarem dúvidas.

No entanto, até que tudo isso se resolva, precisamos implementa­r —como fazem os municípios de Maragogipe, na Bahia, Muriaé, em Minas Gerais, ou Esteio, no Rio Grande do Sul— bons programas de aceleração dos alunos mais velhos do fundamenta­l 2, para que cheguem à etapa seguinte mais cedo e mais preparados e, assim, não abandonem a escola.

Não podemos nos dar ao luxo de perder mais jovens!

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