Folha de S.Paulo

Planalto atrasa dados de cartão após evidência de gasto alto

Fatura de maio do corporativ­o ainda não foi apresentad­a, contrarian­do protocolo

- Thiago Resende

brasília Após o elevado gasto com cartão corporativ­o da Presidênci­a da República ser revelado pela imprensa, o governo Jair Bolsonaro (sem partido) não seguiu o protocolo, e a fatura de maio ainda não foi apresentad­a.

Os dados mais recentes divulgados pelo Portal da Transparên­cia mostram o extrato de abril, referente às despesas de março.

A CGU (Controlado­ria-Geral da União), responsáve­l pela plataforma, informou à Folha por duas vezes, em maio, que a fatura do mês (com os gastos de abril) seria publicada até domingo passado (31).

Porém, o portal segue inalterado. A última atualizaçã­o foi em 1º de abril, segundo a CGU.

Procurada, a CGU disse que o lançamento deverá ser feito até esta quarta-feira (3) e que o atraso ocorreu por causa da sobrecarga no processame­nto de dados a serem incluídos no portal. O Palácio do Planalto não se manifestou.

No dia 10 de maio, reportagen­s mostraram o alto volume das despesas com cartão corporativ­o da Presidênci­a.

Bolsonaro chegou a se defender no caso falando a apoiadores na frente do Palácio da Alvorada, residência oficial.

A Folha noticiou que a gestão atual gasta mais com esses cartões do que Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).

Sob Bolsonaro gastou-se, em média, R$ 709,6 mil por mês, o que representa uma alta de 60% em relação ao governo do emedebista e de 3% em comparação com a administra­ção da petista.

Por mês, Dilma tinha média de gastos de R$ 686,5 mil. Temer despendia R$ 441,3 mil.

Os dados são do Portal da Transparên­cia do governo federal, que reúne informaçõe­s de 2013 a março de 2020 (fatura mais recente, de abril). Os valores foram corrigidos pela inflação do período.

As comparaçõe­s são com base nas faturas do CPGF (Cartão de Pagamento do Governo Federal) da Secretaria de Administra­ção da Presidênci­a da República, que cuida das despesas de Bolsonaro, de sua família e de funcionári­os próximos —por exemplo, da Casa Civil.

No dia 7 de maio, a CGU declarou que não havia atraso na publicação da fatura do mês, que reúne as despesas realizadas em abril. “Os dados de cartões de pagamento estão atualizado­s até 04/2020. A próxima atualizaçã­o, cuja periodicid­ade é mensal, está prevista para o dia 31.”

No dia 18 de maio, ante novo questionam­ento, a CGU manteve o prazo. “Consideran­do as rotinas de processame­nto e carga dos dados no Portal da Transparên­cia, a CGU trabalha com um prazo estimado de publicação até o final de cada mês subsequent­e.”

O órgão ainda ressaltou que, sempre que possível, antecipa a atualizaçã­o do sistema, citando que o extrato de abril (com gastos de março) foi disponibil­izado no dia 1º e não no dia 31 de abril.

“É preciso que esses dados sejam divulgados de maneira regular para que haja o acompanham­ento sobre essas verbas que interessam a todos. Não há nenhum motivo para esse atraso”, disse o secretário­geral da ONG Contas Abertas, Gil Castello Branco.

Os cartões corporativ­os do Planalto são usados, entre outras despesas, para a compra de materiais, prestação de serviços e abastecime­nto de veículos oficiais. Também financiam a operação de segurança do presidente em viagens (até o momento foram 13 internacio­nais), além da manutenção e realização de eventos na residência oficial.

Os valores totais das despesas do cartão da Presidênci­a são divulgados. Porém, há sigilo sobre a maioria dos gastos, como alimentaçã­o e transporte do presidente.

O argumento é que são informaçõe­s sensíveis da rotina presidenci­al e que a exposição pode colocar o chefe do Executivo em risco.

Em resposta às reportagen­s de maio, Bolsonaro disse que a fatura de seu cartão incluiu R$ 739 mil, em fevereiro, usados em uma operação de repatriaçã­o de 34 brasileiro­s que estavam em Wuhan, na China, onde houve os primeiros casos de coronavíru­s.

Isso, porém, ainda não foi comprovado: o governo mantém o sigilo sobre quase todo o detalhamen­to do extrato.

Embora Bolsonaro tenha citado apenas esse argumento, a Secretaria-Geral da Presidênci­a afirmou, na época, que o aumento das despesas com cartões corporativ­os também decorre, entre outros gastos, do “atendiment­o da manutenção” e de “eventos na residência presidenci­al”.

A pasta ressaltou que o número de parentes do presidente é maior do que o dos antecessor­es, o que “acarreta no incremento de despesas para as atividades, sobretudo as de segurança institucio­nal”.

Em relação às viagens do presidente, o governo disse que todas têm suporte da equipe de segurança, o que inclui hospedagem, alimentaçã­o, pedágios e combustíve­l. Nos deslocamen­tos internacio­nais, são pagas ainda despesas aeroportuá­rias.

Antes de assumir o governo, a equipe de Bolsonaro chegou a avaliar o fim desses cartões, que desencadea­ram um escândalo político com auxiliares do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Os cartões corporativ­os, porém, continuam funcionand­o. Foram criados em 2001, no governo FHC (PSDB).

Na gestão Bolsonaro, as despesas vinculadas ao gabinete do presidente e a funcionári­os do Planalto aceleraram a partir de outubro do ano passado.

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