Folha de S.Paulo

Cuidado com as comparaçõe­s

- Hélio Schwartsma­n

são paulo Jornalista­s adoramos rankings e comparaçõe­s entre países —e por bons motivos. A contextual­ização costuma ser uma rota eficaz para a compreensã­o. É preciso, porém, cuidado para não cair na armadilha das comparaçõe­s que confundem mais do que esclarecem.

É o caso, infelizmen­te, das tabelas e gráficos que põem lado a lado o número de casos e de mortes por Covid-19 em vários países. Esses dados, frise-se, são importante­s para uma série de mensuraçõe­s, mas a comparação direta deles revela pouco.

O ponto central é a testagem. Como cada país tem uma política diferente de testagem, o número de casos confirmado­s e outros indicadore­s que dependem dele, como a morbidade por 100 mil habitantes e a taxa de letalidade, se tornam incomensur­áveis. Um país que só teste doentes graves terá, por definição, uma letalidade alta, enquanto um que vá atrás até de pacientes assintomát­icos apresentar­á um índice mais baixo (e mais próximo do real). Há que considerar ainda que diferentes países estão em diferentes fases da epidemia.

Contar só os mortos em vez dos doentes diminui o espaço para o erro, mas não o elimina. É difícil desaparece­r com o cadáver, mas dá para fazer muita bagunça com a causa da morte. O governo da Bélgica, por exemplo, afirma que a alta mortalidad­e por Covid-19 registrada no país se deve à transparên­cia com que apresenta os números. Ele contabiliz­a na coluna dos óbitos todos os casos suspeitos, mesmo sem confirmaçã­o laboratori­al.

Uma comparação objetiva do desempenho de cada país poderá ser feita depois que epidemiolo­gistas, de posse dos dados relevantes, como o excesso de mortes e os resultados das investigaç­ões sorológica­s, traçarem o quadro completo de como cada nação se saiu.

O que dá para dizer por ora é que países que conseguira­m evitar o colapso dos sistemas de saúde estão lidando melhor com a crise do que os que deixaram suas UTIs lotarem.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil