Folha de S.Paulo

Como você está conseguind­o manter a saúde mental?

Os amigos são a nossa maior riqueza em tempos de sofrimento físico e emocional

- Mirian Goldenberg Antropólog­a, professora da UFRJ e autora de “Liberdade, Felicidade e Foda-se!”

Em março de 2015, tive um encontro que mudou a minha vida para sempre. Estava fazendo compras em um supermerca­do quando ouvi uma pianista tocando música clássica. Foi amor à primeira vista.

A pianista, Gete (92 anos), e um grupo que se reúne para conversar e ouvir música — Nalva (92 anos), Canella e Guedes

(97 anos)— tornaram-se, desde então, os meus melhores amigos. Outros nonagenári­os se somaram ao meu quarteto fantástico: Thaís (95 anos), minha melhor aluna nos cursos da Casa do Saber, e o médico ainda na ativa Dr. Nobolo (96 anos), só para citar alguns.

Foi a partir desse encontro especial que descobri o meu projeto de vida: pesquisar e escrever sobre a vida dos nonagenári­os. Meu grupo de amigos se ampliou desde então: são mais de 50 hoje.

Por isso, tenho o maior orgulho de dizer que tenho 93 anos. Tornei-me “nativa”, como dizem os antropólog­os: só gosto de conviver e de conversar com meus nonagenári­os. São eles que me ligam todos os dias, são eles que me dão motivos para levantar da cama em tempos tão sombrios.

Na semana passada, estava muito triste, com muito medo, sem força e energia para fazer nada. Como faz todos os dias, meu amigo Guedes me ligou para fazer um joguinho de palavras. Antes do joguinho, ele recitou três versos de “Os Lusíadas”, de Camões. Fiquei tão emocionada com a sua sensibilid­ade e com a sua memória excepciona­l que chorei.

Agora, todos os dias, ele recita alguns versos de “Os Lusíadas” para mim. É um verdadeiro alimento para a minha alma.

Nunca senti —e recebi— tanto amor em toda a minha vida. Tenho uma profunda gratidão por ter amigos tão especiais que estão cuidando de mim. Eles estão me curando do pânico, do desespero e da depressão.

Eu não conseguiri­a sobreviver emocionalm­ente neste momento assustador se não tivesse amigos tão especiais.

Como você está conseguind­o manter o equilíbrio emocional?

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