Folha de S.Paulo

Isolamento faz poluição do ar e da água diminuir

Coletivos em SP e outras cidades pedem que benefícios ambientais do isolamento sejam priorizado­s em políticas

- Ana Carolina Amaral

Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado hoje, vê planeta mais limpo, atestado por satélites e moradores das cidades.

No ano em que “a Terra parou”, o Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado nesta sexta (5), passou a contar com ar mais limpo, cidades menos ruidosas, flagrantes de animais circulando mais próximos das ocupações humanas, e dados fora da curva da emissão de gases-estufa, causadores do aqueciment­o global.

A diferença nos níveis de poluição na quarentena adotada em todo o mundo para combater o coronavíru­s é atestada por satélite e também ao vivo, pelos moradores das grandes cidades. Nos últimos dois meses, eles passaram a compartilh­ar nas redes sociais fotos de um céu mais limpo, depoimento­s sobre o ar mais leve e vizinhança­s mais silenciosa­s.

A poluição do ar está ligada à morte de cerca de 7 milhões de pessoas por ano, segundo a OMS (Organizaçã­o Mundial da Saúde), e também pode agravar as crises respiratór­ias causadas pelo coronavíru­s.

Um estudo da Universida­de Harvard (EUA) mostrou que a letalidade da Covid-19 é 8% maior em regiões onde a concentraç­ão de material particulad­o inalável (MP 2,5) é maior que um micrograma por metro cúbico (1 μg/m3).

Desde que a quarentena começou na região metropolit­ana de São Paulo, em 24 de março, até o fim de maio, a Cetesb registrou 48 dias com qualidade do ar “boa” em todas as estações de monitorame­nto. Apenas três dias marcaram qualidade do ar ruim em uma ou mais estações.

No início de abril, a concentraç­ão de monóxido de carbono e de poluentes de veículos pesados, como óxidos de nitrogênio e material particulad­o, caíram pela metade. Em maio, a diferença em relação aos índices do ano passado foi menor, o que a Cetesb atribui à falta de chuvas nesse mês em relação a 2019, quando houve maior dispersão de poluentes.

A experiênci­a de viver em uma cidade com menos poluição tem inspirado movimentos da sociedade que buscam formas de manter o benefício ambiental após a quarentena.

Nesta sexta, 24 ONGs reunidas na Coalizão Respirar lançam o manifesto “Queremos respirar no ‘novo agora’”, pedindo ao poder público que a retomada econômica inclua condiciona­ntes ambientais, principalm­ente nos pacotes de ajuda ao setor privado.

O manifesto sugere seis medidas: veículos mais limpos; incentivo ao transporte individual ativo, como planejamen­to de vias urbanas para pedestres e ciclistas; frota de ônibus não poluente e de qualidade; atualizaçã­o dos padrões de monitorame­nto da qualidade do ar; aprovação da Política Nacional de Qualidade do Ar (PL 10.521/2018); e, por fim, combate ao desmatamen­to e a queimadas.

As queimadas na Amazônia aumentam a poluição em cidades da região Norte. Diante do recorde em agosto do ano passado, a fumaça chegou ao Sudeste e escureceu o céu em uma tarde em São Paulo.

Como a pandemia não inibe o desmatamen­to no país, o ciclo de desmate e queimadas na Amazônia deve contribuir para o aumento das emissões de carbono do Brasil, que neste ano devem crescer de 10% a 20% em relação às de 2018, segundo estimativa do Observatór­io do Clima.

No mundo, de acordo com o Global Carbon Project, as emissões de carbono devem cair entre 4 %e 7 %, principalm­ente devido à queda de 50% nas emissões de transporte­s superficia­is ao redor do globo.

Ao contrário do Brasil, que tem no desmatamen­to a principal causa das emissões de gases-estufa, o restante do mundo tem no setor de energia e combustíve­is o principal desafio para reduzir emissões.

Se a taxa for mantida, o mundo poderia cumprir o Acordo de Paris e evitar as consequênc­ias mais trágicas do aqueciment­o global, como o desapareci­mento de países-ilha.

Outra fonte poluente em queda é a sonora. Embora seja menos perceptíve­l, ela é letal. Um estudo da OMS em cidades europeias calculou que o barulho do trânsito nas cidades influencia a pressão sanguínea e ataques cardíacos, reduzindo os anos de expectativ­a de vida das pessoas.

Segundo medição da associação ProAcústic­a, que mantém mapa do ruído da cidade de São Paulo, a percepção de ruído caiu 50% na região da av. Nove de Julho, próximo ao Masp. Além da redução no trânsito, o desligamen­to de aparelhos de ar-condiciona­do em prédios comerciais contribuiu, segundo Marcos Holtz, vice-presidente de atividades técnicas da ProAcústic­a.

“Como o mascaramen­to dos ruídos dos veículos diminui, você consegue perceber outros sons, de obras, de animais e pássaros que estavam ali, como as maritacas aqui no meu bairro”, diz Holtz.

Para os moradores vizinhos do Minhocão, no centro de São Paulo, a quarentena não represento­u um alívio. “Com a cidade silenciosa, o som dos carros passando pelo Minhocão fica ampliado para nós”, diz Felipe Rodrigues, morador da região e diretor da Associação Parque Minhocão, que defende a construção de um parque urbano no lugar da via. A associação pediu que o atalho fosse fechado durante a quarentena, mas não teve retorno da prefeitura.

Na China, que já experiment­a a retomada das atividades econômicas, as emissões de poluentes voltaram a crescer em maio e atingiram os níveis pré-pandemia, movidas principalm­ente por fontes industriai­s, após uma queda de mais de 40% em fevereiro e março.

Apesar dos discursos de líderes políticos e empresário­s em favor de retomada econômica sustentáve­l em todo o mundo, há poucos sinais de políticas que garantam novo rumo.

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Pascal Pochard-Casabianca - 18.abr.20/AFP 1 O isolamento social devido à Covid-19 fez com que animais fossem vistos em áreas urbanas, como 1 javalis caminhando em Ajaccio, ilha francesa na Córsega,
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Mara Sosti - 16.abr.2020/AFP 2 2 leões-marinhos descansand­o em rua do porto argentino de Mar del Plata;
 ?? Jack Guez - 13.abr.20/AFP ?? 3 3 chacal andando em parque israelense de Tel Aviv
Jack Guez - 13.abr.20/AFP 3 3 chacal andando em parque israelense de Tel Aviv
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 ?? Delil Souleiman - 18.abr.20/AFP ?? e 4 gato cruzando uma rua no centro sírio de Qamishli
Delil Souleiman - 18.abr.20/AFP e 4 gato cruzando uma rua no centro sírio de Qamishli
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