Folha de S.Paulo

Entenda a investigaç­ão

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Qual a origem e o objetivo da investigaç­ão?

A investigaç­ão foi aberta a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, após acusações de Moro de que o presidente queria intervir na Polícia Federal. Depoimento­s e vídeos reforçaram a denúncia do ex-juiz e ajudaram a enfraquece­r a versão de Bolsonaro de que não falava sobre intervençã­o na PF, e sim sobre a sua segurança pessoal.

O foco da investigaç­ão, porém, é avançar sobre quais eram os possíveis interesses de Bolsonaro em investigaç­ões da corporação e se houve interferên­cia com objetivos políticos nas apurações. Bolsonaro nega interferên­cia, mas tentou forçar a substituiç­ão do chefe da corporação no

Rio de Janeiro quatro vezes em menos de um ano e meio. Segundo o exministro da Justiça, o chefe do Executivo pressionou pela mudança em agosto de 2019 e em janeiro, março e abril deste ano.

Quais os possíveis crimes investigad­os?

No pedido de abertura de inquérito, Aras citou oito crimes que podem ter sido cometidos: falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administra­tiva, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegia­da, prevaricaç­ão, denunciaçã­o caluniosa e crime contra a honra. Nada impede, no entanto, que a investigaç­ão encontre outros crimes.

O que faz o procurador­geral da República?

Indicado pelo presidente, é o chefe do MPF e representa a instituiçã­o junto ao STF e ao STJ. Também tem atribuiçõe­s administra­tivas ligadas a outras esferas do Ministério Público da União. É papel do PGR ainda investigar e denunciar políticos com foro especial, incluindo o presidente da República.

Como foi a escolha de Aras para o cargo?

Após meses de negociaçõe­s, Bolsonaro deixou de lado a lista tríplice divulgada em junho de 2019 por eleição interna da associação dos procurador­es e escolheu Aras.

Houve interferên­cia de Bolsonaro na PF?

Sim. Embora tenha prometido publicamen­te carta branca ao seu exministro da Justiça, Sergio Moro, para definir os cargos de comando da PF, o presidente demitiu no mês passado, contra a vontade dele, o então diretor-geral da corporação, Maurício Valeixo, e na sequência mudou a chefia da superinten­dência do órgão no Rio de Janeiro.

A interferên­cia aconteceu por objetivos políticos nas investigaç­ões?

Há indícios de que sim. Um deles é que, antes de exonerar Valeixo, Bolsonaro enviou uma mensagem a Moro com o link de uma reportagem com o seguinte título: “PF na cola de 10 a 12 deputados bolsonaris­tas”. Na sequência, escreveu: “Mais um motivo para a troca”. Outro elemento é o próprio vídeo da reunião ministeria­l em 22 de abril. Num dos momentos, ao reclamar da falta de informaçõe­s de órgãos diversos, Bolsonaro fala em interferir na PF — inicialmen­te, o presidente negava até mesmo ter se referido à Polícia Federal no encontro, o que não se demonstrou verdadeiro. Em outro momento, o presidente reivindico­u a troca de “gente da segurança” no Rio para que seus amigos e parentes não fossem prejudicad­os. A superinten­dência no

Rio conduz investigaç­ões relacionad­as a um dos filhos de Bolsonaro e alguns de seus aliados.

Como presidente, Bolsonaro pode interferir na PF?

É atribuição do presidente a nomeação de ministros e de qualquer outro cargo da estrutura do Executivo. O próprio Bolsonaro disse publicamen­te que queria mexer nos cargos da corporação, mas, para ele, não seria uma interferên­cia. A questão central na investigaç­ão é saber se o presidente demitiu o diretor da PF e se forçou a troca do superinten­dente no Rio por interesses pessoais.

O vídeo da reunião levantou indicativo­s de outras possíveis ilegalidad­es?

No encontro do dia 22 de abril, o presidente revelou contar com um sistema de informação particular, alheio aos órgãos oficiais. Bolsonaro afirmou em entrevista ainda que policiais são as fontes dos dados que recebe.

Moro também é investigad­o? Por quais supostos crimes?

A PGR não afirma, no pedido para apurar o caso, os crimes que podem ser imputados a cada um. Interlocut­ores de Aras, porém, afirmam que os delitos possivelme­nte cometidos por Moro são denunciaçã­o caluniosa, crime contra a honra e prevaricaç­ão.

Quais podem ser as consequênc­ias a Bolsonaro nessa investigaç­ão?

O presidente pode ser denunciado pela PGR e, se a acusação for aceita pela Câmara e o STF abrir ação penal, ele será afastado do cargo por 180 dias, até uma solução. Caso o Legislativ­o barre o prosseguim­ento, o processo voltará a correr após ele deixar o mandato.

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