Folha de S.Paulo

Bolsonaro diz que general se enganou sobre menção à PF

Segundo Luiz Eduardo Ramos, corporação foi citada na reunião de 22 de abril

- Daniel Carvalho

brasília O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse nesta quarta-feira (13) que seu ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, “se equivocou” ao dizer que houve menção à Polícia Federal na reunião ministeria­l de 22 de abril.

A Folha mostrou que os depoimento­s prestados no dia anterior (12) por Ramos e pelo general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucio­nal, conflitam com a versão de Bolsonaro sobre a citação à PF no encontro.

Segundo ambos, o presidente da República mencionou a Polícia Federal ao cobrar relatórios de inteligênc­ia.

Na terça, em entrevista, Bolsonaro já havia declarado: “Não existe no vídeo a palavra Polícia Federal, nem superinten­dência. Não existem essas palavras”. A declaração foi reiterada de maneira contundent­e nesta quarta, quando ele afirmou que “vão cair do cavalo sobre o vídeo”.

“Eu não falo Polícia Federal. Não existem as palavras Polícia Federal em todo o vídeo. Não existe a palavra superinten­dência. Não existe a palavra investigaç­ão sobre filho. Falo sobre segurança da família e meus amigos. Ou você acha que não há interesse em fazer uma maldade com um filho meu?”

Bolsonaro disse que sua segurança pessoal e de sua família é responsabi­lidade do GSI e que, por isso, dirigiu-se a Heleno e não ao então ministro da Justiça, Sergio Moro, a quem a PF era subordinad­a, no momento da cobrança.

“Não falei o nome dele [Moro] no vídeo. Eu falei a minha segurança pessoal no Rio de Janeiro. A PF não faz a minha segurança pessoal, quem faz é o GSI. O ministro é o Heleno”, disse o presidente.

Bolsonaro, então, foi questionad­o se havia cogitado demitir Heleno. “Não, não vou entrar em detalhe, tá? Quem faz a minha segurança é ele, quem faz a minha segurança. O vídeo está bem claro, a reunião está clara”, declarou o presidente.

De acordo com o depoimento de Ramos, na reunião de 22 de abril Bolsonaro “se manifestou de forma contundent­e sobre a qualidade dos relatórios de inteligênc­ia produzidos pela Abin [Agência Brasileira de Inteligênc­ia], Forças Armadas, Polícia Federal, entre outros”.

Segundo Ramos, Bolsonaro “acrescento­u que, para melhorar a qualidade dos relatórios, na condição de presidente da República, iria interferir em todos os ministério­s para obter melhores resultados de cada ministro”.

“Vocês precisam estar comigo”, afirmou Bolsonaro, ainda acordo com o depoimento do ministro, a que a Folha teve acesso. Assim como na terça, nesta quarta-feira o presidente voltou a negar menção à Polícia Federal.

“O Ramos se equivocou. Mas como é reunião, eu tenho o vídeo. O Ramos, se ele falou isso, se equivocou”, afirmou.

Ainda pela manhã, o vicepresid­ente, general Hamilton Mourão, disse em rede social que Heleno, Ramos e o ministro da Casa Civil, general Walter Braga Netto, que também prestou depoimento à PF na terça-feira, falam a verdade.

“Quem alinha discurso é bandido. Homens de honra, como Augusto Heleno, Braga Netto e Ramos, falam a verdade e cumprem a missão”, escreveu no Twitter.

Diante dos desdobrame­ntos da reunião de 22 de abril, Bolsonaro já não permitiu a gravação de reunião de terçafeira e anunciou que não fará mais reuniões do conselho do governo, colegiado que reúne todos os ministros. As reuniões, agora, serão individuai­s.

O presidente disse que agora tomará café da manhã com a equipe uma vez por mês, após cerimônia de hasteament­o da Bandeira em frente ao Alvorada —o que chamou de “uma confratern­ização mensal de ministros”.

Bolsonaro também afirmou que, por ele, o vídeo da reunião pode ser divulgado, mas apenas o trecho que é alvo do processo.

“Vou levar, aproveitan­do a tua sugestão aí, ao AGU [advogado-geral da União], o ministro [José] Levi, se a gente pode divulgar essa parte. Se eu não me engano, o Celso de Mello [ministro do STF] ontem oficiou aí o advogado do Moro, a AGU e a Justiça exatamente para ver se a gente entra nessa linha para divulgar, mesmo com os palavrões que eu falo sempre”, disse.

Segundo pessoas que tiveram acesso à reunião gravada, Bolsonaro vinculou a mudança do superinten­dente da Polícia Federal do Rio de Janeiro a uma proteção de sua família. Usou o verbo “foder” ao falar do impacto de uma possível perseguiçã­o a seus familiares.

Sempre de acordo com o relato de pessoas que assistiram ao vídeo, o presidente disse que, antes disso, trocaria todos da “segurança” do Rio de Janeiro, o chefe da área e até o ministro –na época, o da Justiça era Moro, que deixou o governo dois dias depois daquela reunião ministeria­l.

Na interpreta­ção de quem assistiu ao vídeo, as palavras foram um recado a Moro.

O presidente afirmou que não poderia ser “surpreendi­do” porque, de acordo com ele, a Polícia Federal não repassava informaçõe­s.

O vídeo da reunião foi exibido na terça na PF em Brasília. Moro acompanhou presencial­mente a exibição ao lado de integrante­s da Procurador­iaGeral

da República, advogados do ex-ministro e integrante­s do governo federal e da PF.

A gravação, ainda sob sigilo, é parte do inquérito que tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) sobre as acusações de interferên­cia na Polícia Federal que Moro fez a Bolsonaro.

Na entrevista desta quartafeir­a, Bolsonaro mencionou a redução salarial de 25% para jornalista­s durante a crise econômica causada pela pandemia do coronavíru­s.

“Inclusive aí, aproveitar o momento, eu tô apurando: Globo, Folha, Estadão e Jornal do Commercio. Salário reduzido em 25%. É isso mesmo?”, disse.

“É isso mesmo? Repetir: Globo, Estadão, Folha e Jornal do Commercio, redução de 25% do salário. Tem colegas de vocês, se for verdade, parece que é, que vai ter dificuldad­es de pagar aluguel, pagar escola para o filho.”

“Tá todo mundo pagando a conta alta dessa irresponsa­bilidade de se tratar uma coisa séria, que é o vírus, que mata gente. Vamos tratar com responsabi­lidade isso aí, sem matar empregos”, prosseguiu o presidente.

Algumas empresas jornalísti­cas brasileira­s já aderiram à medida provisória do governo que autoriza a suspensão de contratos ou redução de salários e jornadas de trabalhado­res durante a crise provocada pelo coronavíru­s.

Outras empresas da área, como a Folha, estão em processo de negociação.

O número de trabalhado­res formais que tiveram salários e jornadas reduzidos ou contratos suspensos após a crise do coronavíru­s ultrapasso­u 7 milhões na segunda-feira (11), segundo o Ministério da Economia. Pelo menos 600 mil empresas aderiram à medida provisória, de acordo com os últimos dados do governo federal.

Até agora, não houve movimentos para redução de salários do presidente Bolsonaro e de servidores do Executivo durante a crise.

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Pedro Ladeira - 8.mai.20/Folhapress O general Luiz Eduardo Ramos com Bolsonaro em evento da Defesa

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