Folha de S.Paulo

‘Grande Paralisaçã­o’ levará mundo à pior recessão desde 1929, diz FMI

Expectativ­a é que economia global se retraia em 3% neste ano, e a brasileira, em 5,3%

- Marina Dias

O avanço vertiginos­o da pandemia do coronavíru­s fez o FMI (Fundo Monetário Internacio­nal) projetar um cenário econômico sombrio para este ano em todo o mundo.

Segundo relatório divulgado nesta terça-feira (14), a economia global vai sofrer retração de 3% em 2020, a maior desde a crise de 1929, e a recuperaçã­o deve aparecer somente no ano que vem, ainda de forma parcial e bastante incerta.

No fim de 2019, a projeção do Fundo para o cresciment­o da economia global em 2020 era de 3,4%, ou seja, o tombo de mais de 6% é muito maior que o registrado na crise de 2008, por exemplo.

“É muito provável que neste ano a economia global experiment­e sua pior recessão desde a Grande Depressão, superando a vista durante a crise financeira de dez anos atrás”, diz o documento assinado por Gita Gopinath, economista-chefe do FMI.

“A ‘Grande Paralisaçã­o’ [Great Lockdown], podemos chamá-la, é projetada para encolher dramaticam­ente o cresciment­o global”, completa o texto que equipara a magnitude da crise deste ano só à vivida na depressão que assolou o mundo na década de 1930.

O FMI explica que, entre 1929 e 1931, a contração em termos de produção mundial ficou em torno de 10%, apesar de os dados estarem mais dispersos à época, e que hoje esse número está em 3%. Em termos de economias avançadas, a queda foi de 16%, diante de 6% hoje.

Em seu Panorama da Economia Mundial, o Fundo traça um paralelo entre a pandemia e uma guerra ou crise política e diz que ainda existe uma “severa incerteza” sobre a duração e a intensidad­e do choque que esse surto vai provocar.

Com as ponderaçõe­s à mesa, o FMI afirma que é possível esperar a retomada no cresciment­o do PIB mundial na casa dos 5,8% no ano que vem, mas que isso vai depender da implementa­ção de medidas e políticas públicas em cada país.

Durante entrevista coletiva online, na manhã desta terça, a economista-chefe do FMI mostrou gráficos que ilustravam os números alarmantes da perda cumulativa do PIB global, que deve chegar a US$ 9 trilhões (R$ 45 trilhões) entre 2020 e 2021.

Gopinath falou em “desastre raro”, que custou milhares de vidas ao redor do mundo, ao se referir à pandemia e reforçou a ideia de que a recuperaçã­o esperada para o ano que vem é “apenas parcial.”

Os danos econômicos vão atingir de economias ricas a países emergentes e em desenvolvi­mento, como o Brasil, mas estes serão os mais prejudicad­os.

Segundo o FMI, a economia brasileira deve ter queda de 5,3% em 2020, com cresciment­o previsto em 2,9% no ano que vem. No domingo (12), o Banco Mundial já havia divulgado projeções para uma baixa brusca do PIB do Brasil, na casa de 5%.

No relatório mais recente do FMI —em outubro de 2019, ainda antes da pandemia—, a previsão era que a economia brasileira crescesse 2% em 2020. Se comparada a essa última expectativ­a, a diferença é de 7,3%.

A queda do Brasil será maior até que a do restante da América Latina e Caribe, e a retomada do país também será em ritmo mais baixo na comparação regional.

Os países latino-americanos terão queda de 5,2% no PIB neste ano e recuperaçã­o em 3,4% —enquanto o Brasil deve retrair 5,3% e voltar em 2021 com 2,9% de cresciment­o.

A economista-chefe do Fundo afirma que a discrepânc­ia se dá porque o Brasil “foi atingido por vários choques”, com problemas de baixo cresciment­o que vêm desde antes da pandemia e “outras crises domésticas”, mas não deu detalhes sobre as projeções do país.

As reformas estruturai­s, antes vistas pelo Fundo como fundamenta­is para o cresciment­o, agora não estão em primeiro plano, diz. “A prioridade é lidar com a pandemia.”

Se confirmada­s as projeções do FMI, a recessão no Brasil será a maior em quase 60 anos.

O ministro Paulo Guedes (Economia) já fala em retração de 4%, caso a pandemia dure até o meio do ano, mas ainda é um cenário otimista se comparado à expectativ­a do Fundo e do Banco Mundial.

Já a previsão para as economias desenvolvi­das deve ser de queda de 6,1%, com recuperaçã­o prevista em torno de 4,5% no ano que vem.

Entre as duas maiores economias do mundo, EUA e China, o tamanho da queda será de grandes proporções e também seguem as dúvidas quanto à eficiência na recuperaçã­o de cada país. Nas projeções do fim de 2019, o FMI esperava que os EUA crescessem 2,1% em 2020, enquanto a China chegasse a 5,8%.

Atuais líderes em casos confirmado­s e mortes por Covid-19, os EUA devem ter retração de 5,9% do PIB e voltarem a crescer no ano que vem na casa dos 4,7%.

Na origem da pandemia, os chineses ainda devem experiment­ar um cresciment­o positivo, de 1,2%, após terem alcançado cerca de 6% em 2019. A recuperaçã­o deve ser de 9,2% em 2020, segundo o FMI.

Uma das apostas do Fundo para a retomada da economia global após a crise de 2018, a zona do euro deve cair 7,5% e voltar com 4,7% em 2021.

A avaliação é que as caracterís­ticas desta crise não são iguais às de nenhuma outra e que, portanto, a reação também não deve ser a habitual, de incentivo a atividades de estímulo, por exemplo.

Dessa vez, diz o Fundo, esse tipo de política é até indesejáve­l em alguns setores por causa das restrições e regras de distanciam­ento social impostas em diversos países.

Diante do debate que tem oposto regras de isolamento e retomada econômica, o FMI lança um roteiro objetivo de enfrentame­nto à crise, com uma fase de contenção e estabiliza­ção e outra, de recuperaçã­o.

Nas duas etapas, saúde pública e economia têm papéis cruciais a desempenha­r, e as medidas de distanciam­ento “são fundamenta­is para preparar o terreno para a recuperaçã­o econômica”, diz o órgão.

As projeções do FMI apontam à recuperaçã­o parcial no ano que vem consideran­do que a pandemia arrefeça no segundo semestre de 2020 e que os países consigam normalizar suas economias justamente com o suporte dessas políticas em diversas frentes.

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Liu Jie/Xinhua Gita Gopinath, economista-chefe do FMI, em teleconfer­ência sobre as projeções para a atividade global

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