Constituição não prevê intervenção militar, afirma Aras
PGR havia dito que interferência de um Poder em outro poderia ensejar ação das Forças Armadas
Augusto Aras disse ontem que a Constituição não admite intervenção militar. Um dia antes, o PGR havia dito que, se um Poder invadir a competência de outro, perde suas garantias constitucionais, o que poderia ensejar atuação das Forças Armadas.
brasília e são paulo O procurador-geral da República, Augusto Aras, divulgou nota nesta terça-feira (2) para afirmar que a Constituição não admite intervenção militar.
Em entrevista ao jornalista Pedro Bial, da TV Globo, na noite de segunda (1º), o chefe do Ministério Público Federal havia dito que, se um Poder invadir a competência de outro, perde suas garantias constitucionais, o que poderia ensejar atuação das Forças Armadas.
Tratava-se de uma interpretação do artigo 142 da Constituição, que estabelece o funcionamento das Forças Armadas.
A fala repercutiu mal, inclusive entre ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que defendem o fechamento do Supremo e do Congresso reivindicam o mesmo artigo.
O chefe do Executivo também fez referência ao item da Constituição na reunião ministerial de 22 de abril, que foi gravada e posteriormente divulgada por determinação do ministro Celso de Mello, decano do STF. “Todo mundo quer fazer cumprir o artigo 142 da Constituição. E, havendo necessidade, qualquer dos Poderes pode, né? Pedir às Forças Armadas que intervenham para restabelecer a ordem no Brasil.”
“A Constituição não admite intervenção militar. Ademais, as instituições funcionam normalmente”, afirmou o procurador-geral na nota. “Os Poderes são harmônicos e independentes entre si. Cada um deles há de praticar a autocontenção para que não se venha a contribuir para uma crise institucional.”
Aras disse, ainda, que as Forças Armadas “existem para a defesa da pátria, para a garantia dos Poderes constitucionais e, por iniciativa de quaisquer destes, para a garantia da lei e da ordem, a fim de preservar o regime da democracia participativa brasileira”.
Responsável por investigações que podem atingir Bolsonaro, o chefe da PGR vem recebendo críticas por uma atuação alinhada ao governo.
Na madrugada do último sábado (30), por exemplo, a sede do órgão foi alvo de pichação. Na placa de identificação do prédio, era possível ler “Procuradoria-Geral do Bolsonaro”. O sobrenome do presidente foi escrito acima da palavra “República” no letreiro.
Na entrevista a Bial, Aras definiu como “declaração unilateral” a posição do presidente sobre a possibilidade de arquivamento do inquérito em que ele é suspeito de violar a autonomia da Polícia Federal, segundo denúncia do ex-ministro Sergio Moro.
“O presidente esqueceu de combinar comigo”, disse. “Se eu não tenho condições de controlar os meus colegas da primeira instância, que ousam contra as minhas posições e gritam todo dia que têm independência funcional, imagine se eu ou qualquer outra autoridade possa controlar o que diz o senhor presidente.”
Em outros pontos da conversa, o procurador-geral adotou uma posição mais favorável ao chefe do Executivo, definido por ele como um homem “muito espontâneo”.
Aras afirmou, por exemplo, que não vê ilegalidade no fato de Bolsonaro não usar máscara de proteção contra o coronavírus em áreas públicas de Brasília nos últimos dias, apesar de o item ser obrigatório no Distrito Federal desde o dia 18 de maio. “Quando atua nos limites do Palácio do Planalto, não comete ilícito ao não usar a máscara. O regramento vale para o Distrito Federal. Ele age de acordo com a legalidade”, afirmou.
Ele ainda negou ser contra o inquérito que apura a disseminação em massa de notícias falsas e ameaças a integrantes do STF. Segundo o chefe da PGR, a sua posição foi de pedir que “fossem fixadas as balizas” da investigação. “É preciso que o Supremo diga quais são os limites desse inquérito.”
Na última semana, apoiadores do presidente foram alvo de uma operação da Polícia Federal, autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, no âmbito dessa investigação.
Ele disse que foi “surpreendido” pela ação “sem a participação, supervisão ou anuência prévia do órgão de persecução penal”.
O procurador-geral demonstrou incômodo com a vinculação de seu nome a uma possível futura vaga no Supremo, hipótese levantada por Bolsonaro. Ele afirmou que está no auge de sua trajetória profissional e pretende cumprir os dois anos à frente da PGR. “Não faço projetos para além de dois anos.”