Com 5 alterações, técnicos de outros esportes veem futebol mais arrojado
Acostumados às trocas, técnicos projetam novas chances de mudar a partida e motivar o grupo
A volta da Bundesliga, retomada após mais de dois meses de paralisação por conta da pandemia da Covid-19, apresentou ao mundo do futebol uma novidade com relação às regras do jogo: times agora podem fazer até cinco substituições de jogadores por partida.
A medida, aprovada pela International Board (órgão que regulamenta as regras) e que tem aval da Fifa, visa à diminuição dos riscos de lesões dos atletas, que terão de disputar um número considerável de jogos em pouco tempo a fim de que os campeonatos se encerrem, na medida do possível, dentro do previsto.
A decisão de implementar ou não as cinco alterações durante uma partida é das próprias competições. Permitida em torneios que terminem até 31 de dezembro deste ano, a mudança ainda terá sua continuidade avaliada pela Fifa e pela International Board.
Acostumados a fazerem substituições constantemente e com poucas limitações em suas modalidades, técnicos de outros esportes ouvidos pela Folha aprovaram a possibilidade que os treinadores de futebol ganharam de interferir mais diretamente no curso de uma partida.
“Eu acho bastante positiva. Sou um pouco reticente com as regras do futebol, apesar de amá-lo. Acho ele muito pragmático, três substituições é pouquíssimo. O futebol teria que ser visto de forma mais dinâmica. Ele ficou muito aquém em todos esses anos”, afirma José Roberto Guimarães, técnico da seleção brasileira feminina de vôlei e do São Paulo/Barueri.
Tricampe ão olímpico, Zé Roberto já trabalhou no futebol, mas como dirigente. Foi diretor da Hicks Muse, parceira do Corinthians e do Cruzeiro no fim da década de 1990. A experiência durou pouco menos de dois anos.
O treinador acredita que a mudança na regra do futebol privilegiará técnicos mais arrojados e com abordagem mais tática. “Isso vem para favorecer principalmente os audaciosos. Se for um técnico inteligente, estrategista, com essas mexidas ele vai poder mudar todo um ritmo. Substituição muda jogo, ganha campeonato”, diz.
No vôlei, as alterações ocorrem sempre com a bola parada (após um ponto, pedido de tempo ou fim de set). São permitidas até seis trocas em cada set (líberos não entram nessa conta), e o atleta substituído só pode retornar uma vez para a quadra no período.
Já no handebol, as trocas ocorrem com a partida em andamento, sem necessidade de parada. Isso permite um rodízio constante de atletas, no qual muitos técnicos optam por trocar o perfil da equipe de acordo com a fase do jogo —se ofensiva ou defensiva.
“Entendo que o jogo de futebol poderá ser mais dinâmico, mantendo um nível físico mais alto. Com cinco mudanças, os treinadores terão mais opções para arriscar e criar mais variantes táticas, sem precisar deixar as substituições para o final da partida”, afirma o espanhol Jorge Dueñas, treinador da seleção brasileira feminina de handebol.
“Como ponto negativo, talvez ocorram menos gols. As diferenças no placar geralmente ocorrem nos minutos finais do primeiro e do segundo tempo”, opina Dueñas, destacando a queda do desempenho físico dos jogadores no final de cada etapa.
O técnico espanhol é um grande interessado na discussão sobre possíveis melhorias do jogo dentro da sua modalidade. Ele integra uma comissão de estudos da Federação Internacional de Handebol que busca analisar diferentes aspectos de como o esporte pode evoluir.
Assim como Zé Roberto, ele questiona se o aumento de substituições não deixará o jogo de futebol mais parado, em razão do tempo que se leva para substituir um atleta.
Para evitar isso, a Fifa autorizou que as alterações sejam feitas apenas em três oportunidades, além do intervalo, como já ocorria antes da mudança na regra.
Até 1987, o futsal permitia até cinco substituições, mas os jogadores que deixassem a quadra não poderiam mais voltar —o jogo era paralisado para as trocas. A partir de 1995, depois de sucessivos au
“Entendo que o futebol poderá ser mais dinâmico, mantendo um nível físico mais alto. Com 5 mudanças, os treinadores terão mais opções para arriscar e criar mais variantes táticas Jorge Dueñas, técnico da seleção brasileira feminina de handebol
“Isso vem para favorecer os audaciosos. Se for um técnico estrategista, com essas mexidas vai poder mudar todo um ritmo José Roberto Guimarães, técnico da seleção feminina de vôlei
mentos no número máximo, foi retirado o limite de alterações, dando aos técnicos a opção de substituir quantas vezes quisessem e com o jogo em andamento.
Técnico bicampeão da Liga Nacional com o Pato Futsal em 2018 e 2019, Sergio Lacerda também foi jogador.
Ele conta que a mudança levou tempo para ser totalmente compreendida pelos profissionais da modalidade.
“O campo vai ter um pouquinho de dificuldade, primeira vez que se depara com isso, mas depois os treinadores vão fazer uso com mais naturalidade. Como foi no salão. Vai da capacidade de cada profissional”, diz Lacerda.
A necessidade de se atualizar também é defendida por José Neto, técnico da seleção brasileira feminina de basquete. “Acredito que todo treinador tenha que estar mais preparado para que essa mudança da regra seja benéfica. Sem duvida que será um objeto de estudo para muitos. Vale, portanto, a necessidade de constante capacitação”, afirma.
No basquete, assim como no handebol e no futsal, as trocas são ilimitadas. Assim, todos os que estão no banco devem ter atenção ao que está ocorrendo na quadra, mantendo o elenco focado diante da expectativa ou necessidade de entrar na partida.
“Com essa troca vai haver uma motivação maior no dia a dia, do grupo todo. Vai rodar mais o elenco e quem está no banco fica motivado”, argumenta Lacerda.