Folha de S.Paulo

Governo ofusca ministro, mas diz não cogitar demissão

Mandetta vê apresentaç­ões sobre crise migrarem para Planalto, com colegas

- Natália Cancian , Paulo Saldaña , Daniel Carvalho e Fábio Pupo

brasília O governo Bolsonaro reduziu nesta segunda (30) a visibilida­de de Luiz Henrique Mandetta na divulgação de dados do coronavíru­s, em meio às divergênci­as do discurso do ministro da Saúde com a conduta do presidente.

O ministro da Casa Civil, Walter Braga Netto, que ganhou protagonis­mo na apresentaç­ão à imprensa, afirmou que não há, no momento, a intenção de demitir Mandetta.

“[Quero] deixar claro para vocês: não existe essa ideia de demissão do ministro Mandetta. Isso está fora da cogitação no momento”, disse ele, que é próximo de Bolsonaro.

O titular da Saúde reagiu com ironia. “Vamos lá, em política, quando a gente fala ‘não existe’, a pessoa já fala ‘existe’.”

No domingo (29), Bolsonaro afrontou as orientaçõe­s de isolamento, defendidas por Mandetta, e fez um giro pelo comércio de Brasília.

Nesta segunda, levou ao Palácio do Planalto a apresentaç­ão diária do Ministério da Saúde, que costumava ser longa, técnica e apenas com a cúpula da pasta. Desta vez, a entrevista coletiva reuniu, além de Mandetta e Braga Netto, outros ministros.

Apesar do anúncio do governo de que seriam aceitas oito perguntas, a entrevista foi interrompi­da depois da quarta, justamente após questionam­ento sobre as andanças de Bolsonaro no Distrito Federal no dia anterior, contrarian­do as orientaçõe­s do ministro da Saúde.

Braga Netto negou que as mudanças no formato da apresentaç­ão dos dados tivesse como pano de fundo problemas políticos.

As falas de Mandetta foram repletas de recados a Bolsonaro,

antes da interrupçã­o da entrevista. Ele disse, por mais de uma vez, que continuará tendo uma atuação técnica no comando do enfrentame­nto da crise do coronavíru­s, que já matou 159 pessoas no Brasil.

“A pasta da Saúde continua técnica, continua científica”, afirmou. “A Saúde é um norte, um farol. Enquanto não temos uma resposta mais cientifica­mente comprovada, a Saúde vai falar ‘para e vamos evitar contágio’. Isso não é a Saúde ser boa ou má, estar certa ou estar errada. Isso é nosso instinto de preservaçã­o”, disse Mandetta.

“A nossa vontade de preservar, o instinto pela vida, é mais forte do que o instinto econômico”, prosseguiu o ministro da Saúde. “Enquanto eu estiver nominado, vou trabalhar com a ciência, com a técnica e com o planejamen­to.”

Mandetta atribuiu o tensioname­nto de sua relação com Bolsonaro ao estresse do enfrentame­nto ao novo coronavíru­s.

“Todos nós estamos tentando fazer o melhor pelo povo brasileiro, e o presidente também. Agora, os processos em andamento, as tensões são normais pelo tamanho desta crise”, afirmou.

Ele disse, ainda, que não há como se compromete­r com um prazo para o período de quarentena. Bolsonaro, por sua vez, já falou em editar um decreto para obrigar o retorno das atividades comerciais.

Em diversos momentos, Mandetta elogiou as medidas de governador­es e prefeitos, que têm pedido que a população permaneça em casa.

“No momento deve manter o máximo grau de distanciam­ento social, para a que a gente possa, nas regras que estão nos estados, dar tempo para que o sistema se consolide na sua expansão”, disse.

“Por enquanto, mantenham as recomendaç­ões dos estados porque esta é, no momento, a medida mais recomendáv­el, já que temos muitas fragilidad­es ainda no sistema de saúde, que são típicas não de faltas do Ministério da Saúde ou do governo”, disse Mandetta.

Ele também pediu desculpas pelas críticas que fez à imprensa no sábado (28) e elogiou a TV Globo, constante alvo de ataques do presidente da República.

Bolsonaro, enquanto isso, em entrevista à RedeTV!, reforçava na tarde desta segunda sua defensa anticonfin­amento.

“[A restrição] tem que ser afrouxada alguma coisa, paulatinam­ente, para que o desemprego não aumente mais ainda no Brasil. E repito, os danos do desemprego vai ser muito maior do que o vírus”, afirmou.

Na disputa entre privilegia­r a economia, como defende Bolsonaro, ou a saúde, Mandetta, em determinad­o momento, falou do trabalho para garantir um estoque nacional de leitos e insumos.

Tanto no domingo, durante o passeio, como nesta segunda-feira, ao deixar o Palácio da Alvorada, Bolsonaro teve que ouvir de apoiadores pedidos para que mantivesse Mandetta. Nas duas ocasiões, preferiu não responder.

“[Quero] deixar claro para vocês: não existe essa ideia de demissão do ministro Mandetta. Isso está fora da cogitação no momento Walter Braga Netto ministro da Casa Civil

“Vamos lá, em política, quando a gente fala ‘não existe’, a pessoa já fala ‘existe’ Luiz Henrique Mandetta ministro da Saúde

 ?? Marcello Casal Jr - 28.mar.20/Agência Brasil ?? No sábado, o ministro atualizou dados do coronavíru­s acompanhad­o de seu corpo técnico
Marcello Casal Jr - 28.mar.20/Agência Brasil No sábado, o ministro atualizou dados do coronavíru­s acompanhad­o de seu corpo técnico
 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? Acima, na entrevista desta segunda, Mandetta (de colete) com, a partir da esq., o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Raul Botelho, e os ministros Tarcísio Freitas, Braga Netto e Onyx Lorenzoni e o AGU, André Mendonça
Pedro Ladeira/Folhapress Acima, na entrevista desta segunda, Mandetta (de colete) com, a partir da esq., o chefe do Estado-Maior das Forças Armadas, Raul Botelho, e os ministros Tarcísio Freitas, Braga Netto e Onyx Lorenzoni e o AGU, André Mendonça

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