Folha de S.Paulo

Escolhas minúsculas

- Bruno Boghossian

Em tempos de aperto, o governo foi procurar alguns trocados no cofre para melhorar a própria imagem. Numa portaria publicada nesta quinta (4), o Ministério da Economia tirou R$ 83,9 milhões do orçamento do Bolsa Família e repassou o dinheiro para bancar um aumento de gastos da Presidênci­a com ações de publicidad­e institucio­nal.

O valor representa uma fração minúscula das despesas totais do programa social, mas reflete com nitidez as prioridade­s e as escolhas políticas da equipe de Jair Bolsonaro.

A pasta de Paulo Guedes tentou justificar a tesourada. Afirmou que 95% das famílias atendidas passaram a receber o auxílio emergencia­l criado na pandemia do coronavíru­s. “Nenhum beneficiár­io do Bolsa Família foi prejudicad­o no recebiment­o de seu benefício”, acrescento­u.

Faltou dizer que o programa tem hoje uma fila de espera de 430 mil famílias —que se cadastrara­m, mas ainda não recebem o pagamento. Esse corte, de acordo com técnicos do governo, poderia atender 70 mil famílias no segundo semestre deste ano.

Os contabilis­tas do Ministério da Economia, entretanto, não foram além das cifras de uma planilha. A pasta fala como se o dinheiro estivesse sobrando, mas não explica por que o governo decidiu inflar justamente o orçamento de comunicaçã­o institucio­nal do Palácio do Planalto, enquanto o país ainda tenta conter a pior crise sanitária desta geração.

O dinheiro remanejado seria suficiente para comprar mais de 3.500 ventilador­es pulmonares usados no tratamento das vítimas do coronavíru­s. Quando o Ministério da Saúde assina contratos para a produção desses equipament­os, o governo faz festa para divulgar a proeza.

Com os novos milhões, a Secretaria de Comunicaçã­o da Presidênci­a quase dobrou seu orçamento para essas ações. Nessa rubrica, já foram contabiliz­adas despesas com campanhas para melhorar a imagem do governo no exterior e até com a manutenção das contas do Planalto nas redes sociais, que costumam encher o presidente de elogios.

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