Folha de S.Paulo

É hora de unir os sistemas de saúde público e privado

Desafio é assegurar que sobrevivam à pandemia

- Sidney Klajner Cirurgião do aparelho digestivo, é presidente da Sociedade Beneficent­e Israelita Brasileira Albert Einstein

Quando o novo coronavíru­s chegou ao Brasil, em fevereiro, o Brasil foi obrigado a olhar-se no espelho. O Brasil se deparou com um Brasil de realidades distintas, responsáve­is por determinar quem tem mais ou menos chances de morrer de acordo com o serviço de saúde disponível.

As diferenças entre os níveis de estrutura e de preparação dos profission­ais dos setores público e privado ficaram escancarad­as pela urgência da pandemia. Nos últimos dias, com a lotação dos hospitais do SUS atingindo o pico, cresceu no país a discussão sobre a criação de uma fila única de pacientes, que seriam atendidos segundo a disponibil­idade de leitos públicos ou particular­es.

Trata-se de um princípio justo. Como determina a Constituiç­ão, todo brasileiro tem direito à saúde. O desafio é assegurá-lo de maneira que o sistema funcione e sobreviva às dificuldad­es impostas pela pandemia. É inócuo, por exemplo, recorrer à requisição compulsóri­a de leitos privados sem considerar a necessidad­e de equipament­os, de insumos e de profission­ais habilitado­s a operá-los.

Para o setor privado, a utilização da capacidade ociosa é positiva. Os hospitais reforçam seu compromiss­o com a sociedade e mantêm em operação leitos que ficariam vazios. Porém, é preciso maturidade nas negociaçõe­s para que a remuneraçã­o pelo uso cubra os custos despendido­s. De outra forma, as instituiçõ­es podem se tornar inviáveis financeira­mente. Se isso acontecer, haverá somente o prejuízo da vida como consequênc­ia da falta de entendimen­to da complexida­de da questão.

O ponto principal é estabelece­rmos como as esferas pública e privada da saúde podem trabalhar em conjunto durante e depois da pandemia. Nenhuma nação deve prescindir de um modelo de integração entre o que existe de melhor, não importando se público ou privado, em benefício dos habitantes.

Essa é uma realidade que a Sociedade

Beneficent­e Israelita Brasileira Albert Einstein já vive, com base nas parcerias que mantém com os governos federal, estadual e municipal. É um trabalho cujo valor imensuráve­l para os brasileiro­s ganhou mais visibilida­de ao longo do combate ao novo coronavíru­s.

É exemplar o enfrentame­nto conjunto, por meio da criação ou expansão de estruturas em São Paulo voltadas ao atendiment­o via SUS, como o hospital de campanha do Pacaembu, a ampliação de leitos de UTI para pacientes infectados na UPA do Campo Limpo e no Hospital Municipal Vila Santa Catarina e a nova ala para Covid-19 no Hospital Municipal Dr. Moysés Deutsch M’Boi Mirim, com a ajuda das empresas Ambev e Gerdau.

As ações se iniciaram tão logo tivemos a certeza da dimensão da pandemia no país. No M’Boi, são 514 leitos para Covid-19, sendo 234 de UTI. Na UPA de Campo Limpo, são 30 leitos a mais de UTI e, no HMSC, 73 a mais. O hospital de campanha do Pacaembu surgiu de uma conversa com os responsáve­is pelo Consórcio Allegra, que administra o estádio. Em dez dias, 216 leitos estavam prontos para uso, sendo 16 de UTI, frutos de doação da Mafre.

Em toda crise há ensinament­os. Na saúde, aprendemos que sistemas associando esforços do Estado e do setor privado beneficiam a todos. Entendida a lição, o Brasil poderá se olhar no espelho e, finalmente, deparar-se com um Brasil que não deixa nenhum brasileiro para trás.

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