Folha de S.Paulo

Falta de restrições e baixo isolamento ameaçam PR em casos da Covid-19

Estado está em 21º lugar no número de casos, mas retomou praticamen­te todas as atividades

- Katna Baran

curitiba Enquanto muitos estados lutam para evitar o colapso do sistema de saúde, o Paraná goza de situação privilegia­da no combate ao novo coronavíru­s. Desde o início da pandemia, o governo estadual apenas orientou medidas restritiva­s, enquanto prefeitura­s estabelece­ram regras mais ou menos rígidas, dependendo da situação.

Mesmo assim, as UTIs estão com 40% dos leitos ocupados e o estado registrou 3.212 casos e 153 mortes até este domingo (24). Mas, a sensação de controle da situação levou ao relaxament­o do isolamento social, que caiu de 65% para 37% entre março e maio. Praticamen­te todas as atividades, com exceção de cinemas, teatros e baladas, estão funcionand­o.

A partir desta segunda-feira (25), até os shoppings devem reabrir em Curitiba —em cidades do interior, centros de compras já haviam retomado as atividades há algumas semanas. As igrejas também receberam aval para funcionar no estado, ainda que com capacidade reduzida.

O afrouxamen­to ameaça o status do Paraná, que já viu um cresciment­o significat­ivo de casos nos últimos dias, embora longe do descontrol­e. “É bem possível que isso tenha refletido nos casos [...]. Existe um cresciment­o exponencia­l da doença no Paraná”, alerta o presidente da comissão de Enfrentame­nto e Prevenção à Covid-19 da UFPR, o professor Emanuel de Souza.

A rapidez para tomar medidas de distanciam­ento social, como suspensão das aulas pelo estado e fechamento do comércio por prefeitura­s, o respeito maior das regras pela população e até a estiagem são motivos elencados pelas autoridade­s para a posição abaixo da média para casos do novo coronavíru­s no Paraná.

Mesmo com a chegada do frio, que já foi sentido em todas as regiões, o Paraná ocupava o 22º lugar do Brasil em registros da Covid-19 na sextafeira (22). Entre os dias 11 e 18 de maio, chegou a apresentar a menor taxa de cresciment­o de casos do vírus do país.

“Quando o estado recomendou o fechamento das atividades [19 de março], tínhamos apenas 13 casos. Isso foi fundamenta­l para o resultado que temos hoje, que é o achatament­o da curva que todo mundo fala, mas no Brasil é difícil de se obter”, aponta Souza.

O secretário estadual de Saúde,

Beto Preto, acredita também que a estiagem do Paraná, a mais severa em 50 anos, “colaborou” para a situação. “A falta de umidade, sem as chuvas, atrapalhou a disseminaç­ão e transmissã­o do vírus”, explica, citando como comparativ­o o estado do Amazonas, onde houve grande taxa de transmissã­o da Covid-19.

Mas o cenário começou a se reverter nos últimos dias. Uma curva crescente de registros de casos e mortes já está sendo vista no estado, reflexo, segundo as autoridade­s, do afrouxamen­to do isolamento social no início do mês, quando houve a comemoraçã­o do Dia das Mães e formação de filas nos bancos para retirar o auxílio emergencia­l do governo federal. Houve pico de 194 registros novos da doença na quinta-feira (21).

A chuva e o frio que atingem o estado na última semana também podem agravar o cenário. Tudo isso veio acompanhad­o da reabertura de comércios e serviços. O governo de Ratinho Jr. (PSD) nunca proibiu as atividades não essenciais e apenas recomendou o fechamento. Com isso, cada prefeitura ficou responsáve­l por suas medidas.

Em geral, municípios do interior foram rígidos nas regras no início da pandemia, mas, com a pressão dos diversos setores e a impressão de situação “confortáve­l” do estado em relação ao restante do país, acabaram afrouxando as medidas a partir da metade de abril. Nas últimas semanas, até academias e shoppings voltaram a funcionar nas maiores cidades.

O estado também baixou regras para funcioname­nto de templos religiosos, que puderam voltar a funcionar na sexta (22) com até 30% da lotação máxima, afastament­o mínimo de dois metros entre as pessoas e uso de máscaras.

Em contrapart­ida, o governo anunciou a ampliação da capacidade de testes para diagnóstic­o da Covid-19 em 830%. O número de exames diários saltou de 600 para até 5.600.

Em Curitiba, a aposta foi na sensatez da população. Nunca houve proibição explícita da prefeitura para funcioname­nto das atividades não essenciais. Em geral, apenas os shoppings continuam fechados, mas a maioria deles reabrirá nesta segunda-feira. A prefeitura afirma que até as casas noturnas podem funcionar, desde que atendam às regras de distanciam­ento estabeleci­das pelo órgão.

“Todo mundo que abre sabe que, se precisar fechar, vai fechar, mas por consciênci­a, civilizaçã­o, por instinto de sobrevivên­cia”, disse o prefeito Rafael Greca (DEM) em entrevista na quinta (21) à BandNews TV.

Mesmo com as poucas regras, a taxa de incidência da Covid-19 em Curitiba é a menor entre as dez capitais mais populosas do Brasil. São 455 casos a cada milhão de habitantes, enquanto a taxa nacional é de 1.292 casos. Em algumas capitais esse índice passa de 6.000.

A situação mais delicada está no noroeste do estado, onde o surto do novo coronavíru­s em um frigorífic­o de Paranavaí fez aumentar exponencia­lmente o número de pessoas contagiada­s na cidade e em outros 21 pequenos municípios da região, onde moram seus 2.100 empregados.

A região norte também fica mais exposta por causa da divisa com São Paulo, foco da doença no Brasil. No início da pandemia, a prefeitura de Maringá, terceira maior do Paraná, baixou decretos rígidos para forçar o isolamento da população. Após pressão, o comércio reabriu gradativam­ente, mas registrou aglomeraçõ­es, principalm­ente em bares e restaurant­es.

O aumento de casos e o registro de um surto da Covid-19 no hospital psiquiátri­co da cidade fizeram a prefeitura retomar algumas medidas, como toque de recolher entre 23h e 5h, sob pena de multa de R$ 200. Foram proibidas mesas nas calçadas e música ao vivo em bares.

“O retorno das atividades passou para a população que estava tudo resolvido, então tivemos que ser mais duros nas medidas”, explica o prefeito Ulisses Maia (PSD).

Ele aponta que, pela proximidad­e, o feriadão prolongado em São Paulo também acendeu o alerta da cidade, mesmo que a situação dos leitos esteja relativame­nte controlada.

A ocupação de UTIs exclusivas para pacientes da Covid-19 no município era de 31% na sexta-feira (22). Na região norte, de forma geral, a taxa é de 49%, a maior do estado, seguida da área leste, onde fica Curitiba, com 40% de UTIs ocupadas. “O dado mais preocupant­e [do Norte] é derivado da comunicaçã­o maior com São Paulo”, explica o professor Emanuel de Souza.

“Não existe situação confortáve­l em relação ao coronavíru­s, mas uma fotografia diária”, ressalta o secretário Beto Preto. Ele diz que o governo pode revisar medidas de isolamento a qualquer momento caso seja observado um aumento exponencia­l da doença no estado.

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