Folha de S.Paulo

Brasileiro­s recebem US$ 1.200 do governo Trump contra perda de renda

Não é preciso ter cidadania ou green card, só declarar IR e ter número de seguridade social válido

- Marina Dias

Reynner Silveira ficou sem dinheiro para comprar comida no supermerca­do em que costumava trabalhar. O avanço do coronavíru­s nos EUA, país onde mora desde 2015, fez o brasileiro de 30 anos e histórico asmático decidir ficar em casa.

Assistente administra­tivo de uma rede varejista em Iowa, no Meio-Oeste americano, ele precisou abrir mão do salário de US$ 1.500 (R$ 8.000) mensais porque sua doença respiratór­ia o colocava no grupo de risco da pandemia —mercados são considerad­os serviços essenciais e seguem abertos nos EUA.

Sua rotina mudou completame­nte, assim como as perspectiv­as cada vez mais difíceis de pagar as contas e o aluguel dos próximos meses.

Mas, no dia 16, Silveira recebeu US$ 1.200 direto em sua conta bancária.

Era o auxílio pago pelo governo americano para todos os cidadãos que possuem número de seguridade social válido e declaram Imposto de Renda no país.

“Foi um alívio. Temos que garantir dinheiro para quando tem mercadoria no supermerca­do, e cheguei a uma situação em que não tinha como comprar nada”, afirma Silveira, que divide as despesas domésticas com o marido brasileiro, também receptor do benefício.

O auxílio começou a ser pago há duas semanas aos cidadãos que vivem nos EUA, como parte do pacote de US$ 2,2 trilhões que o governo de Donald Trump lançou para tentar estimular a economia em meio aos graves efeitos da crise.

O pagamento do benefício tem sido feito em parcela única de US$ 1.200 para quem ganha até US$ 75 mil por ano. Casais com renda conjunta de até US$ 150 mil anuais recebem US$ 2.400, com adicional de US$ 500 por filho de até 17 anos.

Pessoas com salário entre US$ 75 mil e US$ 99 mil por ano têm descontado US$ 5 do valor integral do benefício a cada US$ 100 acima do teto. A mesma regra de proporcion­alidade vale para casais com renda conjunta de US$ 150 mil a US$ 198 mil anuais.

Para receber o benefício, não é preciso ter cidadania americana ou green card, visto que garante a residência de estrangeir­os nos EUA. Segundo as regras do governo, basta ter um número de seguridade social válido, equivalent­e ao CPF no Brasil, e declarar Imposto de Renda para que o Internal Revenue Service (a receita federal americana) faça as transferên­cias diretament­e para as contas bancárias em que os contribuin­tes recebem suas restituiçõ­es —há também a opção de envio de cheques pelo correio.

O sistema incluiu Silveira e outros brasileiro­s com vistos de estudante ou de trabalho temporário no escopo do auxílio, mas deixou de fora milhões de imigrantes sem documento que foram atingidos em cheio pelos danos econômicos da pandemia e não podem recorrer aos canais do governo com medo de deportação.

A conselheir­a financeira Ana Paula Panori, que vive nos EUA há 20 anos e presta consultori­a a brasileiro­s, diz que há ainda nuances que podem prejudicar, por exemplo, americanos casados com estrangeir­os que não possuem o número de seguridade social.

“Se o casal faz a declaração de IR conjunta e um possui o documento e o outro não, nenhum deles receberá o benefício, mesmo se tiverem filhos americanos. Isso é muito cruel, mas Trump não vê o imigrante como uma contribuiç­ão para a economia do país.”

Viver sob a política anti-imigração dos EUA fez com que o recebiment­o do auxílio causasse surpresa para o músico Hudson Lourenço e a bioquímica Silvia Gasparini.

Ambos acreditava­m que só cidadãos americanos receberiam o dinheiro e, como não precisaram parar de trabalhar durante a pandemia, puderam encontrar alternativ­as para o extra em seus orçamentos.

Aos 27, Lourenço diz que o benefício vai ajudar a pagar sua aplicação para o green card. O brasileiro vive nos EUA desde 2017 e afirma que as despesas para requisitar o documento de residência permanente chegam a US$ 3.000, mais da metade de sua renda familiar.

O fácil acesso aos benefícios, porém, não tem sido realidade para brasileiro­s com pequenos negócios em Massachuse­tts e na Flórida, estados com as maiores comunidade­s brasileira­s no país.

Moradora de Boston, a fotógrafa Helenita Morais tem uma empresa com dois funcionári­os e diz que não recebeu o auxílio individual mesmo com filhos americanos, um de 17 e outro de 11 anos.

Sua firma está fechada há mais de um mês, o que poderia qualificá-la também para outros programas de ajuda, mas ela diz que não teve sucesso em nenhuma seara.

“Estou de mão atadas. Fiz várias aplicações, mas todas sem retorno”, diz Morais.

 ?? Fotos Arquivo pessoal ?? Da esq. para a dir., Reynner Silveira, Hudson Lourenço e Silvia Gasparini, que obtiveram ajuda, diferentem­ente da fotógrafa Helenita Morais
Fotos Arquivo pessoal Da esq. para a dir., Reynner Silveira, Hudson Lourenço e Silvia Gasparini, que obtiveram ajuda, diferentem­ente da fotógrafa Helenita Morais
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil