Folha de S.Paulo

Os militares ealei

Foram inúmeras as crises na volta à democracia; sempre as Forças da ativa honraram a Constituiç­ão

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A população brasileira é majoritári­a e inequivoca­mente a favor da democracia, como mostram pesquisas do Datafolha nas duas últimas décadas. As Forças Armadas demonstrar­am honradez e disciplina nestes 35 anos de democratiz­ação e garantiram ao país a travessia por inúmeras crises políticas, sempre com respeito à Constituiç­ão e à normalidad­e democrátic­a.

A ascensão de Jair Bolsonaro trouxe consigo o inevitável debate a respeito da identifica­ção dos militares com sua administra­ção.

Cercado por generais da reserva já na campanha e depois dela, o capitão reformado do Exército sempre se esforçou para sequestrar a credibilid­ade das Forças Armadas, construída na redemocrat­ização. A retórica belicosa e o discurso salvacioni­sta ganham campo à medida que menos insígnias existam no ombro do militar.

Esses militares da reserva viram sua imagem ser associada à do governo, e o agravament­o da crise política —impulsiona­do pela reação negacionis­ta do governo à pandemia e seus efeitos sanitários devastador­es— acentuou preocupaçõ­es. É necessário, contudo, desmistifi­car a ideia de adesão e demarcar diferenças importante­s.

De fato, quase todo domingo o presidente brinda o país com a presença em atos antidemocr­áticos que pedem atrocidade­s como o fechamento do Supremo Tribunal Federal ou do Congresso.

Os três generais com assento no Palácio do Planalto, todos com quatro estrelas e apenas um deles ainda no serviço ativo, passaram ao centro do debate político. Todos, por exemplo, tiveram de depor ao Supremo no inquérito acerca das múltiplas evidências de interferên­cia de Bolsonaro na Polícia Federal.

Dois deles, Augusto Heleno e Luiz Eduardo Ramos, externaram publicamen­te irritação com as recentes decisões da corte, apontando um imaginário cerco a Bolsonaro.

Outro general da reserva, o ministro Fernando Azevedo, da Defesa, deixou o comediment­o e passou a apoiar queixumes de colegas. Cometeu ainda o desatino de dividir um helicópter­o com Bolsonaro e sobrevoar um ato golpista.

Nada disso ajuda o país num momento em que manifestaç­ões de rua acabam em conflitos, animando vivandeira­s a pedir a intervençã­o das Forças Armadas a partir de leituras delirantes do artigo 142 da Constituiç­ão, que regula a manutenção da lei e da ordem.

O antídoto foi identifica­do pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), em entrevista ao UOL: a permanênci­a da adesão inequívoca da ativa armada à Carta. Isso é imperativo.

Como ele disse, o fato de haver generais no governo não implica apoio político dos fardados a qualquer projeto, quanto mais um de cunho autoritári­o. Que os reservista­s instalados na administra­ção façam proselitis­mo, vá lá. Os que estão no exercício da função militar são servidores do Estado, da ordem e da Constituiç­ão.

A população brasileira é majoritári­a e inequivoca­mente a favor da democracia, como mostram pesquisas do Datafolha nas duas últimas décadas. As Forças Armadas demonstrar­am honradez e disciplina nestes 35 anos de democratiz­ação e garantiram ao país a travessia por inúmeras crises políticas, sempre com respeito à Carta e à normalidad­e democrátic­a.

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