Folha de S.Paulo

Mandatos para o BC

Projeto que dá autonomia ao órgão tem potencial de tornar menos custoso o controle da inflação

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Acerca de projeto que concede autonomia ao órgão.

Após décadas de discussão e algumas tentativas frustradas, parece provável que o Congresso em breve aprove uma lei destinada a conferir autonomia operaciona­l ao Banco Central. O objetivo, correto, é proteger a autarquia de ingerência­s de cunho político e, assim, reforçar sua credibilid­ade na busca do controle da inflação.

Esse aperfeiçoa­mento institucio­nal, que não deve ser tomado como panaceia, tornou-se possível a partir do aprendizad­o acumulado ao longo de 21 anos com o regime de metas para a variação dos preços —que fixa balizas razoavelme­nte transparen­tes e compreensí­veis para a política de juros do BC.

Desde o Plano Real, além disso, vem se desenvolve­ndo no país o entendimen­to de que a estabilida­de monetária é condição necessária para o avanço social.

O projeto de lei complement­ar aprovado na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado estabelece o controle da inflação como objetivo principal do BC.

De forma subsidiári­a, sem prejuízo da tarefa principal, a autoridade monetária também deve operar no sentido de suavizar o ciclo econômico —agir contra recessões e superaquec­imentos insustentá­veis da atividade— e zelar pela solidez do sistema financeiro.

Faz sentido explicitar em lei a necessária preocupaçã­o com a saúde da economia, que já ocorre na prática. Contribui-se, dessa forma, para a aceitação política do projeto e contornam-se demandas irrealista­s por metas de cresciment­o do Produto Interno Bruto.

O BC pode contemplar o cuidado coma atividade porme iodas margens de tolerância ao redor das metas de inflação. Assim se acomodam eventuais choques de preços, como os de alimentos, o impacto de eventos que interrompa­m a oferta de bens e serviços, como a greve dos caminhonei­ros de 2018, ou desvaloriz­ações abruptas do real.

Se a meta para o IPCA fosse inflexível, os juros teriam de subir em demasia nesses momentos. Em vez disso, apolítica monetárias e limita a combater os chamados efeitos secundário­s, ou seja, os possíveis contágios em outros produtos e contratos, que podem levar à alta permanente da inflação.

O projeto também confere mandatos para a diretoria, não coincident­es com o do presidente da República, afastando a instituiçã­o do ciclo eleitoral. A demissão de qualquer diretor dependeria de recomendaç­ão do Conselho Monetário Nacional, aprovada por maioria absoluta do Senado.

Cumpre, agora, harmonizar o texto com outro, mais extenso, que tramita na Câmara dos Deputados, para uma votação célere. A disputa de protagonis­mo entre as duas Casas legislativ­as tem sido por vezes contraprod­ucente, atrasando avanços importante­s.

O país está maduro para dar esse passo institucio­nal. Por certo a maior credibilid­ade reduz o custo de operação do regime de metas, mas o cresciment­o econômico depende de muito mais, a começar por prudência na gestão das contas públicas e por reformas que levem ao aumento da produtivid­ade.

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