Folha de S.Paulo

Bolsonaro tentará ligar protestos a violência

Presidente, em live, xinga manifestan­tes de idiotas, marginais e viciados

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A estratégia é tentar diferenciá-los das manifestaç­ões de apoiadores. Oposição desaconsel­ha a ida aos atos de domingo.

Enquanto setores da sociedade civil organizam marchas com discurso antifascis­ta para o domingo (7), o presidente Jair Bolsonaro prepara com aliados uma estratégia para tentar diferencia­r esses atos das manifestaç­ões semanais de seus apoiadores

Ele pretende insistir no discurso de que seus apoiadores organizam movimentos pacíficos, enquanto a oposição adota métodos violentos. Na terça-feira (2), ele classifico­u atos contra seu governo de “marginais e terrorista­s”.

Seus auxiliares aguardam com expectativ­a as manifestaç­ões de domingo para aferir o tamanho da oposição nas ruas. Este pode ser o primeiro grande ato contra a administra­ção Bolsonaro desde que ele foi eleito.

Na manhã desta quinta (4), Bolsonaro chegou a dizer que “liberdade de expressão tem que valer para todo mundo”, em resposta a um apoiador que, no Alvorada, disse que ele deveria processar críticos que se referem a ele como “genocida”.

“Se o cara me chama de fascista, por exemplo, e eu processo, não acontece nada. Não adianta, minha taxa de sucesso é próxima de zero. E outra coisa: se é liberdade de expressão, tem que valer pra todo mundo”, respondeu.

Mas, à noite, em sua live, ele disse que os que se manifestam contra seu governo são idiotas, marginais e viciados. E voltou a pedir que seus apoiadores não saiam às ruas no domingo, como fazem todos os fins de semana.

“Domingo, ninguém comparece, é um pedido meu, neste evento. Vamos ficar ligados que este pessoal do antifas [antifascis­ta], o novo nome dos black blocs, quer roubar a tua liberdade”, insistiu.

Faalando ao “pessoal de verde e amarelo, que é patriota”, afirmou: “Não vá, que esse pessoal não tem nada a oferecer para nós. Bando de marginais. Muitos ali são viciados. Outros ali têm costumes que não condizem com a maioria da sociedade brasileira. Eles querem o tumulto, querem o confronto”.

As críticas foram feitas em diversos momentos da transmissã­o de quase uma hora.

“Mais importante que a sua vida é a sua liberdade. Esse pessoal quer roubar a sua liberdade. Esse pessoal não tem nada a oferecer para você. Se você pegar cem desse aí. A maioria é estudante. Se você pegar e aplicar a prova do Enem neles, acho que ninguém tira 5. Não sabem interpreta­r um texto, não sabem nada. São uns idiotas que não servem para nada”, afirmou.

O presidente também aconselhou que os pais controlem seus filhos e não os deixem participar das manifestaç­ões contrárias a seu governo.

“Filho da gente pode errar. Mas, quem for possível exercer o controle em cima dos filhos, exerça para não deixar o filho participar de um movimento como esse. Alguns vão dizer que eu estou cerceando a liberdade... Isso não é liberdade de expressão, o cara vai para o quebra-quebra. E vai ter muito garoto desse usado como massa de manobra, idiota útil. Vai estar lá a comando de um agitador profission­al. Fez curso fora do Brasil. Olha o que fizeram no Chile”, disse Bolsonaro.

Entre seus assessores, sobre a orientação dada por Bolsonaro para que seus apoiadores não apareçam na Esplanada dos Ministério­s, há leituras diferentes.

Há quem defenda que, de fato, Bolsonaro quer evitar confrontos. Porém, também há quem diga que o presidente apenas procurou uma vacina para o caso de haver mais manifestan­tes a contrários a ele que a favor, e os que argumentam que, caso o ato seja marcado por violência, Bolsonaro poderá afrontar seus opositores.

Assessores evitam prever se ele irá ou não para a rua no domingo. Contra o grupo mais ponderado de assessores pesa a intempesti­vidade do chefe da República.

Eles citam como exemplo um episódio da semana passada. Ministros militares voltaram a seus gabinetes na sextafeira (29) certos de que o presidente não iria à manifestaç­ão do domingo seguinte. Não só foi como chegou de helicópter­o e ainda montou em um cavalo da Polícia Militar do Distrito Federal.

O grupo que vê com reticência o compromiss­o de Bolsonaro de baixar o tom contra os protestos também aponta as publicaçõe­s feitas pelos filhos do presidente das redes sociais. Em especial o vereador Carlos Bolsonaro (Republican­os -RJ) e o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP).

Ambos têm atacado partidos de esquerda e endossado o posicionam­ento do presidente americano Donald Trump de apoio à repressão aos atos antirracis­tas que tomaram as ruas das cidades americanas.

 ?? Bruno Kelly - 2.jun.20/Reuters ?? Manifestan­te discute com policial em protesto contra Bolsonaro em Manaus, na terça
Bruno Kelly - 2.jun.20/Reuters Manifestan­te discute com policial em protesto contra Bolsonaro em Manaus, na terça

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