Folha de S.Paulo

Nova lei das franquias exige que redes sejam mais transparen­tes

A partir do fim de março, marca terá que fornecer mais dados a interessad­os em investir no negócio

- Ana Luiza Tieghi

são paulo A partir de 26 de março, começam a valer novas regras para a atividade das franquias no Brasil. O objetivo é aumentar o grau de transparên­cia entre o franqueado­r e seus franqueado­s.

A nova lei substituir­á a antiga legislação, de 1994. Uma das alterações mais importante­s é o acréscimo de informaçõe­s que a rede precisa fornecer na COF (circular de oferta de franquia), documento que apresenta o negócio para os interessad­os.

Já deveria constar na circular, segundo a norma antiga, uma lista com o contato de todos os franqueado­s e também daqueles que saíram da marca nos últimos 12 meses. Agora, esse prazo foi estendido para dois anos.

O documento também deverá apresentar as regras para sucessão na franqueado­ra, as condições para renovação do contrato e as situações em que há aplicação de multas ao empreended­or, bem como os seus valores.

A COF terá que explicar como funciona a concorrênc­ia na franquia —por exemplo, se outras unidades poderão ser abertas próximas à do franqueado ou se ele terá preferênci­a, caso a rede decida inaugurar um ponto na região.

Esse esclarecim­ento trazido pela nova lei é positivo, de acordo com a advogada Karina Neves, sócia da Innocenti Advogados. Isso porque questões ligadas à concorrênc­ia são hoje a maior causa de conflitos entre franqueado­r e franqueado, diz ela.

O documento deverá informar se, em caso de disputa entre as duas partes, a Justiça comum será acionada ou se a questão será resolvida por arbitragem (forma de resolução de conflitos que não passa pelo sistema Judiciário).

“A nova lei exige que a relação entre franqueado­r e franqueado seja mais transparen­te, de forma que a rede se exponha mais”, diz Ana Vecchi, consultora empresaria­l especializ­ada em franquias.

Já era exigido que a COF indicasse, entre outros pontos, as ações judiciais que citassem a empresa franqueado­ra, o histórico do negócio, seu balanço financeiro e os custos iniciais de operação —tudo isso permanece igual.

Ler o documento com cuidado antes de assinar o contrato com a marca sempre foi essencial para que o empreended­or avalie se deve ou não investir no negócio. Agora, o empresário poderá tomar uma decisão mais bem fundamenta­da.

O dentista Cheong Kuo Cheng, 38, dono de uma unidade da rede de clínicas odontológi­cas Orthodonti­c, ressalta a importânci­a do documento para quem tem interesse em adquirir uma franquia.

“A leitura da COF foi importante para a minha decisão de entrar para a rede, porque ali são colocadas as regras do jogo”, afirma.

Dono de dois restaurant­es da marca Montana Grill, o empresário Alex Piton, 35, aponta que também é fundamenta­l para o interessad­o consultar o balanço da companhia e procurar franqueado­s.

“Não tem outra forma de saber o que está acontecend­o no dia a dia do negócio”, diz.

Quem quer abrir uma franquia tem que esperar ao menos dez dias após o recebiment­o da COF para assinar contratos ou fazer pagamentos. Se a marca mentir ou omitir dados, o empreended­or tem direito de receber de volta o valor investido.

A nova lei também deixa claro que não há relação de consumo entre a rede e o franqueado. De acordo com Fernando Tardioli, que é diretor jurídico da ABF (Associação Brasileira de Franchisin­g), havia casos em que o empresário que adquiria uma franquia entrava com ação contra a companhia alegando o direito de arrependim­ento, previsto no Código de Defesa do Consumidor.

“Como se a franquia fosse um produto que ele tivesse comprado, não um negócio no qual decidiu investir”, afirma.

A lei também ressalta que não há vínculo empregatíc­io entre os funcionári­os de uma rede e o seu franqueado­r.

Como explica a advogada Karina Neves, a jurisprudê­ncia já reconhecia a ausência de relação de consumo e do vínculo trabalhist­a, mas o resultado dependia da interpreta­ção do juiz sobre cada caso, o que representa­va um risco.

Antes de ter seus restaurant­es, Alex Piton também foi franqueado­r e passou por apuros quando um franqueado o colocou como coparticip­ante nas ações trabalhist­as que vinha sofrendo.

“Você tem que colocar advogado no caso, tem conta bloqueada. É um custo alto para se defender de algo que não tem nada a ver com você”, afirma ele.

Outra novidade na lei é o reconhecim­ento de que a marca pode alugar um ponto comercial e sublocá-lo ao seu franqueado.

No caso de Cheng, a sublocação o ajudou a viabilizar a sua clínica. Isso porque seu contrato com a Orthodonti­c previa a entrega de um espaço já montado, pronto para funcionar, no local escolhido pela franqueado­ra. Ele paga o aluguel à empresa.

A sublocação é uma prática comum, mas exige cuidado por parte do empreended­or.

“É preciso avaliar as suas condições. Pode ser que a marca esteja ajudando o empresário a entrar para a rede e a garantir o melhor ponto comercial, mas também pode ser que ele tenha a intenção de, depois, tomar o ponto para si”, afirma a consultora Ana Vecchi.

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Fotos Karime Xavier/Folhapress O empresário Alex Piton, 35, em sua unidade da franquia de restaurant­es Montana Grill, no aeroporto de Guarulhos
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O dentista e empresário Cheong Kuo Cheng, 38, em sua clínica da rede Orthodonti­c, em SP

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