Folha de S.Paulo

Ilha internacio­nal

- Ruy Castro

Os menores de idade podem não acreditar, mas houve tempo em que a música popular não se limitava ao rock, jazz, pop, soul e rap. Todos os países tinham os seus ritmos e, até meados dos anos 60, eles circulavam entre si. Na vitrola de qualquer família brasileira rodavam tangos, boleros, mambos, fados, valsas vienenses, canções francesas e italianas e até música havaiana. Éramos particular­mente cosmopolit­as.

Por isso, e encerrando essa série de listas de discos a levar para uma ilha deserta —a quarentena—, eu capturaria também cantores internacio­nais sem os quais não gostaria de viver. O francês Yves Montand, por exemplo. Quem o conhece de “C’est Si Bon” ou “Paris Canaille” sabe o que quero dizer. Levaria também Georges Brassens, mas combinei com a Gato Preto ficar em um cantor por país.

Em termos, não? Da Argentina, eu não abriria mão de Virginia Luque, para cantar “Nostalgias” e “Cambalache”, mas daria um jeito de contraband­ear um grupo instrument­al, o Sexteto Mayor, por sua interpreta­ção de “Adiós Nonino”. E, de Portugal, o fadista Alfredo Marceneiro, que tive a sorte de escutar a um metro de distância, numa quinta perto de Lisboa, em 1973, aos 85 anos, cantando o “Fado Cravo”.

Boleros? Quem superava os cubanos? Eu levaria Antonio Machín, que arrasava em “Angelitos Negros” e “Piel Canela”, e a fabulosa Freddy, com seus 150 quilos, que fez de “The Man I Love” “El Hombre Que Yo Amé” e estamos conversado­s. Mas sabendo que o chileno Lucho Gatica dos anos 50 e 60 também era difícil de bater —vide “Frenesi”.

E tenha um susto ao descobrir a quase secreta chilena paulistana Madalena de Paula. Seu único álbum, “Sophistica­ted Lady”, de 1979, em que ela canta em inglês, francês, espanhol, alemão e português, está inteiro na internet. Mas se só tivesse uma faixa —“Joana Francesa”— compensari­a por todo mundo que eu deixaria para trás.

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil