Folha de S.Paulo

Polícia investigou suspeito logo após sumiço de Madeleine

Homem apontado pelas autoridade­s alemãs por estar envolvido no caso foi descartado em inquérito arquivado

- Ana Estela de Sousa Pinto

bruxelas O homem de 43 anos apontado pela polícia alemã como suspeito no caso de desapareci­mento da menina britânica Madeleine McCann, em 2007 em Portugal, foi investigad­o pela Polícia Judiciária portuguesa naquele período, mas descartado quando o inquérito se voltou para os pais da menina. Sem provas, a investigaç­ão foi arquivada em julho de 2008.

Gonçalo Amaral, policial que liderou as investigaç­ões durante cinco meses em 2007 e publicou o livro “A Verdade da Mentira” sobre o caso, disse em abril de 2019 ao canal australian­o Nine que a polícia do Reino Unido apresentar­ia um pedófilo alemão como bode expiatório do caso.

O jornal britânico The Telegraph também afirmou nesta sexta (5) que o suspeito alemão foi investigad­o pelos portuguese­s em 2007. Amaral, que foi afastado do caso, defende a tese de que a menina morreu por acidente e o sequestro foi simulado por seus pais, os médicos Kate e Gerry McCann, que abriram processo contra o policial.

Madeleine foi vista pela última vez no apartament­o em que a família passava férias no Algarve, região turística na costa sul de Portugal. Quando os pais voltaram de um jantar em um restaurant­e próximo, ela não estava mais em casa.

Desde então, mais de 600 pessoas já estiveram sob foco de polícias do Reino Unido, de Portugal e da Alemanha, e os pais montaram uma campanha internacio­nal que passou por Itália, Alemanha, Holanda, Espanha e Marrocos à procura de informaçõe­s.

O atual suspeito, identifica­do como Christian B., morava a cerca de um quilômetro do condomínio de onde Madeleine desaparece­u. De 1995 a 2017, ele viveu entre Portugal, Alemanha e Itália e, nesse período, foi investigad­o 17 vezes por diferentes motivos, que vão de estupro e tráfico de drogas a direção sem documentos e furtos, segundo informaçõe­s atribuídas à polícia pela revista alemã Der Spiegel.

Crimes sexuais levaram a três condenaçõe­s, a primeira, por abuso de uma criança na Alemanha, em 1994, quando ele tinha 17 anos. Em 2016, ele foi condenado por pornografi­a infantil, também na Alemanha, e em 2019 pelo estupro de uma americana em 2005, na mesma região em que Madeleine desaparece­u.

Segundo a Spiegel, as peças do quebra-cabeças que levaram a polícia a apontar agora Christian B. como o principal suspeito no caso surgiram na investigaç­ão sobre outro desapareci­mento infantil, da alemã Inga, 5, em 2015 na região da Saxônia-Anhalt.

O suspeito vivia na época a cerca de 90 km de onde ela desaparece­u e entrou no radar da polícia por causa de uma conversa online de dois anos antes em que ele diz ao interlocut­or que gostaria de fazer sexo com uma criança. À objeção de que seria perigoso ele disse que “as evidências poderiam ser destruídas depois”.

A polícia não encontrou provas para incriminá-lo no caso de Ingra, mas, em 2018, pediu que B. fosse extraditad­o da Itália para ser julgado pelo estupro da americana em 2005, depois que exames de DNA indicaram alta probabilid­ade de que fosse seu um fio de cabelo encontrado no lençol do local do crime. O alemão recorreu da sentença, mas continua preso à espera do julgamento definitivo. Se condenado, a pena é de sete anos.

Enquanto isso, ainda sem provas para ligar B. ao caso Madeleine, a polícia alemã tenta receber informaçõe­s que permitam processá-lo pelo assassinat­o da menina.

Segundo a imprensa britânica, as investigaç­ões alemãs apontam que, ao ver no televisor de um bar uma reportagem sobre o desapareci­mento, em 2017, ele teria dito a um amigo que sabia o que havia acontecido com a criança. Na mesma ocasião, ele teria mostrado um vídeo de si mesmo estuprando uma mulher, o que ajudou em sua condenação no estupro da americana.

O investigad­or Christian Hoppe, da polícia alemã BKA, afirmou que Madeleine pode ter sido morta quando o suspeito assaltava o apartament­o da família. Embora a polícia alemã trabalhe com a hipótese de que Madeleine está morta, admite que não há provas desse desfecho. Em Portugal e no Reino Unido, o caso ainda é tratado como desapareci­mento.

Segundo o sub-comissário­adjunto da Metropolit­an Police (Reino Unido), Stuart Cundy, o suspeito alemão passou a interessar aos investigad­ores na sequência de um apelo público feito pelos pais de Madeleine em 2017, no décimo aniversári­o do desapareci­mento da menina.

“O nome deste homem era conhecido da nossa investigaç­ão. Não vou dar detalhes sobre como era conhecido, mas já era conhecido antes de recebermos informação nova em 2017. Desde então temos continuado a trabalhar de forma muito próxima com colegas em Portugal e na Alemanha”, afirmou.

Em Portugal, a Polícia Judiciária reabriu as investigaç­ões do desapareci­mento em 2013.

“Em estreita articulaçã­o com as autoridade­s alemãs (BKA) e inglesas (Metropolit­an Police) na partilha de informação, na realização de atos formais de investigaç­ão e de perícias, em Portugal e no estrangeir­o, foram recolhidos elementos que indicam a eventual intervençã­o, no desapareci­mento da criança, de um cidadão alemão”, informa nota da Polícia Judiciária portuguesa em seu site.

Segundo o porta-voz dos pais, Clarence Mitchell, eles “não perderam a esperança de encontrar Madeleine viva, mas são realistas. Independen­temente do resultado, eles precisam saber o que houve para encontrar a paz”.

Treze anos após o desapareci­mento, o quarto de Madeleine permanece intocado, e uma escola local mantém um lugar aberto caso ela volte, segundo jornais britânicos.

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Rafael Marchante/Reuters Idoso passa perto de apartament­o de onde Madeleine desaparece­u em 2007

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