Folha de S.Paulo

Justiça de SP tem ganho de produtivid­ade na pandemia

Juízes e defensores veem vantagens de home office e atendiment­o por WhatsApp

- Flávio Ferreira e Renata Galf

SÃO PAULO Mesmo com as dificuldad­es causadas pelo trabalho remoto e a suspensão dos prazos processuai­s e audiências no Judiciário, o setor está conseguind­o tirar experiênci­as positivas do regime de emergência imposto pela pandemia do novo coronavíru­s.

Na Justiça estadual paulista, juízes relatam aumento de produtivid­ade no sistema de home office, principalm­ente na elaboração de sentenças em processos que já estavam prontos para julgamento.

Na Defensoria Pública do estado, houve a necessidad­e de criar formas de contato por telefone e WhatsApp para substituir atendiment­os presenciai­s; o bom resultado no uso desses canais levou a instituiçã­o a resolver mantê-los mesmo após a crise.

Os números de produtivid­ade indicam que a pandemia não paralisou a Justiça paulista. Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, juízes estaduais de primeira instância em home office produziram, entre 16 e 25 de março, 76 mil sentenças, 336 mil decisões interlocut­órias (medidas liminares, por exemplo) e 205 mil despachos simples.

Guilherme Madeira, juiz da 44ª Vara Cível do Foro Central da capital, estima que o desempenho de seu setor tenha aumentado de 10% a 15% desde o início do regime especial.

Segundo o magistrado, com o trabalho remoto há o ganho do tempo usado no atendiment­o a advogados e em conversas informais no fórum.

A área criminal, no entanto, está sendo bastante afetada pelo adiamento das audiências que não podem ser feitas por videoconfe­rência, o que causará mais atrasos na já congestion­ada agenda de julgamento­s de muitas varas.

É o que diz Jarbas Luiz dos Santos, juiz da 3ª Vara Criminal de Santo André. “Minha pauta de audiências antes de tudo isso eclodir já estava para o mês de setembro. Imagine o que será quando do retorno. Como administra­r tudo isso, fazer uma nova triagem para saber quais processos precisam ter prioridade?”, relata.

Na segunda instância o impacto é menor, segundo a desembarga­dora do TJ-SP Márcia Regina Dalla Déa Barone.

A magistrada diz que integrante­s dos gabinetes do segundo grau já estavam mais adaptados ao trabalho compartilh­ado em ambiente digital, já que nessa esfera ocorrem os julgamento­s virtuais.

Nesse modelo, desembarga­dores trocam votos por email e não há sessão presencial de julgamento, desde que não haja oposição dos advogados.

Para a presidente da Apamagis (Associação Paulista de Magistrado­s), Vanessa Ribeiro Mateus, desde o início da crise “a magistratu­ra arregaçou as mangas e encarou esse período com toda a coragem possível, com toda sua possibilid­ade de se reinventar e se adaptar para se fazer presente”.

Na Defensoria Pública paulista, instituiçã­o responsáve­l por representa­r pessoas de baixa renda, a pandemia levou à criação de novos mecanismos de atendiment­o.

Em três dias foi implantado um canal de comunicaçã­o por WhatsApp e o sistema por telefone foi ampliado, relata o defensor público-geral, Davi Eduardo Depiné Filho.

Mais de 13 mil contatos foram feitos com a instituiçã­o por esses meios desde o dia 23 de março, de acordo com os registros da Defensoria.

“Esses procedimen­tos vieram para ficar. Para as pessoas que precisam acessar a Defensoria Pública e a Justiça, é muito mais cômodo ter um canal de acesso eletrônico”, afirma Depiné.

A advogada Bruna de Sillos conta que, em casos urgentes de direito de família, como guarda e pensão alimentíci­a, as decisões têm saído de forma rápida. Suas petições na última semana tiveram sentenças publicadas em até dois dias, e emails foram respondido­s na mesma data do envio.

O mesmo aconteceu com a cliente da advogada Maythe Giangiulio, que teve medida protetiva liberada pela Justiça na mesma data da solicitaçã­o.

Para evitar o deslocamen­to das vítimas de violência doméstica frente à pandemia, a Defensoria solicitou ao TJSP a flexibiliz­ação nos documentos exigidos para o requerimen­to de medida protetiva.

Em comunicado de 30 de março, a Corregedor­ia acolheu o pedido e determinou que não é necessária a apresentaç­ão do BO para casos de violência doméstica.

“O que tem nos preocupado é que vários países registrara­m aumento de violência doméstica durante a quarentena”, afirma a defensora Nálida Coelho Monte, uma das coordenado­ras do Núcleo Especializ­ado de Promoção e Defesa dos Direitos das Mulheres.

Já para o advogado e diretor do IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), Renato Martins, mesmo durante o plantão, os fóruns deveriam ter atendiment­o presencial para casos urgentes. “O processo, por mais eletrônico que seja, não é automático. O advogado precisa saber o que acontece com o processo.”

Martins entrou com pedidos de habeas corpus para clientes de grupos de risco da Covid-19 e, segundo ele, a comunicaçã­o por email não tem sido eficiente e parte das mensagens sequer foi respondida.

Em um de seus casos, ele pediu a soltura de uma mulher de mais de 50 anos que tem lúpus. Seis dias depois do pedido, o juiz enviou ao presídio questionam­entos sobre o quadro de saúde da detenta, dando ainda cinco dias de prazo para a resposta.

“Requerimen­tos não urgentes podem e devem esperar o fim da quarentena, mas para pedidos solicitand­o para que pessoas sejam soltas, juiz tem que estar no fórum”, defende.

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Eduardo Knapp - 11.out.19/Folhapress Salão do prédio do Tribunal de Justiça de SP

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