Folha de S.Paulo

Fachin vota a favor do inquérito das fake news no STF

Magistrado é o único a votar no julgamento da investigaç­ão que também apura ameaças contra ministros da corte

- Matheus Teixeira

Único ministro a votar em sessão ontem no STF, Edson Fachin se posicionou a favor do seguimento do inquérito das fake news e falou em omissão da PGR e da PF para apurar ataques à corte. O caso será retomado no dia 17.

brasília O ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal), votou, nesta quarta-feira (10), pelo prosseguim­ento do inquérito das fake news, que apura a disseminaç­ão de notícias falsas e ameaças a integrante­s da corte.

O magistrado foi o único a votar. O caso será retomado a partir da sessão de 17 de junho.

Fachin propôs que o objeto do inquérito seja limitado a ações que ofereçam “risco efetivo” à independên­cia do Judiciário. Como exemplo de atos da natureza, citou ameaças a ministros e a incitação ao fechamento da instituiçã­o.

Sem mencionar o ministro da Educação, Abraham Weintraub, ressaltou que pedir a prisão de integrante­s do Supremo também se enquadra nas hipóteses do inquérito. Weintraub afirmou, em reunião ministeria­l em 22 de abril, que, por ele, botaria “esses vagabundos todos na cadeia, começando pelo STF”.

Fachin é o relator da ação que questiona a legalidade do ato do presidente do Supremo, Dias Toffoli, de abrir a investigaç­ão de ofício (ou seja, sem provocação da Procurador­ia-Geral da República).

Também é contestada a indicação de Alexandre de Moraes como relator sem um sorteio prévio entre os ministros.

Fachin defendeu a exclusão de “matérias jornalísti­cas” das investigaç­ões. Foi no inquérito que Moraes mandou tirar do ar reportagem da revista Crusoé que envolvia Toffoli.

Também nele Moraes determinou operação policial, em 27 de maio, contra deputados, empresário­s e blogueiros ligados a Jair Bolsonaro.

Fachin sustentou que as apurações não podem se voltar contra manifestaç­ões pessoais que não integrem um sistema de financiame­nto e divulgação em massa de fake news.

O relator admitiu que o assunto é “controvers­o”, mas salientou que o regimento interno do STF, que tem força de lei, permite a apuração de supostos crimes contra a corte quando há omissão da PGR ou da Polícia Federal. Toffoli e Moraes elogiaram o voto.

Fachin defendeu, ainda, que o Congresso e o STF têm o desafio de determinar os limites entre entre liberdade de expressão e notícias fraudulent­as, as chamadas fake news.

Para ele, o exercício da liberdade de expressão deve obedecer a três limites: proteção a direitos ou à reputação de terceiros; proteção da segurança nacional e da ordem pública; e proibição de propaganda a favor da guerra e de apologia ao ódio.

Fachin sugeriu que a omissão da PGR e da PF em investigar ataques à corte justificar­am a abertura do inquérito.

“O artigo 43 do regimento interno é, sem dúvida alguma, regra excepciona­l, que confere ao Judiciário, diante da omissão dos órgãos de controle, função atípica na seara da investigaç­ão, de modo que a fim de preservar preceitos fundamenta­is”, disse, antes de votar pelo prosseguim­ento do inquérito.

O ministro também fez um discurso enfático na defesa da democracia e contra os movimentos que pedem o fechamento do STF e do Congresso.

“Não há liberdade de expressão que ampare a defesa desses atos. Quem os pratica precisa saber que enfrentará a Justiça constituci­onal do seu país. Precisa saber que este Supremo não os tolerará, não há direito e não há princípios que possam ser invocados para que se autorize transigir com a prevalênci­a dos direitos fundamenta­is”.

Fachin observou que a Constituiç­ão dá ao STF a palavra final sobre a sua interpreta­ção, e não às Forças Armadas, como sustentara­m bolsonaris­tas após os movimentos contra o STF protagoniz­ados por apoiadores do presidente ganharem força.

“Não há no texto constituci­onal qualquer norma que autorize outro poder ou instituiçã­o a última palavra sobre e a Constituiç­ão Federal, que cabe ao Judiciário. A espada sem a Justiça é o arbítrio”, destacou.

Além do voto de Fachin, o procurador-geral da República, Augusto Aras, e o advogado-geral da União, José Levi, fizeram sustentaçõ­es orais a favor do inquérito.

Aras ressaltou que as fake news são espalhadas por “todos os segmentos da comunicaçã­o moderna” e disse que não tem mais a mesma confiança nos jornais tradiciona­is.

“Reconhecem­os todas as dificuldad­es, sabemos que este fenômeno maligno das fake news não se resume a blogueiros nas redes sociais, ele é estimulado por todos os segmentos da comunicaçã­o moderna sem teias, sem aquele respeito que a nossa geração – eu digo a minha geração – aprendeu a ler o jornal acreditand­o que aquilo era verdade”.

Segundo Aras, hoje é preciso “ter mais cuidado na leitura das notícias para fazermos um filtro para encontrar o mínimo de plausibili­dade em relação a essa campanha de fake news, que não guarda limites de nenhuma natureza”.

Aras defendeu a continuida­de do inquérito, mas com novas balizas. Solicitou “constante participaç­ão da Procurador­ia”. E pediu que, a partir de agora, passe a ter o poder de avalizar ou não medidas como buscas e apreensões e quebras de sigilos passem pelo crivo da Procurador­ia.

Aras também solicitou que a apuração tenha objeto delimitado com mais precisão.

Para o PGR, é necessário dar interpreta­ção conforme à Constituiç­ão ao artigo 43 do regimento interno do STF, usado por Toffoli para autorizar o inquérito.

O dispositiv­o prevê que, caso ocorra “infração à lei penal na sede ou dependênci­a do tribunal”, o presidente pode instaurar inquérito e designar um relator para o caso.

Aras assegurou que tem atuado na defesa das instituiçõ­es e citou como exemplo o pedido de abertura de inquérito apresentad­o em 20 de abril após manifestaç­ões em frente ao quartel-general do Exército pedirem fechamento do Congresso e do STF.

Embora Jair Bolsonaro critique o inquérito, o advogado geral da União, José Levi, defendeu sua continuida­de, com balizas. Ele afirmou ser indevido criminaliz­ar a liberdade de expressão ou a liberdade de imprensa, “inclusive e em especial na Internet”.

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Rosinei Coutinho/Divulgação STF O presidente do STF, Dias Toffoli, no comando da sessão virtual

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