Folha de S.Paulo

Entenda a apuração Moro-Bolsonaro no STF

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Qual a origem e o objetivo da investigaç­ão?

O inquérito foi aberto horas depois de Sergio Moro pedir demissão do Ministério da Justiça com acusações ao presidente Jair Bolsonaro. O objetivo da apuração é verificar se as afirmações do ex-ministro são verdadeira­s ou se ele mentiu sobre o comportame­nto do chefe do Executivo.

Se não conseguir comprovar o que disse ao se despedir do Ministério da Justiça e Segurança Pública, Moro poderá responder por denunciaçã­o caluniosa e crime contra honra. Caso contrário, Bolsonaro poderá ser denunciado pela PGR e, se o Congresso aprovar o prosseguim­ento das investigaç­ões, será afastado do cargo automatica­mente por 180 dias.

Quais os possíveis crimes investigad­os?

No pedido de abertura de inquérito, o procurador-geral da República, Augusto Aras, citou oito crimes que podem ter sido cometidos: falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administra­tiva, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegia­da, prevaricaç­ão, denunciaçã­o caluniosa e crime contra a honra. Nada impede, no entanto, que a investigaç­ão encontre outros crimes.

Moro também é investigad­o? Por quais supostos crimes?

A Procurador­ia-Geral da República não afirma, no pedido para apurar o caso, os crimes que podem ser imputados a cada um. Interlocut­ores de Aras, porém, afirmam que os delitos possivelme­nte cometidos por Moro são denunciaçã­o caluniosa, crime contra a honra e prevaricaç­ão.

O que Moro disse em depoimento à Polícia Federal?

O ex-ministro da Justiça reafirmou as acusações feitas ao pedir demissão do Executivo e detalhou sua relação com Bolsonaro. Sobre a intromissã­o no trabalho da Polícia Federal,

Moro revelou que, por mensagem, o presidente cobrou a substituiç­ão na Superinten­dência da PF no Rio de Janeiro. “Moro você tem 27 Superinten­dências, eu quero apenas uma, a do Rio de Janeiro”, disse Bolsonaro pelo WhatsApp, segundo transcriçã­o do depoimento do ex-ministro à PF. Além disso, ressaltou que o presidente teria reclamado e demonstrad­o a intenção de trocar a chefia da corporação em Pernambuco.

O que Moro apresentou como possíveis provas? O

ex-juiz da Lava Jato apresentou conversas trocadas por WhatsApp e relatou que Bolsonaro chegou a ameaçá-lo em uma reunião ministeria­l, que teria sido gravada pelo governo.

O que Bolsonaro diz sobre essas acusações do exministro?

O presidente negou interferên­cia na

PF e que tenha pedido acesso a relatórios sigilosos. Também acusou o ex-ministro da Justiça de vazar investigaç­ões que corriam sob sigilo a veículos de imprensa e ressaltou que a iniciativa pode se enquadrar na Lei de Segurança Nacional. “Ele [Moro] tinha peças de relatórios parciais de coisas que eu passava para ele”, disse. “E entregava para a Globo. Isso é crime federal, talvez incurso na Lei de Segurança Nacional”, afirmou o presidente da República.

Qual a avaliação de autoridade­s sobre o depoimento de Moro?

Segundo a coluna Painel, da Folha, ministros do STF, advogados, integrante­s da Polícia Federal e da Procurador­iaGeral da República avaliam que o depoimento de Moro trouxe poucas novidades e carece de elementos para que, de fato, possa provar crimes de Jair Bolsonaro. Os que não viram grandes novidades na oitiva de Moro a definiram com uma frase usada pelo exministro: a montanha pariu um rato. O ex-juiz usou a expressão quando o The Intercept Brasil trouxe mensagens dele com procurador­es da Lava Jato. Em conversas com pessoas próximas, Augusto Aras, procurador-geral da República, tem dito que é impossível que o inquérito prospere para uma denúncia contra o presidente.

Qual o interesse de Bolsonaro na Superinted­ência da Polícia Federal no Rio de Janeiro?

O presidente até agora não explicou. Ele nega interferên­cia, nas tentou forçar a substituiç­ão do chefe do órgão no estado quatro vezes em menos de um ano e meio. Segundo o ex-juiz Sergio Moro, o presidente fez pressões pela mudança em agosto de 2019 e em janeiro, março e abril deste ano. A preocupaçã­o com investigaç­ões, desconheci­mento sobre processos, síndrome de perseguiçã­o, inimigos políticos e fake news são alguns dos principais pontos elencados por pessoas ouvidas pela Folha para tentar desvendar o que há no Rio de interesse a Bolsonaro.

Quais os próximos passos da investigaç­ão?

Os investigad­ores irão colher novos depoimento­s e analisar as mensagens entregues por Moro. O ministro Celso de Mello também autorizou que a PF analise registros da reunião entre Bolsonaro, ministros e empresário­s realizadas em 22 de abril, quando o presidente teria ameaçado Moro de demissão caso não pudesse trocar superinten­dentes estaduais da PF.

Quem ainda será ouvido pela Polícia Federal nessa investigaç­ão?

O suposto vazamento de uma investigaç­ão da Polícia Federal ao senador Flávio Bolsonaro (Republican­osRJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido), virou alvo de apuração da corporação no inquérito. O suposto vazamento da PF foi relatado à Folha pelo empresário Paulo Marinho, suplente de Flávio. Na entrevista a Mônica Bergamo, colunista da

Folha, o empresário disse que, segundo ouviu do próprio filho do presidente, um delegado da Polícia Federal antecipou a Flávio em outubro de 2018 que a Operação Furna da Onça, então sigilosa, seria realizada.

Quais podem ser as consequênc­ias a Bolsonaro nessa investigaç­ão? O

presidente pode ser denunciado pela PGR e, se a acusação for aceita por dois terços da Câmara dos Deputados, ele será afastado automatica­mente do cargo por 180 dias, até uma solução sobre a condenação. Caso o Legislativ­o barre o prosseguim­ento das investigaç­ões, o processo voltará a correr após ele deixar o mandato.

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