Folha de S.Paulo

Oposição vê versão comprometi­da sobre PF e quer CPI para investigar presidente

- Danielle Brant

brasília Após a divulgação do vídeo da reunião ministeria­l de 22 de abril, parlamenta­res da oposição veem crimes cometidos pelo presidente Jair Bolsonaro, apontam que sua versão sobre a interferên­cia na Polícia Federal está comprometi­da e pressionam pela abertura de uma CPI no Congresso para investigar o caso.

A avaliação geral de líderes opositores é a de que elementos da gravação reforçam a denúncia do ex-ministro Sergio Moro de que Bolsonaro cobrou a troca do ex-diretorger­al da PF Maurício Valeixo.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) vê não só no vídeo, mas também na entrevista dada pelo presidente após a divulgação do material, na frente do Palácio da Alvorada, bases para que Bolsonaro seja investigad­o em CPI.

Segundo ele, ao falar sobre um sistema de informaçõe­s particular na reunião ministeria­l, Bolsonaro indica receber dados sobre investigaç­ões envolvendo sua família.

“Ele não sabe qual o papel da PF e da Presidênci­a, desconhece os limites institucio­nais”, critica o senador.

“O que eu tenho defendido é que o Congresso acompanhe, investigue e apure os fatos por meio de uma CPI, e não somente se atendo ao debate do impeachmen­t.”

A mudança de estratégia faz sentido em um momento em que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), já tem pelo menos 36 pedidos no colo para analisar, mas dá pouco sinal de que pretenda efetivamen­te abrir um processo.

A argumentaç­ão oficial de Maia é que a prioridade do Congresso no momento tem que ser o combate à pandemia do novo coronavíru­s.

Nos bastidores, no entanto, a avaliação é a de que não haveria o apoio mínimos de 342 deputados para levar o processo adiante, em especial após o centrão —bloco formado por PP, PL, Republican­os e outras siglas— ter migrado para a base do governo, em troca de cargos.

Deputados já coletam assinatura­s para abrir uma CPI. São necessária­s ao menos 171.

Valeixo foi exonerado no dia 24 de abril. Na manhã do dia anterior, Moro se reuniu com Bolsonaro, quando foi comunicado da saída do diretor-geral escolhido por ele. O ex-juiz então pediu demissão, conforme a Folha revelou.

Na troca de acusações que se seguiu à saída de Moro, o exministro afirmou que o vídeo da reunião ministeria­l continha declaraçõe­s que provavam que Bolsonaro havia tentado intervir na PF.

Em sua defesa, o presidente argumentav­a que as críticas feitas no encontro se referiam à sua proteção pessoal, e não à PF. Ele, no entanto, promoveu um general responsáve­l por sua segurança pessoal e de sua família.

O vídeo divulgado na sextafeira (22), pelo ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, levanta ainda mais dúvidas sobre a versão do presidente. Nele, Bolsonaro

se queixa da falta de dados dos órgãos de inteligênc­ia e de uma suposta perseguiçã­o a irmãos.

“Já tentei trocar gente da segurança nossa no Rio de Janeiro, oficialmen­te, e não consegui. E isso acabou”, afirmou.

O vídeo mostra o presidente olhando na direção em que estava sentado Moro na hora em que, exaltado, fala que não hesitaria em trocar subordinad­os e até um ministro.

Para a oposição, as declaraçõe­s e a linguagem corporal do presidente reforçam a necessidad­e de uma investigaç­ão no Congresso sobre a tentativa de interferên­cia na PF.

A deputada Fernanda Melchionna (RS), líder do PSOL na Câmara, afirma que o “show de horrores”, como define o encontro, comprova as denúncias do ex-ministro.

“Vários crimes foram cometidos, mas o que fica evidente é que, ao falar de proteção de filhos e de amigos, ao olhar para Moro, o presidente estava se referindo à Polícia Federal, e não ao GSI [Gabinete de Segurança Institucio­nal, que cuida da segurança presidenci­al].”

A esse fato, disse, se somam as mensagens entre Bolsonaro e Moro horas antes da reunião de 22 de abril, nas quais o presidente havia cobrado a troca de chefia na PF.

Alessandro Molon (RJ), líder do PSB na Câmara, vê chances de o impeachmen­t avançar, assim que Maia “perceber que tem apoio” da sociedade.

“Os pedidos refletem o anseio da população brasileira, que cresce a cada pesquisa de opinião. É um processo que vai se acumulando”, afirmou.

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Evaristo Sá/AFP Ato pró-Bolsonaro em Brasília, neste domingo (24)

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