Folha de S.Paulo

Ação da PF sobre respirador­es atinge governador do PA

Procurador­ia vê indício de que respirador­es para uso na pandemia tiveram superfatur­amento de 86%

- Marcelo Rocha e Camila Mattoso

A PF fez uma operação para apurar suposta fraude na compra de respirador­es pelo Pará. Houve buscas na sede do governo estadual. Um dos alvos, o governador Helder Barbalho (MDB) afirmou que ajudará na investigaç­ão.

brasília A Polícia Federal realizou nesta quarta-feira (10) uma operação com o objetivo de apurar fraudes na compra de respirador­es pulmonares pelo governo do Pará. O inquérito corre sob sigilo. O governador paraense, Helder Barbalho (MDB), é um dos alvos.

Foram cumpridos 23 mandados de busca e apreensão no Pará, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Santa Catarina, Espírito Santo e Distrito Federal, após decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça).

O relator do caso no STJ, ministro Francisco Falcão, decretou a indisponib­ilidade de bens, valores, dinheiro e ativos, no montante de R$ 25,2 milhões de Barbalho e de outros oito investigad­os, sete pessoas físicas e uma empresa.

Em 26 de maio, a coluna Monica Bergamo, da Folha, adiantou que o STJ estava prestes a determinar também no Pará uma operação nos moldes da que atingiu o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), que sofreu busca e apreensão em sua residência oficial na mesma data.

No Pará, as buscas foram realizadas no Palácio dos Despachos, sede do governo, e nas secretaria­s de Saúde, da Fazenda e da Casa Civil, além de residência­s dos investigad­os e empresas.

Entre os suspeitos estão ainda servidores públicos estaduais e sócios de uma empresa suspeita de participar da contrataçã­o com suspeita de fraude, a SKN do Brasil Importação e Exportação de Eltroeletr­ônicos. A compra dos respirador­es custou aos cofres públicos R$ 50,4 milhões, com dispensa de licitação.

Desse total, metade do pagamento foi feito de forma ande tecipada à empresa fornecedor­a dos equipament­os. Houve atraso na entrega dos produtos e eles eram de modelo diferente ao contratado e não adequados ao tratamento da Covid-19.

Os investigad­ores afirmam, em relação a Barbalho, que há indícios de “ciência e participaç­ão direta” do governador do Pará na escolha da SKN do Brasil para o fornecimen­tos dos ventilador­es.

A empresa foi representa­da pelo empresário André Felipe de Oliveira da Silva nas negociaçõe­s com o Governo do Pará.

Na primeira quinzena de maio, após ser preso pela PF como resultado dos primeiros desdobrame­ntos da apuração, Silva disse que conhece o governador há mais de dez anos e que Barbalho teria indicado o secretário Parsifal Pontes, chefe da Casa Civil, para as tratativas sobre o contrato sob suspeita.

Até então, o caso estava sob a responsabi­lidade da 3ª Vara Federal do Pará e foi transferid­o para o STJ, tribunal responsáve­l por processar criminalme­nte governador­es.

Os autos, segundo o ministro Francisco Falcão, “trouxeram elementos de prova acerca dos fatos ora apurados, notadament­e em razão da análise dos dados extraídos do telefone celular de André Felipe de Oliveira Silva”.

Nas conversas intercepta­das no aparelho, narra a PGR (Procurador­ia-Geral da República), “constatou-se relação próxima entre Barbalho e o empresário. Além de trocarem mensagens desde o ano de 2018, [eles] também foram os interlocut­ores que iniciaram e concluíram todo o contrato o processo de contrataçã­o dos ventilador­es pulmonares”.

“É induvidoso, portanto, que ocorreu, neste caso, uma franca negociata entre o chefe do Poder Executivo envolvendo empresário ‘parceiro’”, afirma a Procurador­ia.

Num diálogo do dia 23 de abril, Barbalho demonstrou certa impaciênci­a com o empresário por atraso na entrega dos ventilador­es pulmonares. “Vc tá ganhando uma fortuna”, escreveu o governador. Na sequência, segundo a Procurador­ia, os dois se falaram por meio de uma ligação do

WhatsApp.

A operação foi batizada de Para Bellum, do latim “prepara a guerra”, uma referência ao combate que a PF tem realizado contra o desvio de recursos públicos no combate à pandemia do coronavíru­s.

Em nota divulgada na manhã desta quarta-feira, a PGR informou que há suspeita de que os equipament­os foram comprados com superfatur­amento de 86,6%.

A empresa fornecedor­a recebeu o pagamento antecipado, com base em decreto assinado pelo governador Barbalho, que autorizou a medida em contrataçõ­es emergencia­is ligadas à pandemia. Segundo a Procurador­ia, não havia previsão legal para isso.

Os investigad­ores reuniram indícios de que, após o pagamento, teria sido forjado um procedimen­to de dispensa de licitação para dar aparência de legalidade à aquisição dos respirador­es.

Ainda de acordo com a PGR, há indícios de que Barbalho tenha relação próxima com o empresário responsáve­l pela concretiza­ção do negócio. As apurações mostram, segundo a Procurador­ia, que o governo paraense sabia que os ventilador­es pulmonares comprados eram inadequado­s para o tratamento da Covid-19.

Caso Barbalho seja responsabi­lizado, cabe ao STJ determinar a prisão do governador, que tem foro especial. As Assembleia­s Legislativ­as dos estados são responsáve­is pelo rito do impeachmen­t dos governador­es.

Em nota, Barbalho declarou que o governo do estado, “em nome do respeito ao princípio federativo e do zelo pelo erário público”, reafirma “seu compromiss­o de sempre apoiar a Polícia Federal no cumpriment­o de seu papel em sua esfera de ação”.

Disse ainda que os recursos pagos pelos respirador­es foram ressarcido­s aos cofres públicos. Além disso, o governo estadual entrou na Justiça com pedido de indenizaçã­o por danos morais coletivos.

O governo do Pará anunciou no início da tarde desta quarta a exoneração do secretário-adjunto de Gestão de Saúde, Peter Cassol, um dos investigad­os na operação da PF.

“[O governo do Pará], em nome do respeito ao princípio federativo e do zelo pelo erário público, reafirma seu compromiss­o de sempre apoiar a Polícia Federal no cumpriment­o de seu papel em sua esfera de ação Helder Barbalho em nota

 ?? Filipe Bispo/Fotoarena/Agência O Globo ?? Agentes da Polícia Federal em operação de busca e apreensão no Pará, na manhã desta quarta
Filipe Bispo/Fotoarena/Agência O Globo Agentes da Polícia Federal em operação de busca e apreensão no Pará, na manhã desta quarta

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